A vida na vila - I
Todos os dias Pedro fazia o mesmo. Correndo pelas ruas de pedra, por vezes dando uma topada ou outra, levava um recado. Era o portador das mensagens. Neste dia ele estava incumbido de levar um recado ao seu Manoel. E não era tarefa das difíceis. Alguns dias Pedro ia longe da vila, subia as montanhas, saltitava pelos vastos campos e deixava a vida correr. Nos dias em que carregava uma mensagem, corria feliz. Levava consigo muitas vezes boas novas. Por vezes, claro, as missões não eram tão agradáveis. Mesmo assim ia lá o menino. Atravessava na frente das carroças e, com pés calejados, lograva não pisar numa poça ou outra. Era contente.
No meio do dia, entra Pedro porta a dentro. Dona Maria ficou danada! Gritou que ele não tinha limpado os pés nem batido na porta.
- Pedro! Que falta de educação! - e lá ia reclamando da vida e de Pedro, andando até o tanque.
Do quarto, Manoel escutou a barulheira. Já se levantava mas o menino rompeu as pressas, tropeçando no velho chinelo de Seu Manoel que ficava à beirada da porta. O sorriso no rosto da criança era evidente. Ele vinha espevitado.
- Seu Manoel! Seu Manoel! Seu filho chegou do mar! - entre frases imperfeitas e apressadas, o guri trazia a novidade, tranqüilizando o coração do velho, que aguardava com ansiedade os filhos que vinham da pescaria. O pequeno falava de Roberto, o filho mais velho de Seu Manoel. Pescador experiente. Havia partido com seu irmão mais novo há uma semana para a baía da Ilha Grande, e já se demoravam demais. No “Velho do Mar” , barco da família, ainda estava o velho Antônio, pescador famoso da vila. Não tão famoso pelo que conseguia no mar, mas pelas belas histórias que contava dele. Era o tipo contador de histórias, gentil, com voz suave. Em volta da fogueira, na Praia do Pontal, muitas vezes as crianças iam dormir tarde da noite, após horas e horas de fantasias e sonhos intermináveis, que sempre sobravam para o dia seguinte. E lá ia Seu Antônio contar mais, o querido dos meninos.
Seguiu-se então a honrosa recepção dos pescadores. O cais estava cheio, faziam número; as moças, as esposas, as crianças, as mães, e todos da vila que, apesar de estarem habituados ao ritual, sempre se regozijavam com a volta. As voltas eram quase todas felizes. As que não eram tão felizes, eram lembradas com silêncio e respeito.
Continua...