Seria possível amar assim?

Seria possível amar assim?

_ Não acredito Érika que você vai mesmo preencher esta ficha! – ri Anna.

_ Eu não! Você vai! – fala a amiga passando-lhe a folha.

_ Eu? Por quê? – diz olhando para a folha em suas mãos sem entender ainda.

_ Ué, você diz que não quer mais saber do amor... Não quer amar ninguém, que o amor não existe e ainda por cima está desempregada e cheia de dívidas... E tudo por causa...

_ Eu sei amiga! – diz cortando a outra – Mas, preencher esta ficha não seria a solução dos meus problemas... E ainda mais sendo uma ficha para um anúncio maluco de se procura uma noiva a qualquer custo! – diz rindo – Você acha que é possível isso? Seria possível amar assim?

_ Sei lá! Mas tudo é válido! – ri a amiga – E ainda por cima o cara é milionário! – pausa – Foge de minha capacidade de pensar... Mas, no mínimo deve ser muito divertido! – ri ela muito preocupada em como realmente regularizar sua situação.

_ Vamos amiga, preencha, ao menos nos divertiremos!

_ Ok, vamos nos divertir! – diz Anna pegando uma caneta e começando a ler as questões: Nome completo: Anna Siqueira; Data de Nascimento: 26/04/1978; Filiação: caso queira saber realmente, basta me procurar...

_ Anna!! – ri a amiga.

_ Você ainda não viu nada! – e continua – Endereço: lhe dou o número do meu telefone, caso queira me achar, não terá tantas dificuldades (064 30415062); Alguma doença: descrença na humanidade e principalmente em vocês, homens.

As risadas ecoam no aconchegante apartamento herdado após a morte da madrinha de Anna.

_ Continua Anna! – fala Érika enxugando os olhos.

_ Certo! Preferências pessoais: para saber, terá que me conhecer melhor e quem sabe, permitirei que faça parte de minhas preferências?

_ Boa! O que mais?

_ Grau de escolaridade: formada com louvor em Letras e Pedagogia; cursando mestrado; Virgem: bem, depende do que entende por virgindade e se quer mesmo saber, bem, terá que tirar a prova!

_ Anna, você é doída?

_ Que nada! Ele nem chegará a ler minha ficha!

_ E se ler?

_ Com a sorte que tenho e com a foto que mandarei... Nem mesmo abrirá! – diz caindo na gargalhada só de pensar em como mandaria a tal foto.

Semanas depois...

_ Não acredito Luca que vai escolher sua noiva dessa maneira! – replica o amigo se referindo às propostas preenchidas – Quantas são?

_ Bem, pedi pra Cleuba escolher apenas aquelas que morassem aqui ou na cidade vizinha, que tivessem entre 24 a 33 anos... Isso reduziu um pouco o número de fichas.

_ E quantas restaram?

_ Fácil! – diz ele desanimado – 50 candidatas!!!! – e passando a mão pelos cabelos solta uma gargalhada.

_ Meu Deus, não poderia ter sido pelos meios normais? Afinal, você tem tantas namoradas!

_ Tenho não! Tive! – e olhando para as fichas responde – Essa idéia é claro, foi de Cleuba! Que acha que não tenho nada o que fazer e nem com que me preocupar!

_ Boa sorte amigo! – fala o outro começando a se levantar.

_ Aonde pensa que vai?

_ Embora, deixar você mais à vontade com suas candidatas!

_ Nada disso! – diz fazendo um gesto para que o outro sentasse – Você irá me ajudar e mãos à obra!

E assim começam. Haviam separado dentre as 50, umas 10 candidatas, quando ele vê uma ficha isolada das demais.

_ Cleuba? – interfona ele.

_ Pois não Luca?

_ Por que há uma ficha separada das demais?

_ Ah, é da menina Anna!

_ Anna? Quem é Anna? Você a conhece?

A secretaria entra na sala. Era uma senhora de seus 50 anos, que estava com ele desde a época do pai. E segurando uma risada, ela fala:

_ Não meu menino! É que gostei dela!

Curioso Luca abre a pasta. Enquanto lia, não sabia se ria ou se esbravejava... E a foto?

_ Ela teve a petulância de tirar uma foto de chapéu que lhe esconda o rosto? Olhe o tamanho dos óculos escuro?! Olhe este sobretudo!? É duas vezes o tamanho dela, arrasta no chão!

Renam, o amigo, pega a foto e solta uma gargalhada.

