A SAGA DO BEIJO ETERNO

Um dia se deu pela primeira vez, o mais singelo dos beijos.

Timidamente saira das contidas mansões da inocência e finalmente conhecera o gosto dos primeiros lábios amados. Mas eram dias de imaturidade e recolhido às suas instáveis impotências, o beijo feneceu.

Até que um novo estágio da paixão, lhe permitiu tornar-se fênix, a ponto de lhe serem reabertas as cortinas do redescobrimento pessoal. Então passeou por novos lábios, tão fascinado como o foram os astronautas a vagar pelo sólo lunar. Mas, tal como aqueles, que tiverem de retroceder às órbitas de seu mundo, da mesma forma despertou-se de sua momentânea embriaguez, retroagindo aos universos do seu próprio recolhimento.

Os dias roubaram a plenitude inocente daquele beijo, e qual um predador alado, ele rasgou os ares desvairados do prazer. E foram tantos os lábios, que nem lhe foi possível discernir o valor ou desvalor de seu agir. Reinando nas alturas da libido, suas garras tangeram as cordas do delírio, e nas tantas bocas por onde voou, ouviu diversas sinfonias de descompromissada loucura. Deleitou-se, pois, rendido aos afazeres de se novo mundo sem fronteiras, e foi tão longe, que qual Ìcaro da desilusão, perdeu as asas sob o intenso sol de seu vazio interior, precipitando-se abismo abaixo, de sua própria solidão.

Então disse a si mesmo o beijo: "jamais permitirei me dar!"

Mas quem supõe haver no lindo arco-íris, o adeus definitivo de toda tempestade, há de afundar nos mares da surpresa, todo o descaso de sua presunção. Assim, equivocou-se o beijo, pois à revelia de seus próprios desenganos, viu-se a fazer com que sorrissem outros lábios sofridos.

E permitiu-se então beijar aqueles lábios, que desde então passaram a sorrir, e a venerar o doce sabor dessa expressão, que do profundo fosso desafortunado, resgatou um precioso e necessitado olhar.

O beijo inicialmente infantil, posteriormente curioso e progressivamente sedutor, agora era ponte de salvação. Numa das extremidades, a liberdade solitária de a nada obrigar-se, mas que nenhuma alegria também lhe prometia. Do outro lado, o clamor desesperado de quem provaria a própria morte, se lhe negasse o calor.

Assim, abdicou o beijo de ser apenas seu, para morar num coração que para si o elegeu!

Mas quem supôs ser essa a felicidade daquele peregrino beijo, engana-se uma vez mais. Ético e doador de felicidade, mal conseguia disfarçar, que se achava profundamente infeliz.

Até que nas asas coloridas de um platonismo fortuito, surgiu um outro beijo, feminino e encantador, que outrora vagava pelo reino dos sonhos impossíveis. Inesperadamente, quando alinhados, enamoram-se ambos e uma forte coalizão sentimental ali sedimentou-se.

Após o compartilhamento de suas trajetórias, confessaram as algemas que lhes prendiam a prévios laços, mas também puderam ler nas linhas do destino, umas trova apaixonada a evocar a eternidade de seu enlace.

Ciente de sua nova realidade, interpretou-se apaixonado, o confuso beijo.

Igualmente descobriu que não nasceu um dia e que jamais morrerá; que era parte constante do amor que vagueia imerecido; que se reencontrou nas partículas de uma nova, real e sublime emoção, e que nos lábios de sua amada será sentido, mesmo além de um agora insignificante detalhe, chamado de fim!!

Reinaldo Ribeiro
Enviado por Reinaldo Ribeiro em 14/05/2008
Reeditado em 21/07/2008
Código do texto: T989292
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