Memória

""Negar a si mesmo é muitas vezes encontrar-se com Deus, com o teu Deus" Fernando Anitelli

Roberto era um carioca da gema, do tipo que sempre dá o popular jeitinho brasileiro para se livrar das culpas e conseguir o que quer. Sempre mente, trapaceia e não se importa com os outros. Havia chegado ao cargo de gerente da em presa, atropelou uns cinco pelo caminho. Mas que importa? Eu consegui não foi? – pensava ele. Não era o mais competente, mas em compensação era um manipulador formado, o engraçado era que poucos tinham raiva dele, é claro, nada como ser simpático e fazer piada com as pessoas elas esquecem rápido o quanto pisou na cabeça delas. Era casado e bem casado, escolheu a esposa a dedo, era bonita, cuidava bem dele, da casa e seria uma boa mãe quando chegasse a hora. Quanto ao amor, o amor para ele não existe, são negócios se esperar pelo amor, mesmo que si case algum dia, o amor mais cedo ou mais tarde acaba, prefiro um negócio mais rentável. Era assim que Roberto pensava, quanto ao sexo, traia a mulher com quem aparecesse na frente e sem dor na consciência, sou homem, era assim que ele pensava.

Depois de dois anos no cargo de gerente, foi a filial em São Paulo, conheceu uma garota no avião, sentiu uma forte atração, e decidiu se aventurar com a garota. A moça morava no interior do estado, levou ela para casa de ônibus, para que ela não pensasse que ele tinha dinheiro, mas foi na volta que tudo aconteceu.

Voltando para a capital sozinho, dentro do ônibus, pensando no quanto ele era bom, em como foi bom conhecer a garota e no quanto tinha sentido prazer em transar com ela. Um caminhão desgovernado, veio na direção do ônibus, o motorista tentando desesperadamente desviar perdeu o controle do ônibus que caiu, junto com o caminhão no barranco da estrada, Roberto ficou preso no banco, havia fraturado as duas pernas e não conseguia se mexer, o homem sentado no banco de trás o tirou desacordado de dentro do ônibus, que segundos depois, com mas da metade dos passageiros ainda dentro, explodiu.

Roberto foi parar em um hospital público, sem memória, não lembrava se quer o nome, e parecia altamente perturbado, assim que se recuperou das fraturas nas pernas, foi internado em um asilo psiquiátrico.

Parecia ser uma pessoa vazia, foi quando conheceu Clara, uma enfermeira alguns anos mais velha que ele. Ela se dedicou a recuperação dele, e meses depois as perturbações passaram e ele parecia, apenas um homem desmemoriado.

- Agora que está bem, precisamos de um nome – disse Clara.

- Mas não me lembro.

- Isso é bom, pode decidir como quer ser chamado.

Ele pensou um pouco e depois respondeu:

- Eu gosto de Miguel.

- Miguel, é o nome de um Arcanjo.

- Foi por isso que escolhi – respondeu Roberto, e a partir desse dia passou a ser Miguel.

Miguel arrumou emprego, conseguiu alugar um apartamento e começou a construir sua vida, parou de tentar saber o passado, Clara tinha razão, para que saber do passado se posso escolher o presente – era assim que ele pensava agora. Podia ser agora um novo homem, e realmente o era, honesto e muitas vezes até inocente, algumas pessoas faziam amizade apenas para abusar de sua boa vontade e generosidade. Um dia ele cansou dos abusou e começou a cuidar mais de si mesmo, e viver a sua vida em pró da justiça tanto consigo mesmo quanto com os outros. Depois de alguns dois anos, decidiu se unir a Clara, nunca havia tido nada com ela até então, queria estar estabilizado e ter a certeza de que realmente a amava e que não estava com ela apenas por gratidão, finalmente os dois se unirão em um amor verdadeiro.

Três anos depois, um homem velho de barba bateu em sua porta, ao abri-la, uma mulher chorando descontrolada, grita meu filho. Era a mãe de Roberto, para Miguel, aquela cena pareceu estranha, aquela mulher que gritava não lhe inspirava sentimento nenhum. Clara foi até a porta ver o que estava acontecendo, ficou na lateral olhando, foi quando uma mulher loira, jovem e linda entrou e se jogou nos braços de Miguel que a empurrou com repulsa. Quem são vocês? Perguntou ele. Somos sua família, responderam os estranhos. Minha família é a Clara, respondeu Miguel. Os estranhos insistiram tantos, que Miguel decidiu ir ao Rio de Janeiro, se encontrar com seu passado. Clara não fez objeção e disse que estaria sempre ao lado dele.

No Rio de Janeiro, Miguel se encontrou com seu passado como Roberto, descobriu quem ele era, e não gostou do que viu, as traições, a falta de ética e a falta de caráter, não agradar sua nova visão. Percebeu também que sua família e seus amigos na verdade não se importavam verdadeiramente com ele, não via amor nos olhos das pessoas, principalmente de seus pais e de sua esposa. Com o tempo acabou recuperando a memória, foi quando se sentiu mais perdido, haviam monstros dentro dele, seu lado mais sombrio apareceu e seu nome era Roberto. O que fazer? Dividido ao meio entre duas personalidades. Confuso foi a praia, procurar as respostas na natureza, conversou consigo mesmo, conversou com Deus e olhando o mar, finalmente encontrou a resposta dentro de si. Foi a Cada de sua família, olhou para eles e disse com uma sinceridade tocante.

- Roberto não existe mais, eu sou Miguel, sou paulista, nem sotaque de vocês eu tenho, não tenho mais espaço nesta vida. Se realmente algum de vocês gosta de mim, minha casa em São Paulo estará aberta, vocês são livres para conhecer a mim e a nova pessoa que sou hoje, quanto a esse Roberto que um dia eu fui, morreu em um acidente de ônibus, à cinco anos atrás. Peço desculpa a vocês, mas tenho uma esposa a quem amo, uma casa e um emprego digno e é para lá que quero voltar. Obrigada e Adeus, terminou entregando o papel do divorcio para sua ex-mulher.

Finalmente Miguel foi para casa, e nunca mais ouviou se quer falar naquelas pessoas...

Sabrina Ferreira
Enviado por Sabrina Ferreira em 26/09/2008
Reeditado em 20/02/2009
Código do texto: T1197632
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