Semente Maldita
O papel vermelho que tinha nas mãos lembrou o sonho que tivera .
No sonho ela sentia um imenso alivio , a poça de sangue que escorria no chão lhe dava uma sensação de liberdade, de horror e de culpa . Tudo ao mesmo tempo .
Não quis ver como era. Carne . Era apenas isso e mais nada. Carne, matéria morta. Mas o que estava a amedrontando tinha vida, e por mais que quisesse não conseguia parar de pesar nisso.
Já estava ali e não ia adiantar se sentir culpada .Quanto tempo ficou parada ? 1 segundo, 1 minuto 1 hora . Não sabia. Mas o que importa o tempo? Ela sabia que nada , pois vivia do mesmo jeito que a mãe e avó haviam vivido.
Mas não, não era culpa delas toda essa desgraça! Era dele e apenas dele. Aquele por quem ela perdeu todos os sentidos, por quem esqueceu seus medos, aquele em que ela acreditou ingenuamente. Mas não era hora de lembrar dessas coisas , nem do sonho , nem dele .
Ela deixou-se levar para dentro do consultório, como se fosse uma criança. Mas ela não era mais uma criança, era uma mulher . E de repente , sem mais nem menos , uma serenidade a invadiu . Era isso mesmo que queria fazer. Não havia volta.
A sala de cirurgia era de um azul celeste, da mesma cor do céu em dia de sol. Enquanto a preparavam para cirurgia, ela lembrou das histórias de terror que avó lhe contava. Davam um medo gostoso , diferente do que ela sentiu ao entrar . Pensou nas amigas , como queria estar na praça tomando sorvete com elas, e pensou em um monte de coisas mais , como se tudo aquilo não fosse com ela.
Adormeceu. Quando acordou era como no sonho ,a poça vermelha estava ali . Mas diferente do sonho não conseguiu ver o que tinha lhe causado tanto medo durante esses últimos meses. Não precisava. Morto estava e morto ficaria.