Espero Meu Amor Chegar
Estava há cerca de vinte minutos sentado sobre o banco de pedra do parque, esperando-a. Não se importava de estar lá, nem sequer parecia impaciente. Não usava relógio de pulso. Achava-os desconfortáveis e feios. Ao invés disso, preferia o velho e bom relógio de bolso. Dera corda nele antes de sair de casa, e mantinha-o no bolso de dentro do casaco, caso precisasse certificar-se de que horas eram. O sol fraco iluminava o parque com tons alaranjados, se pondo vagarosamente, e uma brisa gélida e refrescante soprava em direção ao rosto dele. E ele esperava a chegada de seu amor.
Algumas crianças ainda se divertiam, balançando-se nos brinquedos, correndo uns atrás dos outros, caindo e chorando, levantando-se e sorrindo. O tempo parecia passar particularmente devagar, ou seria apenas impressão? Ele baixou o olhar, pousando-os em seus próprios pés. Calçava um par de sapatos pretos e bem engraxados. O pé começava a tremer (sinal de impaciência). Por que ela não chegava? Havia marcado com ela as quatro, e já eram quase seis. Não, na verdade, não sabia se eram realmente seis. Apenas parecia que eram seis. Puxou o relógio de bolso, abriu-o e olhou. 17:00h.
Ao ver suas mãos, levou um susto. Ora, mas o que era aquilo? A mão parecia a de um idoso, com veias pulsantes, a pele fina e enrugada, marcas de idade por toda a sua extensão. Franziu o rosto, coçou a cabeça. Levou o relógio – polido, de prata – até a altura dos olhos, na tentativa de ver seu próprio reflexo na pequena superfície circular.
Rugas, rugas, rugas. Cabelo branco, olhos pequenos, cansados, expressão de terror. O que estava acontecendo? Quem era aquele para o qual olhava? Ele próprio? Parecia um pesadelo surreal. Como poderia estar velho? Tinha apenas vinte e oito, e agora olhava para um homem que devia ter uns oitenta. Pensou em gritar, chamar por ajuda, perguntar o que estava acontecendo, mas as palavras perderam-se em sua garganta. O que dizer? Quem iria acreditar em uma coisa louca como aquela? Nem ele mesmo acreditaria, se não estivesse acontecendo com ele.
Com as mãos trêmulas, guardou o relógio de volta em seu bolso. Um homem se aproximava. Era estranhamente parecido com ele próprio, e deviam ter mais ou menos a mesma idade – vinte e oito, não oitenta. Veio com as mãos nos bolsos, usando uma roupa estranha – uma calça azul de tecido pesado e uma camisa colorida. Estava sorrindo, arrastando os pés e fazendo uma densa nuvem de poeira subir.
- Vamos, papai?
O homem sentado no banco olhou para os lados, certificando-se de que era com ele que estava falando. Chamando-o de pai.
- Está falando comigo? – perguntou, encolhendo-se em seu canto. Só queria ser deixado em paz, esperar sua amada e ir embora dali, quem sabe para tomar um sorvete e rir um pouco.
- Pai, sou eu, Júlio. – disse o outro – Seu filho.
- Filho? – perguntou, perplexo. Mas que tipo de brincadeira estúpida era aquela? – Eu não tenho nenhum filho!
- Oh, não. – disse Júlio. – Pai, o senhor tomou os seus remédios hoje?
- Remédios? Para que tomar remédios? – perguntou, ficando cada vez mais confuso – Eu não estou doente!
- Em que ano nós estamos? – o homem que dizia ser seu filho perguntou, os olhos fechados. Impaciência.
- O quê?
- Responda, por favor, em que ano nós estamos?
- Ora, em 1955, e onde mais?
- Pai, por favor, olhe pro pingente no seu pescoço.
- Mas que...
- Olhe, por favor. Só... olhe.
O homem abaixou o olhar. Sentiu uma pequena corrente em seu pescoço, e, puxando-a, viu que havia pendurada nela um pingente dourado. Havia alguma coisa inscrita, mas sua visão turva não conseguia deixá-lo ler.
- O que... o que é isso?
- O telefone e o endereço de casa, papai. Temos que ir.
- Ir para onde?
- Para casa. Para sua casa.
- Mas eu... eu estou esperando alguém.
- A dona Rosa, não é mesmo?
- C-Como sabe?
Júlio riu levemente.
- É minha mãe.
- E onde ela está?
O homem puxou um cilindro alaranjado do bolso. Abriu-o e pegou um dos comprimidos.
- Mastigue um desse e eu te contarei tudo, certo?
- O que é isso? – disse ele, pegando um e colocando-o na boca. O gosto era amargo.
- Seu remédio. Eu sei que é amargo, mas agora vai ficar tudo bem. Vamos para casa?
- A casa da senhorita Rosa?
- Isso mesmo.
Júlio guardou o remédio para o Mal de Alzheimer do pai em um dos bolsos.
- Fica muito longe?
- Não.
- Nós estamos em 55, não estamos?
- Não, papai. Estamos em 2008.
- 2008? Mas o quê?
- Não se preocupe. Agora vai ficar tudo bem.
Continuaram andando, e as palavras perderam-se durante o curto percurso até a casa.