_ Deixe-me ler a ficha! – pede ele enxugando os olhos.

Ele ria tanto que não conseguia mais se controlar.

_ Agora sei porque Cleuba separou essa!

_ Entendeu menino Renam? – pergunta ela sorrindo.

_ Sim, ela é certinha para esse cabeça de vento! – e ri mais ainda.

_ Isso, riam de mim vocês dois! Eu não posso nem saber a cor dos olhos dela!

_ Olhe meu amigo, se eu fosse você, não perderia mais tempo com as outras, iria ver está aqui! Pois, aqui está a sua prometida!

_ Concordo com você menino Renam! – diz Cleuba escondendo outro sorriso e saindo da sala sendo seguida por Renam.

Sozinho, Luca, lê mais uma vez as respostas e sem entender bem o por quê, sente o coração acelerar. Fecha então a pasta da misteriosa Anna e joga as outras na lixeira.

E o mês voa...

_ Anna, você sabe que não dá mais para esperar e nem segurar essa situação! – diz alguém do outro lado da linha.

_ Eu sei Kelma! Mas, por favor, me dê ao menos um mês!

Do outro lado da linha o silêncio...

_ Certo amiga! Sabe que não sou eu! Mas também, não posso me opor tanto ao meu marido! Ele, não entende que o...

Nesse momento a campainha do apartamento de Anna toca.

_ Vá querida! Quem sabe não é a solução que você tanto precisa!? – e desliga o telefone, deixando a moça enxugando uma lágrima de puro desespero.

_ Pois na...

Os olhos se prendem e o tempo para, até que ela recobra o controle e fala:

_ Pois não?

_ Anna Siqueira? – pergunta Luca enxugando-lhe uma lágrima que teima em escorrer de seus olhos, tocando-lhe a face pálida.

_ Quem gostaria de saber? – pergunta com a voz um tanto quanto tremula e o corpo reagindo ao toque do desconhecido.

_ Agora sei como é você! – sussurra ele olhando-a de cima a baixo.

_ Como assim?

_ Posso entrar?

_ Não, pois não sei quem é você!

_ Perdoe-me, sou o representante do senhor Monterrei.

_ Quem? – diz ela confusa sem lembrar de quem se tratava.

_ A ficha de proposta de casamento. – diz ele um pouco ofendido por ela não saber quem era ele.

_ Ah ta! Por favor, entre!

Após encostar a por atrás de si, ela se vira e o vê avaliando o apartamento.

_ Sei que não é tão belo quanto o do seu patrão! Mas, é meu lar! – e baixinho acrescenta para si mesma – Ao menos por enquanto. – e uma lágrima volta a cair.

_ O que houve? – pergunta Luca, que não pretendia dizer quem ele era na verdade.

_ Oh nada! Sente-se, por favor!

Após de ver-se instalado confortavelmente no sofá macio, ele volta a estudá-la.

O short deixava ver-lhe as pernas bem torneadas, a camiseta justa, moldurava-lhe a cintura delgada e os seios firmes. Os lindo cabelos negros e sedosos tentavam esconder a dor que se podia ler naqueles negros olhos.

_ Conte o que veio fazer aqui senhor...?!

_ Luca, sou Luca!

_ Bem, Luca, o que veio fazer aqui?

_ Você foi selecionada para ser a mi... Digo, a noiva de Monterrei!

_ Eu? Como pode isso?

_ Simples e... Ele se encantou por sua foto! – diz ele tentando se manter sério.

Anna olha para ele apalermada e começa a rir, como não fazia há um bom tempo.

_ Minha foto? Sei viu Luca! Agora, na real, me conte o que veio fazer aqui?

_ Já lhe disse!

_ Mas, isso é real?

_ Claro que sim! O casamento será realizado daqui a um mês e vocês só se verão no dia do mesmo.

_ Caso eu aceite não é mesmo?

Anna se levanta e o gesto brusco a faz perder os sentidos. Fazia dias, que devido à preocupação excessiva e a falta de dinheiro que não se alimentava direito.

Luca, preocupado, a coloca em sua cama e chama seu amigo e médico particular, Renam.

_ O que há com ela Renam? – pergunta ele após o amigo examinar a moça.

_ Só pelo que observei aqui, ela está fraca... Me faça um favor, vá até a cozinha e veja se algo indica sua alimentação ao menos nas últimas horas.

