A Morte do Rosário Branco (parte do capítulo um)

Outra parte do livro que estou escrevendo:

Sofás de couro marrom, mesinhas de vidro, quadros de Gonzaguinha por toda parte, bonitas paredes de madeira envernizada, uma TV de 29 polegadas ligada no canal de esportes, uma pista de dança, um balcão se estendendo de uma parede a outra (as tais bonitas paredes de madeira envernizada). Na parte de trás do balcão, prateleiras também de madeira, com as mais variadas bebidas e taças de vidro pendendo do teto baixo. Assim é o bar. E lá está o marido de Dona Silvia, pai de Drake, sentado em um dos banquinhos colados no balcão. Um copo de vidro na sua frente esperando ser cheio pela sexta vez, acompanhado pelo olhar apreensivo do barman.

- Pode pôr mais uma dose. – sua voz sai torta e distante, quase inconsciente.

- Já é o sex...

- Mais uma dose! Eu estou pagando!

O inconformado barman enche novamente o copo - mas parece que não foi por efeito da palavra pagando -, o outro vira e pede para pôr outra dose. O barman enche, o homem vira e pede outra, é assim que funciona, como se tudo se movesse à base de engrenagens. Enche, vira, pede, enche, vira, pede, Dona Silvia observa, enche, vira, continua observando.

Gabriel vem a sua mente outra vez enquanto se aproxima com cautela do já bêbado no balcão. Consegue enxergar mais claramente agora, lembra como era gentil, simpático e engraçado, como sempre fora desde que se conheceram naquela praia anos atrás. Percebe o quanto sente sua falta e o quanto o amava. Ah, como ela amava o Gabriel, como amava seu toque, seu perfume, a maneira como a fazia se sentir, feliz, de bem com a vida, protegida. Ah, como eram bons aqueles tempos. Tempos que não voltarão. Jamais, ela tem certeza. Jamais verá aquele brilho em seus olhos e sentirá... O pensamento foge quando chega ao balcão, ao homem bêbado, seu marido.

- O que está fazendo aqui? – ele pergunta como se tivesse fugido para o outro lado do país.

- Vim aqui te buscar, te levar embora. – ela responde como se ele realmente tivesse fugido para o outro lado do país.

- Não quero sair daqui. Estou bem.

- Chama isso de estar bem?

- Eu estou bem! – a voz cada vez mais torta apenas nega o que é dito.

- VOCÊ ESTÁ BÊBADO! – o berro chama a atenção dos freqüentadores, aqueles tipos que abandonam uma boa piscina e uma boa praia para jogarem buraco no bar enquanto tomam suas cervejas ou qualquer outro tipo de bebida alcoólica.

- Mentira! – a voz negando de novo. – Me deixe em paz!

Me deixe em paz, uma coisa que Gabriel jamais diria. Ele costumava apenas dizer você está linda, adoro conversar com você ou o favorito dela... eu te amo.

- Se não me deixar em paz, eu juro pra você que vou transformar sua vida em um inferno.

- Já transformou.

- ME DEIXE EM PAZ! – é ele quem berra dessa vez, mas não chama a atenção de ninguém. Um bêbado berrando é tão incomum quanto um bebê chorando, isso se aplica até mesmo em um lugar luxuoso como aquele.

Dona Silvia olha paralisada para seu marido de olhos vermelhos e amedrontadores, o olha para se certificar do homem com quem havia se casado. E a cada segundo de olhada em seu marido, ela lembra de uma hora passada com Gabriel. O romântico e apaixonado Gabriel. Fica parada o observando pelo que parece ser um longo tempo – pelo menos para ela – até que finalmente resolve dizer algo:

- Como quiser, Gabriel.

Leandro Freire
Enviado por Leandro Freire em 02/02/2009
Código do texto: T1418566
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