Estilhaços e fragmentos de guerra
A mulher instruiu às pressas as três crianças que se banhavam no pequeno cômodo em duas tinas. Cada uma deveria seguir sozinha para o esconderijo combinado. Na rua encontrou um menino de uns três anos, também sobrevivente. Deu-lhe a mão e apressaram-se. Foram pegos pelo soldado inimigo que também deu-lhes a mão e correram do fogo. O soldado levava uma lata com uma gosma e enquanto este se virou, ela enfiou os dedos na lata e passou-os firmemente na boca e no nariz do homem. O soldado não teve tempo de reagir, esmoreceu e caiu morto.
Nas ruas incendiadas, nenhum outro ser vivo. No chão, como uma grossa camada de parafina quente amornava e não lhe queimava tanto os pés. Colocou as mãos lá e tentou livrar-se do veneno da lata que ficara impregnado. Acabou de limpar-se na roupa. Depois correu com o menino no colo e esperou as outras crianças que tentariam chegar uma a uma.
Nos escombros onde se abrigaram, o menino dormiu e ela agachou-se. Pensou no soldado morto. Nunca pensara que pudesse matar alguém e o fez por instinto de sobrevivência. Pensou nas tinas onde as crianças banhavam-se. Os pais deveriam ter colocado lá para entreterem e isolarem os filhos das tragédias recentes. No outro dia procuraria novamente as crianças. Dormiu exausta. Despertou com muito frio quando o fogo acalmou-se de todo nos arredores.
O menino acordou com fome. Voltou, com cuidado, o menino no colo, aos escombros da casa onde ficaram as três crianças. Encontrou-as mortas. Deu de comer ao pequeno uns restos de pão encontrados sobre a mesa entre coisas reviradas por algum soldado e comeu também; pensou no inimigo. Olhou pela fresta e viu destruição; chorou. Levantou a cabeça e viu uma arma apontada para si.