Quando Luca encontra a cozinha, que estava impecavelmente limpa, descobre que a geladeira e os armários se encontravam vazios, salvo a fruteira, que continha apenas uma maçã e uma banana.

Nesse momento o telefone toca e a secretária eletrônica atende.

_ Anna, você tem que me atender, onde está você? – diz a voz de um rapaz.

Outro recado ecoa...

_ Senhorita Siqueira, seu nome estará sendo devidamente encaminhado ao órgão competente...

Então nesse momento tudo fica escuro. Ele sai a procura do que ocorrera. Quando vê que só o apartamento dela estava escuro, ele vai até o responsável pela manutenção do edifício.

_ O que está havendo com a luz?

_ Nada por que senhor?

_ Não há luz no apartamento de Anna Siqueira...

_ Ah, então finalmente cortaram a energia. – fala o rapaz em tom de consternação – Tentei retardar o máximo possível. Mas, ela tem muitas contas atrasadas.

_ Tem idéia de quanto é o saldo dela no condomínio?

_ Tenho sim! O senhor quer para agora?

_ Se for possível sim!

Após receber e pagar as contas, ele liga para Cleuba.

_ Minha linda, peço que pague as faturas das contas atrasadas que vou lhe mandar por Renam e entre elas, dizem respeito a contas de luz. E peça que religuem imediatamente!

_ Certo meu menino! Isso diz respeito a sua Anna?

_ Sim e acho que ela está sem comer há um bom tempo! E sua situação financeira não é nada agradável!

_ Você vai ajudá-la?

_ Claro! Até segunda ordem, ela já é minha noiva! – ri ele – Ela ainda não me disse não!

_ E você lhe contou quem é?

_ Não! Achei melhor não fazê-lo!

_ Não creio que seja uma boa idéia!

_ Como faço para alimentá-la? – desconversa ele.

_ Faça aquela canja que sempre lhe faço quando está doente.

_ Ok! Vou ao mercado enquanto Renam cuida dela. Tchau!

Horas depois, um cheiro delicioso invade o apartamento de Anna.

_ O que fará agora meu amigo?

Sem responder, Luca vai até um cesto que ficava em cima da mesinha e vê as contas em atraso.

_ Faça-me um favor?

_ Diga!

_ Leve até Cleuba e peça que mande o boy pagar tudo.

_ E se ela não aceitar? O que você fará?

_ Nada, apenas terei feito minha boa ação!

_ Bem, decisão sua amigo e eu estarei ao seu lado!

_ Obrigado!

Depois que o outro vai embora, com um castiçal de vela na mão, ele vai até o quarto de Anna.

Ele a observa dormindo e como chegara de uma longa viagem e não descansara ainda, além do fato de não ter luz, ele deita-se por sobre a coberta que a cobria, tirando os sapatos e a camisa, caindo logo em seguida em um sono profundo.

A tarde ia avançada, quando Anna, finalmente acorda e sente que havia algo diferente. Então percebe que estava sendo abraçada pelo homem mais lindo que já vira na vida.

Os cabelos lisos da cor de mel, caiam em desalinho pelo rosto, a barba bem-feita e da cor do cabelo, a convidava para tocá-la; o peito dourado e forte, a amparava, causando-lhe uma sensação de segurança e algo mais. E sem poder se conter, ela acaricia-lhe a barba.

_ Como é macia! – sussurra ela.

Luca acorda e sem que ela percebesse, deixa que ela satisfaça a curiosidade.

_ Você quer me deixar louco? – pergunta ele de olhos fechados ao sentir às mãos dela em seu peito.

_ Desculpe-me! Mas, você está em minha cama! – sussurra ela tentando fazer gracejo.

_ Anna, Anna! – ele então não resiste e a beija.

O beijo é suave e vai se intensificando e só é quebrado pelo toque do celular dele.

Afastando-se relutante, ele se senta e atende.

_ Pronto Cleuba.

_ Tudo pago meu menino!

_ Obrigado querida!

_ De nada! A luz já deve estar normalizada e cuide dela!

Só então ele percebe uma luz que vinha do corredor.

_ Pode deixar! Farei isso com todo prazer!

Desligando o celular, ele a pega no colo e a leva sob protestos até a sala de jantar.

_ Luca! Eu posso andar!

_ Silêncio mulher! – diz ele rindo.

Então ele a beija...

_ Luca, vou me casar com o senhor Monterrei! – sussurra ela afastando o rosto.

