Mãofredini
Uma vez, seu Luiz inventou o “Mãofredini”.
O “Mãofredini" era um boneco de mão, muito engraçado, que fumava e depois cuspia nas crianças daqueles tempos, e eu era seu maior fã. Ele era feito com a mão fechada, como uma cabeça de cobra, e o polegar, ligeiramente dobrado, fazia os movimentos de um lábio inferior. O resto do braço ficava vestido com um meião preto cortado no punho, que se confundia com o pano de fundo do teatrinho, também preto. A platéia tinha, então, a nítida impressão de que ali só havia a cara do “Mãofredini”. Os olhos e lábios eram pintados com canetinhas coloridas e tinha também um chapéu coco grudado com “durex”.
“Mãofredini” apresentava-se para nós todos os anos, na véspera do Natal. Habilmente dublado por seu criador, que ficava escondido na parte de trás do teatrinho, ele já chegava perguntando:
- Quem vocês estão esperando aí?
- Papai Noel...
- Papai Noel não vem. Furou o pneu do trenó...
Então ele ficava com vontade de fumar e um assistente colocava-lhe um cigarro na boca. O próprio assistente voltava para trás do teatrinho e soprava fumaça através de uma mangueirinha instalada por dentro do meião preto, que saía direto na boca do boneco. Aí “Mãofredini” fazia careta e dizia:
- Nossa! Que coisa ruim e fedorenta! Desse jeito vou ter que cuspir...
O pobre do assistente trocava a fumaça por água e, assim, “Mãofredini” distribuía cusparadas para todos os lados, molhando todo mundo e fazendo a molecada rachar de rir. Ao final, ele perguntava de novo:
- Quem é mesmo que vocês estão esperando aí?
- Papai Noel...
- Papai Noel não vem. Deu caganeira nas renas...
Era assim que seu Luiz divertia as crianças daqueles tempos, distraindo-lhes a atenção, enquanto alguém vestia as roupas de Papai Noel, para depois distribuir os presentes. Parafraseando o poeta, nos tempos em que comemorávamos um Natal Feliz... Éramos felizes e ninguém tinha morrido.
O poeta vai folheando seu álbum de memórias enquanto o tempo implacável nos arranca a doce ingenuidade de poder crer em Papai Noel, Papai Herói, Papai Imortal.
Esse mesmo tempo implacável que agora não me permite dizer ao “Mãofredini” que meu verdadeiro ídolo era aquele que ficava escondido na parte de trás do teatrinho.
- Seu Luiz não vem mais. Furou-lhe o pneu da vida... Ou deu caganeira em seu anjo de guarda.