Calixto

Todo o tempo em que fiquei lá eu me diverti, joguei pra cima toda minha capacidade de sofrer e agucei meu faro para poder escolher melhor. Sempre que alguém se aproximava eu estendia a mão e todos gostaram de mim. Até nas invenções extraordinárias de meu amigo Calixto me envolvi e quando ele não tinha o que comer eu doava meu pedaço. Passamos meses planejando e não realizamos nada, enquanto fumávamos na sacada uma negra mulher me chamou, abracei seus ombros enquanto ele ficou torcendo por mim lá de cima, infelizmente eu não podia dividir isso.

Nos meses seguintes abrimos um negócio, enquanto eu assava carne de boi sem inspeção ele vendia cervejas, vivemos bem por algum tempo até gastarmos nosso dinheiro em coisas fúteis e enquanto dávamos risada perdemos tudo. È a vida é assim mesmo, nos dias seguintes surgiram mais problemas, nem eu e nem ele resolvíamos nada sequer, passamos fome comendo apenas uma vez por dia e quando comia a gente agradecia a nós mesmos. Mas tudo passa, aluguei um computador e comecei a vender cartões, o dinheiro chegava e o que eu fazia era chamar meu amigo pra comer comigo, com dois reais e cinqüenta almoçávamos no meio do calçadão com bom humor e esperança, afinal as coisas estavam mudando. Fizemos algumas músicas e vendemos aos políticos da cidade, eram jingles horríveis, mas pra eles parecia legal, sempre fui bom em rimas e gargalhando criamos umas dez músicas, uma pior que a outra.

Todos os dias por volta das quatro da tarde, Calixto sumia, montava em sua bicicleta e descia a rua do bairro Tropical, sempre que eu perguntava, ele dizia que havia ido comprar alguma coisa, mas sempre retornava de mãos vazias. Ora, como alguém sem dinheiro pode comprar algo? Eu me perguntava. Sem tocar no assunto durante todo o tempo que fiquei lá ele seguiu esta rotina, eu silenciava e só depois de muito tempo descobri que ele ia visitar a sua filha, acho que ele não gostava de tocar no assunto por isso eu não questionava apenas debochava um pouco, só pra variar.

Nossa amizade se intensificou, enquanto minha namorada me deixava de lado ele se tornava minha única companhia. Um dia fomos ao parque Chico Mendes observar as onças, lá haviam onças negras e pintadas, sentávamos e ficávamos a observa-las, elas eram lindas obras perfeitas de algum Deus. Enquanto eu contava estórias de meu passado ele quase morria de rir e quando falava de minha vontade de ir embora de lá ele me aconselhava ao contrário cheio de certezas, sonhando como louco e falando asneiras.

Quando Mariane Decidiu me deixar eu resolvi partir, não Havia mais o que se fazer lá, eu havia chegado na cidade pra ficar com ela e ser feliz com ela, mas tudo deu errado, rodeada de pessoas ela se desinteressou por mim e eu sabia o que precisava fazer e foi o que fiz. No dia da partida Calixto ainda tentou me convencer do contrário, mas eu relutei, dei um abraço em meu amigo e pra ele doei um livro. Depois de muitos anos voltamos a ter contato, ele me disse que parou de fumar eu disse que ainda fumava, ele ainda tenta a vida com seus planos infalíveis que óbviamente nunca dão certo, me chamou novamente pra trabalhar com ele, viajar por aí, Brasília, Goiás, Minas, eu disse que não podia agora mas ele insistiu, expliquei o caminho da minha estrada, ele aceitou e acreditou em mim, amigo é pra essas coisas, amizade deve ser assim.

rdeorristt
Enviado por rdeorristt em 17/10/2008
Código do texto: T1234419
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