Capítulo 4 - Bernardo dá um "gorpe" de mestre -

O Val não procurava emprego. Fugia dele na verdade, pois um dia apareceu uma vaga de servente de pedreiro e ele disse que não ia porque estava com sono. Eu ralando como auxiliar de escritório e ele dormindo? Mas eu não ia ficar nessa vida mesmo. Resolvi procurar uma casa para alugar e morar sozinho. A sorte sorriu pra mim nesse dia. Encontrei não só a casa como ajuda para enfrentar tudo isso. A mãe de uma amiga minha se responsabilizou perante a proprietária do imóvel e eu já paguei o adiantamento. Mas detalhe, a casa era somente para uma pessoa morar, pois se tratava de dois cômodos e banheiro, mas não tinha comparação com a casa que atualmente eu vivia. Estava cansado de dividir a casa com minha tia, e outros moradores como: ratos, camundongos e gafanhotos. Mas havia um problema. Como contar a ela que eu ia morar sozinho? Foi aí que tive uma idéia: "é só dizer que vou morar com uma amiga no centro da cidade, assim ela não desconfiará" e assim foi. Ela ficou triste pois também queria vir junto, porém como permitir que ela morasse comigo se ela não tinha emprego fixo? Mas eu a consolei dizendo que pelo menos eu poderia levar meu computador embora e eu voltaria a ter meus momentos de lazer inclusive escrever peças e meu livro que acabara de completar dois anos que eu o escrevia. O nosso amigo Cláudio ficou com raiva de mim, mas passou. Eu disse que não teria outro jeito, no fim ele acabou concluindo que o motivo principal de minha saída era o Val, e o banheiro!

No outro dia fui limpar minha nova moradia, conheci minha futura vizinha e os filhos dela. Ela era separada do marido e já namorava outro rapaz. A vizinhança que ganhei foram jóias comigo, ganhei sofá, colchão de solteiro, lençóis, geladeira, mesa com três cadeiras, estante e vários utensílios de cozinha. Sabe aqueles programas que te dão uma casa imobiliada? Me senti um dos ganhadores. Só precisei comprar fogão e guarda-roupa. Quando voltei na casa de minha tia voltei a assumir o semblante sofrido e desanimado. Mas não poderia perder a chance de dar o xeque - mate.

Comprei uma cerveja bem gelada e a noite convidei o Val para beber comigo. Minha tia estava no banheiro, naquele, lembram? Servi ele e pedi para me ajudar a tomar a cerveja. E enquanto ele dava seu primeiro gole eu mentalizava "Essa é a última coisa que você bebe as minhas custas" Bebi minha parte todo feliz por dentro. Você faria o mesmo, não?

No outro dia fui terminar de arrumar minhas coisas, faltava pouco, lógico. Só que ao revirar a prateleira encontrei uma receita que me chamou a atenção. Minha tia guardou um pacote de açúcar vazio e a receita "Pudim de Cará" Mas que diabo é isso? Minha tia não é chegada a cozinhar e pior, nunca comeu cará, nem sabia o que era. Então caí na infeliz idéia de questioná-la. Ela estava lavando roupa e saí pra fora perguntando: "A senhora sabe o que é cará?" E ela "eu não, porque?" Estranhei e expliquei o motivo da pergunta e ela ficou vermelha como pimentão e explicou "Ah, minha nossa. Eu li errado. Achei que fosse pudim de Cara..." Sabem o que ela fez? Ao encontrar a receita ela leu tão rápido que colocou "LHO" depois de "Cará" e pensou: "Oba, jamais imaginei que iriam inventar um pudim disso, vou guardar, quem sabe um dia falte" Até sentei de tanto rir, doeu a barriga, deu dor de estômago. Bem que desconfiei, ela não dava ponto sem nó. Algum motivo especial tinha para ela ter guardado aquela receita a sete chaves.

Mudei com a ajuda da filha de minha nova vizinha, na volta já passei na casa de minha mãe e trouxe o computador e a mesa dele. E passei o dia ajeitando as coisas e limpando. Me indicaram colocar um saquinho de sal em cima da pia, para garantir fartura. Era o início de uma nova era, e eu já sabia que não me arrependeria disso.