Ciumenta
Contava com dez anos quando o pai o presenteou com um pacote de figurinhas colecionáveis. A cada ida à banca de jornal, a expectativa de encontrar a figurinha desejada, a que completasse a página, aumentava. Porém, um dia abriu o pacotinho e se enfeitiçou pela foto: estilo esportivo, faróis arredondados, carroceria de plástico e fibra de vidro, frente bem longa e a traseira curta, cor vermelho-paixão. Vidros verdes, bancos e volante esportivos: era ideal para duas pessoas.
A vontade de ter um carro, de preferência, o da foto, havia acabado de nascer. Nem quis mais continuar o negócio das figurinhas.
NAMORO DIFÍCIL
Aos dezessete anos de idade, Waldemarzinho trabalhava em um escritório como auxiliar e namorava a Dalva, uma garota da mesma idade que morava uma rua acima da dele. Ansiava por sua maioridade para que pudesse tirar a carta de motorista, mesmo não tendo carro.Economizava o que podia para isso.
Num final de semana, os namorados decidem ir ao cinema e na volta, dentro do ônibus, Dalva repousa a cabeça no ombro do rapaz e fecha os olhos, dando a impressão que dormia.
Os bancos do veículo faziam com que quatro passageiros ficassem de frente um para os outros, um seja, dois deles viajava no contra fluxo.
Ouviu a passageira dizer com voz melada a Waldemarzinho:
- Eu jamais dormiria tendo um namorado feito você! Só com você! - flertou.
Antes que ele pudesse dar resposta, Dalva já havia sentado a mão na cara da pequena, obrigando o motorista interromper a viagem e o cobrador a convidar os dois a se retirarem do carro.
Ciumenta. Era extremamente ciumenta.
A COMPRA
Casaram-se depois de oito anos de namoro. Dalva havia sido sua primeira e única namorada. Com três anos de casamento, não pensavam em filhos. Davam-se bem, viviam como namorados aos cantos da casa. Só algo incomodava a esposa: o fato de Waldemarzinho botar defeito em todo o carro que ela propunha para compra. Queria porque queria o mesmo modelo que vira em uma figurinha boba ainda criança.Buscava-o entre colecionadores, feiras de carros antigos, anúncios de classificados, em jornais.Ás vezes encontrava, mas com um preço muito além de suas economias.
Assim como a figurinha que apareceu em suas mãos de criança após meses de espera, o carro desejado apareceu em suas mãos de adulto após anos: muito judiado, mas com as peças originais. Comprou –o na hora.
ACESSÓRIOS
Dalva estava muito feliz com compra do marido. Ela sabia o quão importante era o carro para ele. Amava-o demais e por isso, respeitava o seu sonho de uma vida toda.
Ela já havia se acostumado a andar de ônibus. O trajeto de sua casa até o trabalho era pequeno. Não pegava trânsito, e o carro nunca estava lotado.
- Carro faz falta na hora de ir ao supermercado, ao cinema, passear... – pra trabalhar não! – dizia segura de si.
E ciente que seu marido era perfeccionista, sabia que demoraria um tempão para que o carro ficasse mais ou menos do jeito que ele queria: todo mês comprava um acessório para o seu Puma: um retrovisor, bancos, rodas, puxadores, retrovisores.
O carro ficou belíssimo depois de pronto. Waldemarzinho, ainda sujo de graxa, sentou no chão e chorou feito criança ao ver sua obra-prima.
MULHERENGO
Quando Waldemarzinho saía com o carro, não tinha um que não olhasse. Chamava a atenção de adulto, criança, homem ou mulher.
Tanto glamour chamou a atenção da mulherada. Do primeiro assédio, ele fugiu, com medo lancinante da mulher; do segundo, mais insistente, feito por uma loira cheia de carnes e curvas, sucumbiu. Tornou-se um mulherengo.
O carro fez com que ele despertasse para o universo feminino. Era como se as mulheres nunca houvessem existido, com exceção de Dalva, que havia se tornado sua namorada porque era amiga de infância, e por isso, sempre esteve com ela. Sua energia dedicava da namorada e o desejo de comprar o carro. As outras moças nunca havia lhe interessado...até então.
Experimentou o poder de sedução embalado pelas quadro rodas do seu possante.
A mulher bateu, ameaçou, xingou, humilhou uma dezena delasb de pretendentes. Ele arrumava outras. Já pensava seriamente no divórcio.
