Pela ótica da menininha, terceira parte: O comprimido e o carro ou tamanho e proporções

Verão... Tempo de praia, alegria, cores esfuziantes. Uma menininha está na praia com seu avô. Logo retornarão ao apartamento para um delicioso almoço e depois, quem sabe, um passeio ou uma soneca.

Sobem brincando no elevador que os levará ao décimo segundo andar. Ao entrarem são recebidos com muita alegria. O avô vai tomar banho e a meninha corre para a janela, para continuar admirando o espetáculo das cores do litoral.

Vê a praia, pessoas, carros... Acha tudo tão colorido, mas tão pequenininho...Parece que dá para pegar o Fusca vermelho com seus dedos... Intrigada caminha pela sala e encontra sobre a mesa um comprimido. Pega-o e observa seu tamanho entre seus dedos. Acha muito parecido com o tamanho do Fusca. Corre com ele para a janela, coloca-o próximo ao Fusca no seu ângulo de visão e, por um instante, tem a impressão que ambos são do mesmo tamanho. Encantada com a sua descoberta, abre seus dedos... O comprimido cai pela janela do décimo segundo andar, desaparecendo por completo de sua visão.

"O almoço está pronto..." chama uma voz familiar vinda da cozinha. A menininha caminha até a mesa e fala um pouco desapontada: "O comprimido caiu..."

Sem saber exatamente o que tinha ocorrido, sua mãe, uma senhora aflita no seu papel, logo fala: "_ Você engoliu...Meu Deus do Céu, ela engoliu o comprimido da avó, que estava em cima da mesa."

A avó tomava medicação para o controle da pressão. Segue-se um interminável interrogatório da pequena criança. "-Você engoliu?"

"-Não. Ele caiu." "_ Como caiu? Você jogou da janela?" "-Não. Eu coloquei ele perto do carro vermelho, aí ele caiu..." "_Fale a verdade, senão vamos ter que te levar para o hospital!" "_ Eu estou falando a verdade, não sei mentir! Vamos ver comigo na janela."

Todos vão até a janela e a criança explica seu ponto de vista:" Olha como o Fusca vermelho é pequenininho... É do tamanho do comprimido... Eu coloquei ele perto do carro, abri o dedo e ele caiu..."

O avô compreende logo o ocorrido. Dá crédito à menininha e acaba com a confusão. "_ Está certo, errado está quem deixou o comprimido solto... Depois do almoço vamos até o carro vermelho ver se ele fica pequeno ou aumenta de tamanho..."

Todos se acalmam e almoçam, arriscando ainda alguns comentários: "-Não jogue mais nada pela janela." Ao que a menininha responde: "_Não joguei, eu disse que ele caiu..."

Findo o almoço, avô e neta descem novamente pelo elevador e caminham pelo calçadão. Lá ela observa os carros, que agora parecem que aumentaram muito de tamanho... Já seus pais, que lhe acenam da janela do apartamento, estão pequenos...Parece que dá para pegar entre os dedos...

Como uma coisa tão pequena como um comprimido pode causar tanta confusão? De perto, o carro é infinitamente maior... E como seus pais tão argüidores, agora ficam tão pequenos na janela do décimo segundo andar? Entre o barulho das ondas e as buzinas dos carros, a menininha começou a entender que o tamanho dos fatos depende da importância que lhes damos...