A ÓRBITA DE VÊNUS
Minha mãe havia dito que da próxima vez tomaria uma medida drástica. E foi o que ela realmente fez. Quando eu entrei em casa naquela noite -bêbada e drogada- minha mãe já me esperava com as minhas roupas nas mãos. “Vá embora, desgraçada!” foram estas as duras palavras que eu ouvi. Meu namorado me esperava o lado de fora, pois eu havia prometido pegar mais dinheiro. Ele já morava nas ruas e, a partir daquele momento, essa era a minha nova realidade. Não me importei muito porque eu já passava a maior parte do tempo consumindo drogas nas ruas. Porém a situação começou a ficar difícil, ninguém nos dava emprego. Resolvemos ir para a capital do Estado.
Em Natal, as coisas começaram a melhorar. Mas a gente ainda morava nas ruas e Maurício (meu namorado) sempre perdia os empregos que conseguia, seja por roubo ou porque o patrão descobria que ele era usuário de drogas. O grande choque veio quando eu soube que estava grávida. Maurício até me deu uma surra por causa disso. A partir daí comecei a fumar cada vez mais. Será uma sorte se meu filho não nascer com algum defeito. Eu nem pensava em parar de me drogar. Achava que aquilo ia esconder todos os meus problemas. Maurício me estimulava para tirar o bebê, porém eu nunca aceitei, não era justo.
Certa vez estávamos discutindo quando Maurício me empurrou. Eu caí e bati a cabeça, até desmaiei. Mas, como eu sou forte, isso não causou traumas nem em mim nem no meu filho.
Quando eu estava com cinco meses de gravidez, conseguimos uma vaga em um abrigo. Tudo começava a melhorar. O abrigo exigia que Maurício trabalhasse e parasse e usar drogas. A primeira parte ele cumpriu, mas a outra ele nunca acataria. Pelo menos até o fim da gravidez eu não consumirei nenhum tipo de droga, nem cigarro. Depois, eu não sei. Talvez uma criança me ensine a viver.
O último trabalho de Maurício foi em um posto e gasolina. Estava tudo bem até ele se envolver com o tráfico. Ninguém nunca desconfiaria. O comprador vinha encher o tanque do carro, na hora e receber o troco, o frentista (Maurício) entregava “algo a mais”.
Ontem foi um dia muito difícil. Maurício roubou trezentos reais do caixa do posto. O chefe dele descobriu e chamou a polícia. Esta facilmente concluiu que o ladrão também era traficante. O pai do meu filho foi preso, nunca mais quero vê-lo. Nesse mesmo dia eu telefonei para a minha mãe e contei tudo que me aconteceu. Felizmente, ela aceitou-me de volta. Também ontem, eu conheci um rapaz muito especial que vive uma situação parecida com a minha. Netuno. Bonito nome. Eu quero que me chamem de Vênus. Vênus como o planeta, Vênus como a deusa.
Agora eu estou em um ônibus. Vou para casa. Vou completar minha órbita. Uma órbita que eu não quero repetir.
ESTE CONTO FOI UMA PRÉVIA DO ROTEIRO "AS JORNADAS DE LAURA E NETUNO" QUE UE ESCREVEREI EM BREVE.