O ÔNIBUS
Dalva saiu mais cedo do trabalho naquela tarde de quarta-feira porque havia trabalhado a mais durante o mês e seu pátrão não pagava hora extra.
Aproveitou o tempinho, decidiu mudar o trajeto e se presentear com uma roupa: uma blusa, um vestido, uma calça....decidiria na loja.
Entrou no veículo e como de costume, recostou a cabeça no vidro do ônibus.Quinze minutos depois, sem querer, vê o carro de Waldemarzinho estacionado na garagem de uma casa pela janela.
Deu sinal, gritou para que parassem o veículo.Simulou um enjôo. Abriram na mesma hora.Desceu e correndo pela calçada, encontrou a casa: o carro era inconfundível.
A CIUMENTA
Tocou a campainha e como não abriram, começou a gritar que acabaria com o carro a pauladas. Waldemarzinho apareceu com as roupas na mão, seminu, desesperado com a ameaça da mulher. Uma morena vinha atrás, tão “vestida” quanto ele.
-Canalha! Que diabos de marido é você?
A amante confusa, quis entender:
-Você não disse que era solteiro? -sem obter resposta.
- Mas você alugou essa casa pra nós....- começando a entender. - Seu desgraçado!Você acabou com a minha vida! Eu te odeio!
O infiel dividia-se entre gritos e tapas da matriz e da filial, até que a amante entrou na casa, fugindo de uma surra anunciada pela Dalva.
- Eu posso explicar! Calma, me escuta! – defendia-se o condenado.
Enquanto discutiam, não perceberam que a morena havia voltado e lançado um chumaço de estopa embebido em álcool para dentro do conversível vermelho de Waldemarzinho.Ateou fogo.
Quando a chama subiu, o homem fez um gesto para salvar o veículo, mas foi impedido pela mulher e pela amante.
Enquanto vizinhos chamavam o Corpo de Bombeiros, Waldemarzinho chorava copiosamente; Dalva estava em choque; a amante gritava feito louca coisasb indecifráveis.
Quando os bombeiros deram perda total dos bens, Dalva agarrou as pernas da rival e gritou entre soluços:
- Tá perdoada! Tô livre ! Não tenho mais ciúme de nada!
(Maria Fernandes Shu- 03 de dezembro de 2009)
Contava com dez anos quando o pai o presenteou com um pacote de figurinhas colecionáveis. A cada ida à banca de jornal, a expectativa de encontrar a figurinha desejada, a que completasse a página, aumentava. Porém, um dia abriu o pacotinho e se enfeitiçou pela foto: estilo esportivo, faróis arredondados, carroceria de plástico e fibra de vidro, frente bem longa e a traseira curta, cor vermelho-paixão. Vidros verdes, bancos e volante esportivos: era ideal para duas pessoas.
A vontade de ter um carro, de preferência, o da foto, havia acabado de nascer. Nem quis mais continuar o negócio das figurinhas.
NAMORO DIFÍCIL
Aos dezessete anos de idade, Waldemarzinho trabalhava em um escritório como auxiliar e namorava a Dalva, uma garota da mesma idade que morava uma rua acima da dele. Ansiava por sua maioridade para que pudesse tirar a carta de motorista, mesmo não tendo carro.Economizava o que podia para isso.
Num final de semana, os namorados decidem ir ao cinema e na volta, dentro do ônibus, Dalva repousa a cabeça no ombro do rapaz e fecha os olhos, dando a impressão que dormia.
Os bancos do veículo faziam com que quatro passageiros ficassem de frente um para os outros, um seja, dois deles viajava no contra fluxo.
Ouviu a passageira dizer com voz melada a Waldemarzinho:
- Eu jamais dormiria tendo um namorado feito você! Só com você! - flertou.
Antes que ele pudesse dar resposta, Dalva já havia sentado a mão na cara da pequena, obrigando o motorista interromper a viagem e o cobrador a convidar os dois a se retirarem do carro.
Ciumenta. Era extremamente ciumenta.
A COMPRA
Casaram-se depois de oito anos de namoro. Dalva havia sido sua primeira e única namorada. Com três anos de casamento, não pensavam em filhos. Davam-se bem, viviam como namorados aos cantos da casa. Só algo incomodava a esposa: o fato de Waldemarzinho botar defeito em todo o carro que ela propunha para compra. Queria porque queria o mesmo modelo que vira em uma figurinha boba ainda criança.Buscava-o entre colecionadores, feiras de carros antigos, anúncios de classificados, em jornais.Ás vezes encontrava, mas com um preço muito além de suas economias.
