VIRGEM
Depois de um dia de labuta, carregando duas bolsas em pé, nos ônibus lotados, atendendo as suas vaidosas clientes, a cabeleireira chegou em casa.
- Dona Senhorinha, cheguei!
- Já?!
- Puxa! Peguei um trânsito horrível, ainda tenho que fazer alguma coisa para jantarmos, e a senhora acha que cheguei cedo?! Estou cansadíssima, mas vamos tomar um banho gostoso.
- De novo, Lucinda?! Outra vez?! Não, quero! Já tomei ontem! Estou limpinha!
- Hoje é outro dia e a senhora precisa dormir cheirosa e fresquinha.
- Não carece, minha filha. Eu nem me sujei.
- Vamos logo porque, senão, os seus filhos vão falar que eu não cuido direito da senhora.
- Êta, meu Deus! Todo dia é essa agonia!! – resmungou.
- Não sei porque a senhora fica tão inibida, comigo. Isso atrapalha o banho, sabia? Eu sei que a senhora já perdeu a vergonha há muito tempo.
- Eu?! Quem te disse?! Marido de quem eu tomei? Prova! Tomei o seu, por acaso?
A idosa ficou pensativa e depois falou baixinho:
- O dela não foi, porque é meu filho.
Assim, nessa peleja, os dias foram passando e a nora notou que a sua sogra estava diferente.
Numa noite dessas...
- Dona Senhorinha, cheguei! Ué! Que cara triste é esta? O que aconteceu?
- Sabe, minha filha? Fui uma moça virgem e sou uma viúva virgem. É difícil mostrar minhas partes íntimas para os outros. Será que todas as mulheres se casaram como eu? Você casou?
- Eu hein! Isso é coisa que se pergunte?
E a nora pensou:
- Eu me casei virgem e já falei para muita gente, mas ela vai morrer sem saber.
- Bem, minha filha... Perguntar não ofende.
- É verdade, dona Senhorinha, e por isso também vou fazer uma pergunta: como a senhora, que é tão pudica, teve nove filhos?
- Foi preciso, minha filha. Foi preciso.
- Mas, com a parteira, a senhora perdeu a vergonha, não é mesmo?
Mais uma vez ela pensou, pensou e resmungou:
- Ah, bom! Agora, entendi porque ela disse que eu já perdi a vergonha.
Dias depois, na casa de uma cliente...
- Boa tarde, Lucinda! Está boa? Como vai a sua sogra?
- Boa tarde! Eu estou bem, mas a dona Senhorinha continua do mesmo jeito. O pior é que, agora, a velha deu para jogar verde para ver se colhe maduro.
- Como assim?
- Vira e mexe ela quer saber se eu me casei virgem. Que implicância! Acho que ela está caducando! Pois, ela pode tirar o cavalinho da chuva, porque esse gostinho não vou lhe dar!
- Se ela faz tanta questão, porque não lhe contar? Tenho certeza que ela gostará de saber que você, a pessoa escolhida para cuidar dela, preservou-se e se casou intata com o filho dela.
- Ah, não! Estamos no segundo milênio e esse negócio de castidade já era!
- Nada disso. Muitas pessoas, principalmente os mais velhos, dão muita importância a esses valores. Pena que a mídia está aí, incentivando os jovens a fazer o contrário. E você, Lucinda, que tem uma filha única, como gostaria que ela se casasse?
- Virgem, é lógico! Nós a educamos, desde pequenininha, para isso! Meu sonho é vê-la entrar toda de branco na igreja, pura que nem um lírio.
- Então, que tal hoje ainda, na hora do banho, fazer uma pessoa feliz?