Uma velha notícia

O velho homem de olhos opacos segurava, com mãos levemente trêmulas, um jornal com velhas dobras. Sentei-me ao seu lado no banco da praça, e ele me pareceu esquivar-se do meu interesse pela notícia da primeira página. Posicionei-me de maneira a não lhe oferecer mais esse risco, e ele demonstrou aprovação pelo meu gesto.

A tarde estava fresca nos soprava uma brisa no rosto. Notei as flores que já iniciavam seu desabrochar e me lembrei de que estávamos na primavera. Pensei se o homem, ao meu lado, se importava com flores, estação do ano, ou se ele notava que a brisa nos brindava com o ar fresco naquele dia.

Parecia absorto, e arrisquei uma olhadela de soslaio. Ele não estava mais lendo o jornal, seus olhos pareciam perdidos num tempo que não era o nosso. As folhas do jornal já estavam aborrecidas em suas mãos. Observei as rugas que o seu rosto escondia. Pareceu-me um sofredor. Notei suas roupas finas e bem tratadas, o relógio dourado no pulso esquerdo, uma aliança de ouro no dedo médio que indicava ser casado. Foi então que vi que o jornal trazia formatos e diagramação antigos. Fiquei curiosa. Estiquei os olhos e a data era do ano de 1975. A curiosidade aumentou. Foi quando suas mãos se deixaram cair sobre suas pernas, e o jornal escancarou-se diante de mim. A principal notícia dava conta de um acidente de automóvel que levou à morte uma mulher recém casada e grávida de quatro meses. A reportagem começava assim: “Esta madrugada um automóvel sinca chambord com placas de São Paulo, colidiu-se com um caminhão parado no acostamento da Via Dutra. Dos dois tripulantes do automóvel, a mulher de 28 anos, recém casada e grávida de quatro meses, perdeu a vida sendo lançada pela janela do Sinca”. O motorista teria adormecido na direção sugere a notícia. Mais abaixo uma foto desfocada mostra o outro passageiro, um homem com traços desesperados sendo atendido pelos paramédicos. Meu coração apertou-se dentro de mim. Se pudesse teria dito ao meu companheiro de banco de praça o quanto sentia por tudo aquilo. Mas, certamente, não seria nada em relação a sua dor, já que tinha sido ele o motorista incauto...

ANA MARIA MARUGGI
Enviado por ANA MARIA MARUGGI em 07/06/2008
Código do texto: T1023204
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