Assim como a figurinha que apareceu em suas mãos de criança após meses de espera, o carro desejado apareceu em suas mãos de adulto após anos: muito judiado, mas com as peças originais. Comprou –o na hora.
ACESSÓRIOS
Dalva estava muito feliz com compra do marido. Ela sabia o quão importante era o carro para ele. Amava-o demais e por isso, respeitava o seu sonho de uma vida toda.
Ela já havia se acostumado a andar de ônibus. O trajeto de sua casa até o trabalho era pequeno. Não pegava trânsito, e o carro nunca estava lotado.
- Carro faz falta na hora de ir ao supermercado, ao cinema, passear... – pra trabalhar não! – dizia segura de si.
E ciente que seu marido era perfeccionista, sabia que demoraria um tempão para que o carro ficasse mais ou menos do jeito que ele queria: todo mês comprava um acessório para o seu Puma: um retrovisor, bancos, rodas, puxadores, retrovisores.
O carro ficou belíssimo depois de pronto. Waldemarzinho, ainda sujo de graxa, sentou no chão e chorou feito criança ao ver sua obra-prima.
MULHERENGO
Quando Waldemarzinho saía com o carro, não tinha um que não olhasse. Chamava a atenção de adulto, criança, homem ou mulher.
Tanto glamour chamou a atenção da mulherada. Do primeiro assédio, ele fugiu, com medo lancinante da mulher; do segundo, mais insistente, feito por uma loira cheia de carnes e curvas, sucumbiu. Tornou-se um mulherengo.
O carro fez com que ele despertasse para o universo feminino. Era como se as mulheres nunca houvessem existido, com exceção de Dalva, que havia se tornado sua namorada porque era amiga de infância, e por isso, sempre esteve com ela. Sua energia dedicava da namorada e o desejo de comprar o carro. As outras moças nunca havia lhe interessado...até então.
Experimentou o poder de sedução embalado pelas quadro rodas do seu possante.
A mulher bateu, ameaçou, xingou, humilhou uma dezena delasb de pretendentes. Ele arrumava outras. Já pensava seriamente no divórcio.
O ÔNIBUS
Dalva saiu mais cedo do trabalho naquela tarde de quarta-feira porque havia trabalhado a mais durante o mês e seu pátrão não pagava hora extra.
Aproveitou o tempinho, decidiu mudar o trajeto e se presentear com uma roupa: uma blusa, um vestido, uma calça....decidiria na loja.
Entrou no veículo e como de costume, recostou a cabeça no vidro do ônibus.Quinze minutos depois, sem querer, vê o carro de Waldemarzinho estacionado na garagem de uma casa pela janela.
Deu sinal, gritou para que parassem o veículo.Simulou um enjôo. Abriram na mesma hora.Desceu e correndo pela calçada, encontrou a casa: o carro era inconfundível.
A CIUMENTA
Tocou a campainha e como não abriram, começou a gritar que acabaria com o carro a pauladas. Waldemarzinho apareceu com as roupas na mão, seminu, desesperado com a ameaça da mulher. Uma morena vinha atrás, tão “vestida” quanto ele.
-Canalha! Que diabos de marido é você?
A amante confusa, quis entender:
-Você não disse que era solteiro? -sem obter resposta.
- Mas você alugou essa casa pra nós....- começando a entender. - Seu desgraçado!Você acabou com a minha vida! Eu te odeio!
O infiel dividia-se entre gritos e tapas da matriz e da filial, até que a amante entrou na casa, fugindo de uma surra anunciada pela Dalva.
- Eu posso explicar! Calma, me escuta! – defendia-se o condenado.
Enquanto discutiam, não perceberam que a morena havia voltado e lançado um chumaço de estopa embebido em álcool para dentro do conversível vermelho de Waldemarzinho.Ateou fogo.
Quando a chama subiu, o homem fez um gesto para salvar o veículo, mas foi impedido pela mulher e pela amante.
Enquanto vizinhos chamavam o Corpo de Bombeiros, Waldemarzinho chorava copiosamente; Dalva estava em choque; a amante gritava feito louca coisasb indecifráveis.
Quando os bombeiros deram perda total dos bens, Dalva agarrou as pernas da rival e gritou entre soluços:
- Tá perdoada! Tô livre ! Não tenho mais ciúme de nada!
(Maria Fernandes Shu- 03 de dezembro de 2009)