Marcas que o Tempo não Apaga III - Violência contra a Mulher

- Não, eu... Trouxeram-me aqui... Para registrar uma ocorrência...- ela respondeu sem jeito como se sentisse culpada por não estar com alguma lesão visível.

- Meu 'homi' me prendeu entre as ‘perna’ no chão e desceu a lenha na minha cara... E a senhora? Foi o que?

- Eu...- dizia ela vagamente não conseguindo pensar - Eu... Não apanhei... Fui agredida de leve... Ele não chegou a me bater...

- A senhora teve 'sorti', viu? Tem 'veiz' que passa 'mêis' e a cara não desincha, e dói 'dimais'...

- É a primeira vez que acontece isso com a senhora?- ela perguntou curiosa.

- Nada! Tem 'mai' de 'ano'... Ele bebe 'dimais', né dona? Só que vi na tv que tem essas 'delegacia' e eu cansei de 'apanha'... Tenho que 'lava' banheiro das 'madame' pra 'sustenta' meus 'fio’, porque o ‘homi’ bebe tudo que ganha...

Falou com tranqüilidade, como se acostumada a situação, olhou para ela medindo-a e perguntou:

- 'Mai', viu? A senhora se 'machucô'?

- Não...- respondeu com o olhar fixo no nada.

Não conseguia falar...Sentiu um pânico...O que faria quando voltasse para casa? Como olharia seus filhos? Com toda educação que lhes deu, como explicaria tudo isso? Ela deveria separar-se... Seus filhos entenderiam... Mas o que seria dele, o pai de seus filhos? O que ganhavam não conseguia dar conta do necessário... A lei estava do lado dela, ele sairia mais prejudicado do que já está... Ela teria que arrumar um emprego... Fazia anos que não trabalhava... Não era mais a jovem sonhadora... Não concluiu os estudos... E agora?

Arrumou a bolsa no ombro que nem havia tirado em momento algum, olhou em volta e saiu caminhando em direção a porta. Antes de sair, olhou para trás, baixou a cabeça e saiu.

>>>continua>>>>

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Fases da violência doméstica

As fases da situação de violência doméstica compõem um ciclo que pode se tornar vicioso, repetindo-se ao longo de meses ou anos.

Primeiro, vem a fase da tensão, que vai se acumulando e se manifestando por meio de atritos, cheios de insultos e ameaças, muitas vezes recíprocos. Em seguida, vem a fase da agressão, com a descarga descontrolada de toda aquela tensão acumulada. O agressor atinge a vítima com empurrões, socos e pontapés, ou às vezes usa objetos, como garrafa, pau, ferro e outros. Depois, é a vez da fase da reconciliação, em que o agressor pede perdão e promete mudar de comportamento, ou finge que não houve nada, mas fica mais carinhoso, bonzinho, traz presentes, fazendo a mulher acreditar que aquilo não vai mais voltar a acontecer.

É muito comum que esse ciclo se repita, com cada vez maior violência e intervalo menor entre as fases. A experiência mostra que, ou esse ciclo se repete indefinidamente, ou, pior, muitas vezes termina em tragédia, com uma lesão grave ou até o assassinato da mulher.

Shimada Coelho A Alma Nua
Enviado por Shimada Coelho A Alma Nua em 27/11/2008
Reeditado em 27/11/2008
Código do texto: T1306084
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