QUADRILHA DE CHEVETEIROS
Viajava com muita freqüência a São Paulo. Numa dessas viagens, tive a companhia de duas senhoras. Uma delas dizia ser mãe de um rapaz que fazia residência médica no Hospital das Clínicas. Aproximando-nos de Santa Isabel, a última parada que faríamos antes da Estação Rodoviária, Dona Raimunda descobriu que não tinha o endereço do filho, nem seu telefone.
- Não tem problema, minha senhora. Se tiver o número de alguém que possa prestar informações, tenho algumas fichas telefônicas; tentaremos dar um jeito nessa situação.
- Tenho sim; tenho sim.
Apanhou na bolsa um papel que continha o número telefônico de um parente em Londrina, no Paraná. Telefonei e, com as informações obtidas, localizei o médico-residente.
- Doutor, estou com sua mãe e uma tia no Viaduto Glicério, em São Paulo.
Do outro lado, uma voz sonolenta respondeu:
- Em meia hora estarei aí.
Despedi-me das companheiras na intenção de pegar um táxi.
- Agora, com licença... Vou para o hotel. Preciso descansar um pouco antes de começar a fazer as compras.
- Pelo amor de Deus, não nos deixe sozinhas aqui, a uma horas dessas! – disse uma delas.
- Pois não. Esperarei até que alguém venha buscá-las.
A espera foi de uma hora e meia. Então, um Monza escuro aproximou-se; desceu dele um jovem de aproximadamente 30 anos. Fui apresentado como um amigo de viagem que tinha sido muito gentil durante o percurso de 46 horas de jornada do Piauí a São Paulo. “Oi.” foi a única palavra que ouvi de sua boca. Embarcou com sua parentela e deixou-me sozinho, de madrugada, debaixo de um viaduto.
Acenei para um táxi que passava.
- Por favor, me leve até o Hotel Vitória, na Rua Cavalheiro, no Brás.
Mas o taxista tomou sentido oposto.
- Amigo! Pedi para o senhor me levar ao Brás e está me levando para Barra Funda. Por favor! Mude a direção; está indo em sentido contrário.
O taxista andou em círculo, tentando enganar-me, e tomou novamente o rumo da Barra Funda.
- O senhor não me ouviu? Quero ir para o Brás. Pare o táxi. Vou descer aqui.
Ele, porém, fingiu ser surdo e imprimiu maior velocidade ao veículo. Tomei uma decisão arriscada: meti a mão no bolso da jaqueta e simulei apontar-lhe uma arma.
- Pare agora, ou serei obrigado a atirar. Não brinque comigo!
O Chevette parou, e eu desci com minha mala e uma pasta. Senti as pernas tremerem. Não poderia ficar ali. Era perigoso! Estava ao lado do Parque Dom Pedro, em plena madrugada.
Minutos depois, uma luz de faróis aproximava-se. Eu não tinha um canivete para defender-me. “Deve ser o taxista voltando para me assaltar.”, pensei. Mesmo assim, dei sinal. Não era o mesmo taxista.
- Leve-me ao Departamento de Investigações (DI) mais próximo; preciso registrar uma queixa contra o motorista de um Chevette azul, placa XYZ..., de Santos.
- Era um táxi?
- Sim, pela cor da placa, era licenciado como táxi.
- Não era táxi. Posso afirmar para o senhor. Tem uma gangue conhecida como “cheveteiros” atuando nesta região. Rodam com placa vermelha, mas a licença é falsa. Levam os passageiros para a Barra Funda, tomam tudo que têm e, quando não os matam, soltam-nos em lugar distante. Posso levar o senhor para o DI; tem um aqui pertinho, mas isso só lhe vai causar aborrecimentos. A justiça é muito lenta e desinteressada em resolver esse tipo de crime. Há quem diga que tem policial envolvido nos assaltos. O amigo será chamado a depor várias vezes e só vai passar raiva; não dá em nada.
- Nesse caso, leve-me ao Hotel Vitória, no Brás.
LIMA,Adalberto;SILVA, Francisco de Assis Lima. Fagulhas e Lampejos