Ele respira fundo e a coloca sentada na cadeira.

_ vou buscar sua canja!

_ Canja? Mas...

_ Seu noivo providenciou tudo!

Anna o observa se afastar e sente uma louca vontade de voltar aos seus braços.

_ Meu noivo!? – sussurra ela – É tão estranho! Nunca ouvi nem falar dele! E agora é meu noivo! Será que vou conseguir levar isso adiante? – pergunta a si mesma – Se for verdade, não posso desistir, não posso mesmo!

_ Desistir? – pergunta Luca que ouvira a última parte.

_ Sim! Isso tudo é uma loucura!

_ Por quê?

_ Por todos os motivos! Não conheço meu suposto noivo, beijei você que também não conheço e nem sei o que fazer da vida! – e as lágrimas rolam por sua face.

Luca a abraça e deixa que desabafe. Quando a percebe mais calma, coloca o prato a sua frente e começa a dar-lhe pequenas colheradas da canja.

_ Você quer desistir?

_ Se isso for mesmo uma realidade, não posso! Não é só por mim! Não posso pensar só em mim!

_ Em quem estaria pensando? Em seus pais?

_ Não, meus pais já são falecidos desde os meus 15 anos, não tenho irmãos e nem minha família mora por aqui.

_ Então em quem tem que pensar?

_ Em meu...

Nesse momento o celular dela toca.

_ Oi amor que saudades! Também te amo! Vou vê-lo logo! Não esqueça de mim!

Anna desliga o celular e fica com os olhos fixos em algum ponto no chão.

_ Quem era? – pergunta Luca enciumado.

_ Um aluno que sempre me liga!

_ Já deu aula?

_ Sim, particular.

Ele não fica muito convencido e os ciúmes tenta dominá-lo.

_ Hoje vamos para o hotel e daqui a dois dias, depois que resolvermos todas as papeladas, estaremos voando para a estância em Mato Grosso, onde nos casa... Isto é, onde será realizado o casamento! – e de maneira brusca completa – Não sei se o Monterrei irá apreciar seu amante.

_ Amante? Quem você pensa que é para vir falar de amante? Pois se eu quisesse teríamos feito amor! E você contaria ao seu patrão?

_ Coma sua canja Anna! Amanhã venho buscá-la... Hoje você tem que se recuperar e arrumar suas coisas!

Minutos depois ela ouve a porta da frente sendo batida com estrondo.

_ Quem ele pensa que é?

Terminando a canja, arruma a cozinha e vê que as contas em pendência haviam sumido.

_ Agora, como posso desistir?

Então decide tomar um banho e vai assistir televisão.

A noite chega sem que ela se desse conta. Adormecida no sofá, não vê nem quando a porta do apartamento é aberta e Luca entra, parando a sua frente.

_ Isso está se tornando um hábito! – diz ele levando-a para a cama – E eu estou adorando! – diz ele deitando-se ao seu lado.

Anna em seu sono aconchega-se ao calor morno e lentamente vai abrindo os olhos. Então o vê.

_ Isto está se tornando um hábito adorável! – suspira ela e volta a adormecer.

Quando acorda no dia seguinte com o cheirinho delicioso de café fresco, percebe que não fora apenas um sonho.

De repente, o celular toca e ela atende ansiosa.

_ Oi meu querido! O que houve? Também estou morrendo de saudades e não agüentando mais ficar longe de você! – pausa – Olha, já sei o que farei e arranjei um jeito de ficarmos juntos para sempre. Vou ter dinheiro suficiente para ter você perto de mim de novo. Aí, ninguém nos separará!

Luca que lhe trazia o café da manhã para ser servido na cama sente como se tivesse sido apunhalado pelas costas. Ele entra no quarto, e ela assustada, desliga o celular sem nem mesmo se despedir.

_ Lamento lhe informar, mas não haverá casamento algum! Você não viverá as custas do dinheiro alheio para sustentar quem quer que seja ao celular!

_ Mas Luca, eu posso explicar... Não é meu...

Então ele a beija com fúria. E os sentimentos intensos se misturam no beijo. Ambos se entregam sem reservas e vão ao mundo só deles.

Muito mais tarde, vendo-a dormir, após horas de entrega e paixão, ele se levanta e vai embora.

Anna acorda se sentindo realizada e sabendo que não poderia casar com Monterrei. Então procura seu amado ao seu lado e vê a cama vazia e já gelada.

