Claquete, câmera...

A excelência, dirigindo-se ao homenzinho com chapéu de palha:

-- De um nada a chefão, o que fui e o que sou! Estou mais por cima do que já estive por baixo. É direito adquirido, meu senhor!

-- O sinhô tem o direito de ficar calado, isso tem! Direito tive eu de enfiá vossa excelência na capitar pra me defender. Defender, pois sim! Acordei cedo e não fui trabaiá, pruquê o moço no rádio ficou batendo na minha cachola, a toda hora santa: “votá é um direito”! Comi um pão seco e bebi um pouco de água saloba. Dispois, no lombo de um jegue, gastei a manhã. Fiz fila debaixo dum sor de nordeste que o sinhô num cunhece bem cumo eu. Na vorta, gastei a tarde. Cheguei molhadim, molhadim de suó. As criança esperava, achano que eu vinha do trabaio e trazia as fruta de sempre (choraro tanto, as coitadinha!). Dispois, o sinhô num veio mais aqui. O fio do vizinho mandô treis carta dizeno que a gente percisava de mais cesta iguar aquelas que chegaro no tempo das eleição (as que tinha tumém os santinho c’a sua cara, num alembra?), mas as carta, parece que o sinhô num viu. Aí, a assombração aparece de vorta, co’essa cara deslavada, quereno apertá minhas mão? Vô dizeno que num quero mais as cesta e num quero mais o sinhô, tumém!

A excelência, baixando os olhos, envergonhados, deixou pingar uma gota de lágrima, que secou rapidamente com a mão. Virou-se num rompante e disparou a correr. Não seguiu na direção do carro blindado, nem deu importância à correria dos seguranças, que o perseguiram confusos. A uma certa altura, quando os pulmões deixaram de fornecer o oxigênio que seu corpo saturado precisava, permitiu-se prostar com o rosto fincado na terra, para de lá não mais sair.

-- Corta! Bom trabalho, senhores! Até amanhã.