(Trágica fá)bula de final de século

Seu Zé Delfino era um Senhor de mais de meia-idade. Já com seus 60 e poucos anos, era um pobre velho impotente, aposentado, mas prudente.

Sempre levou a vida na maior das calmarias. A coisa única que lhe custava algumas palpitações a mais no peito eram os jogos do Brasil contra a Argentina, ou em (Olim)píadas, ou em Copas do Mundo, ou em amistosos… Fossem quais fossem: Uma ondinha naquele mar de serenidade!

Em verdade, Seu Zé, que de mané não tinha nada, nunca teve grandes complicações ou desentendimentos com a saúde.

Não tinha também sucessores. A mulher, Dona Fransquinha, ligou as trompas, depois de um parto mal-sucedido.

Seria seu primogênito e filho único talvez. Um "bambino" lhe traria sangue novo e faria colorir aquela velha casa com tantas photographias em preto e branco: Fotos de Quinha (Ele a chamava assim) quando moça, de seus pais, de seus irmãos, da parentada toda, enfim - Coisa que Zé Delfino não tinha!

E a vida (se) passava assim, calma ou tediosamente! Até que um dia, Seu Zé ia pela rua, acabrunhado, mais do que de costume. E então, o dono da farmácia, um cujo nome não me recordo, lhe chamou a um particular e receitou-lhe um "remediozinho" contra impotência (: Os dois eram bons amigos e não tinha dessa de não conversar acerca do assunto). Disse-lhe tudo de que precisava saber a respeito do tal remédio. Seu Zé nem corado havia sequer, e saiu correndo para casa, contar à mulher! E Dona Fransquinha, com seus fragílimos 57 anos, desbotou com a novidade!

Na verdade, não gostou nada! Fez queixa a Zé Delfino de que estaria ele exagerando na dose, disse, redisse, não fez almoço nem janta durante um dia, inventou, falou em contra-indicações. Mas nada! Um dia, ameaçou até de ir embora! Mas nada de nada!

E todo santo dia, o velho ia lá e pimba! O pior era que a boa Senhora não podia nem pensar em dizer "não"; que "não dava"!

Seu Zé disse-lhe, um dia, quando alegava "dor de cabeça":

- O remédio é caro, mulher!

Claro que é "caro"! O remédio ainda cheirava a novo. Coisa nova, importante, importada... não poderia ser, assim, desperdiçada!

E Zé Delfino já olhava com os olhos do despudor. Já fazia gracinha com a mocinha faceira que passava, e, pouco a pouco, deixava o outonal banco das praças-quase-desertas para adentrar na roda da Boemia.

Há muito que não ia à missa. Pudera! As beatas já se benziam quando, de longe, lhe pressentiam a vinda (o perfume era sempre o mesmo)!

O homem respirava novos ares. Mas Dona Fransquinha não podia: Era uma daquelas velhinhas baixinhas, engraçadinhas... que nem a idade que tinha os olhos do povo julgavam ter!

Mas a pobre Senhora tinha mesmo era uma baita dor nas costas:

- A velha já não dava conta! – Conta ele.

E isto o acabrunhava mais e mais, embora estivesse os tais novos ares respirando.

Até que, em uma bela manhã de céu nublado, já nos finais de 98, Dona Joaquina ou Dona Fransquinha (o nome era Franscisca Joaquina) encontrou (ou sentiu) lhe roçando entre os seios um bilhete. "A letra era do Zé". Mas não vá pensar o leitor que o bilhete que Zé Delfino deixou à sua mulher foi o de um suicida - Pelo contrário: O velho havia fugido com Maria Du Gorjette, anfitriã de todas as noites de orgia entre os rapazes, constantemente ameaçada pelas meninas do bordel...

Siiiiim! Maria Du Gorjette! A viuvona! A única ninfomaníaca, até ali, assumida!

na noite de 31/05/98