Levantando-se, vai procurando pelo apartamento e só encontra um envelope pardo em cima da mesa.

Ela retira o bilhete e lê:

“Anna,

Não se preocupe com as contas pagas, faça de conta que nunca existiram! Deixo-lhe esta quantia para possa se arranjar até conseguir um emprego. E que você seja muito feliz junto ao seu amante!

Luca.”

Anna retira as notas do envelope e se assusta com a quantia alta. E começa a chorar.

_ Um dia Luca, vou lhe devolver tudo e você nem imagina que agindo assim, me fez um bem maior que o casamento com o Montirrei.

Dois meses depois...

_ Luca, um boy entregou este envelope para você! – diz Cleuba.

Ele pega o envelope e recostando-se em sua cadeira confortável, fica a olhar o nome do remetente.

_ Abra menino!

Ele abre e retira o bilhete:

“Luca,

Você nunca saberá o bem que me fez em não me permitir casar com seu patrão, ainda mais quando eu amava outro.

Obrigada por sua ajuda! Aqui vai um pouco do que lhe devo, porém, nunca esquecerei o que fez por nós! Só lamento o que não aconteceu e do que foi dito!

De tudo ficam vestígios!

Ah, em breve, mando-lhe o restante!

Sua

Ana.”

_ Ela ama outro e ainda me diz que é minha?

_ E se esse outro for você? Afinal, ela não sabia quem realmente era você! Por que não vai até ela?

_ Não estou pronto Cleuba!

Meses depois, após o mesmo sonho repetidas vezes, no qual a tinha em seus braços, Luca decide procurar sua amada.

Quando chega ao edifício, encontra o rapaz com quem falara antes.

_ Vim ver a senhorita Anna.

_ Ah, o senhor não sabe?

_ O quê?

_ Ela vendeu o apartamento a uns 4 meses e foi embora.

_ E você sabe para onde?

_ Não sei não! Mas, de repente, o novo proprietário, deva saber.

Minutos depois, estava sentado em um sofá desconfortável, no apartamento em que outrora, fora aconchegante e se fazia sombrio demais.

_ Sr Brandão, sabe me dizer por acaso o novo endereço de Anna?

_ Ih moço, não sei não! O tempo todo eu tratei com rapaz.

_ O corretor de imóveis?

_ Não! Ela vendeu particular mesmo! Era um rapaz chamado David!

_ Deve ser o... – pausa – Bem, de qualquer forma muito obrigado!

Já à porta do carro, Plínio, o administrador do condomínio, fala:

_ Qualquer coisa mando avisá-lo!

_ Não precisa não, obrigado!

Ele pára o carro à margem da auto-estrada e fica a admirar o pôr-do-sol.

_ Por que Anna? Em menos de um ano e das 24 horas que passamos juntos, você fez um estrago em meu coração e agora, não sei de você!

Dois anos se passaram...

_ Érika, tem certeza de que está tudo pronto?

_ Claro Anna! David está cuidando de tudo e os funcionários estão a postos!

Anna dá uma olhada na livraria ambiente, que ela e Érika em sociedade conseguiram abrir, num dos melhores shopping da cidade, e hoje, na inauguração, nada mais justo do que se sentir nervosa.

Havia a pracinha de alimentação no primeiro andar e também o cantinho dos pequenos leitores, onde dois funcionários contadores de história ficavam sempre preparados para contarem histórias ou simplesmente auxiliarem. Na parte superior da livraria, a venda de livros e cabines confortáveis para quem quisesse ler e outras para que pudessem navegar na Internet. Tudo com total confiança e conforto.

Trabalharam muito e finalmente viam os resultados!

_ Onde estão Kernai e Anna Cecília? – pergunta para a amiga.

_ David está dando uma volta com eles!

_ E vocês dois, quando vão casar afinal?

_ Ah amiga, você sabe que foi difícil esta empreitada, mas, se tudo der certo para nós três aqui, no final do ano que vem estaremos marcando. – pausa – E você, esqueceu do Luca?

- Esquecer do Luca? Como? – ri ela localizando os filhos com o olhar – Mas, estou em paz e feliz. Não precisei casar sem amor e estou refazendo minha vida com meus filhos graças a vocês e também, até mesmo sem querer, ao Luca!

_ Já quitou sua dívida com ele?

_ Sim, esta manhã, ele deve ter recebido a última parcela do que lhe devia. – Será que se casou? E o tal senhor Monterrei, conseguiu sua noiva afinal?

_ Anna, Érika... – chama David – Está na hora!

Jordana, a gerente da livraria se aproxima e as conduz ao local indicado.

Horas depois, estava conversando com um convidado, quando este comentou:

_ Ah, o senhor Monterrei, o dono deste shopping já chegou?

_ Monterrei é dono daqui? – pergunta ela sentindo um calafrio.

_ Isso mesmo! Ele sempre comparece as inaugurações... Por falar nele, olhe ele lá!

Anna se vira e não consegue visualizá-lo, pois estava cercado de gente. Vendo David se aproximar com os filhos, ela se esquece do outro.

_ Oh David, muito obrigada! Eles aprontaram muito?

_ Não minha linda! Eles são uns amores e por acaso os amo demais!

_ Mima não é mesmo senhor padrinho? – diz ela.

_ Mamãe? – chama o garotinho de 7 anos de idade e a cara da mãe.

_ Oi amor!

_ Sabia que Anna Cecília derrubou toda a pipoca na mesa?

_ É mesmo sapequinha? – Anna abraça a filha de dois anos e que por sinal, era a cara do pai.

Nesse momento Luca a vê naquela cena familiar, quando estava para se virar e ir embora, vê uma linda jovem negra se aproximar e beijar o rapaz com paixão e afastá-lo de lá.

Um suspiro de alívio faz com que Cleuba se vire e fale:

_ Aquela não é a Anna?

_ É sim!

_ Está linda!

_ Muito mais linda do que me lembrava! – diz ele suspirando com o coração batendo acelerado.

_ Quem são as crianças que estão com ela?

Nesse momento kernai fala:

_ Mamãe, vamos tomar refrigerante?

_ Claro amor! – concorda ela pegando Anna Cecília no colo.

Com esse movimento, eles vêem o rosto da menina.

_ Luca, ela se parece demais com você! – espanta-se Cleuba.

_ Será que...

Anna então sorrindo se vira para ir até a praça de alimentação com os filhos e o vê...

_ Luca!! – sussurra.

Então a dona de uma das mais elegantes lojas se aproxima dele.

_ Olá Monterrei! – diz insinuante – Há quanto tempo que você não aparece!

Ele nem repara nela, pois seu olhar, estava fixo em Anna e ela diz em um sussurro para si mesma:

_ Você é Monterrei!

Enquanto a mulher o cercava, ela corre com os filhos para o escritório, pega a bolsa e as chaves do carro para ir embora.

_ Érika, já vou indo! Não posso explicar agora.

_ Certo, amiga! Eu e David cuidaremos de tudo por aqui, depois você me liga!

Na garagem do shopping minutos depois, ela arrumava Anna Cecília na cadeirinha, quando ouve a voz que não lhe abandonava seus sonhos...

_ Aonde vai Anna?

_ Vou levar meus filhos para casa! – diz fingindo uma calma que estava longe de sentir e terminando de arrumar a cadeirinha de Anna.

_ Oi companheiro! – cumprimenta ele ao menino.

_ Oi! Você é amigo da mamãe?

_ Sim! Sou Luca Monterrei.

_ Ué, parece com o nome do...

_ Adeus Luca! – diz ela cortando o filho.

Sentada ao volante, ela coloca o cinto de segurança e liga o carro.

_ Que tal um lanche bem gostoso companheiro? – pergunta ele assentando-se no banco do passageiro e colocando também o cinto de segurança.

_ Oba! E meu nome é Kernai e o da minha irmãzinha é Anna Cecília.

_ Que prazer conhecê-los! – diz afagando o rostinho da menina – Sua irmã é linda!

_ Quer fazer o favor de sair do meu carro senhor Monterrei? – fala ela entre dentes.

_ Não, vamos para sua casa! Temos muito que conversar!

Ela sabia que não poderia mais adiar essa conversa de dois anos de atraso, e como, nunca fora covarde... Coloca então o carro em movimento.

A casa de Anna era pequena, muito aconchegante, elegante e confortável.

Quando estaciona na garagem, Luca sai primeiro do carro, tira o menino e pega a filha quase adormecida em seus braços.

_ Ela é minha cara não é mesmo Anna?

_ É, nunca vi uma criança parecer tanto com o pai assim!

_ Você me esqueceu? – pergunta ele olhando-a nos olhos.

Anna ri e abre a porta da casa.

_ Vamos meu anjinho! – diz ela segurando na mão do filho mais velho e deixando que Luca entre – Como esquecer você? Olhe para ela... – pausa – Vou trocá-los, quer vir?

_ Claro, já perdi tempo demais longe dela.

No quarto das crianças, enquanto Anna cuidava da filha, ele cuidava do menino, ao qual gratuitamente sentia um carinho enorme.

_ E agora? – pergunta ao menino.

_ Um lanchinho! Você prometeu lembra? – ri o menino no colo dele.

_ É mesmo companheiro! Vamos falar com nossas moças! – pausa – E o que você quer?

_ Que tal uma deliciosa pizza?

_ Seu desejo uma ordem! Vamos avisar sua mãe. – entrando no quarto de Anna – Estou indo com Kernai compra uma pizza, vou usar seu carro ok?

_ Certo! – diz ela olhando-o nos olhos.

_ Eu volto para você! – sussurra ele tocando seus lábios com a ponta dos dedos.

Já no carro com o menino...

_ Onde está seu pai Kernai?

_ Mamãe diz que meu pai era um homem muito doente, que ele teve que ficar em um lugar bem longe da gente para não nos fazer mal algum.

_ E ele já fez mal a você?

_ Não! Ele fazia muito mal a mamãe e depois que eu nasci, ela diz que fui à única alegria de sua vida. E agora somos eu e Anninha!

_ Onde você morava?

_ Ah, eu ficava escondido na casa da tia Kelma, em Goiânia. Meu pai queria me tomar de minha mãe e por isso ela ficava longe de mim! Só que eu falava com ela todo dia, ela me deu um celular só para falar comigo na hora que quiséssemos!

_ Que bom que vocês estão juntos agora!

_ Eu também acho! E ela disse, que estamos assim, graças a um anjo que entrou em sua vida! Mas, só tem uma coisa que ainda me deixa triste! – diz o menino numa voz de quem entendia da vida.

_ O que meu companheiro?

_ Só falta mamãe parar de chorar!

_ Parar de chorar? E por que ela chora?

_ Tem vez que ela está dormindo e acorda chamando um nome parecido com o seu e começa a chorar! Ela acha que não vejo, mas, vejo tudo!

Luca sorrir, pega o menino no colo e entra na pizzaria.

_ Eu vou ajudar companheiro, isto é, se você deixar que eu ajudo! Posso?

_ Claro que sim!

Uma hora e meia depois, Anna já dera a sopa da filha e esta já estava adormecida. Luca chega com o menino adormecido nos braços e a pizza em uma das mãos.

_ Dormiu no caminho! Só que lá, ele comeu um bela panqueca de banana com creme de morango e copo de suco de laranja, enquanto esperávamos a pizza ficar pronta.

_ Obrigada, senhor Monterrei! – ironiza ela – Vou colocá-lo na cama e já volto.

_ Nada disso! Eu cuido dele e você arruma a mesa para nós dois. E ainda vou dar um beijo em minha filha. – diz saindo – Ah, trouxe uma garrafa de vinho tinto.

Dando de ombros, Anna faz exatamente o que ele disse. Pega as chaves do carro, para poder pegar o vinho e depois vai arrumar a mesa na sala de jantar.

Estava com os pensamentos longe, quando solta um gritinho ao se sentir abraçada e beijada com paixão.

_ Quero você Anna! – diz ele colocando-a sobre a pia.

_ Não Luca, não agora! – diz ela se afastando e sendo ajuda por ele a descer – Temos que conversar!

_ Você está certa! – suspira ele se afastando e sentando-se à mesa.

Depois de sentarem-se e de se servirem, Luca começa:

_ Não disse quem eu era, pois queria conhecê-la melhor! E assim que a vi, me apaixonei!

_ E por que procurar uma noiva daquela maneira?

_ Coisas de Cleuba! Você tem que conhecê-la! Aliás, ela quem me deu sua ficha e disse que você era a noiva ideal para mim!

_ Me conte tudo de sua vida!

_ Bem, eu conheci o pai de Kernai desde a minha meninice! Começamos a namorar quando eu estava com dezoito anos. Porém, não tínhamos tido uma relação íntima. Meus pais faleceram e eu me vi sozinha no mundo. Eu tinha vinte e um anos; fiquei ainda mais dependente de Marcos. Uma noite, porém, ele bebeu além da conta e me violentou! – pausa – Como estava embriagado e eu dependia dele, deixei passar e nos casamos um mês depois. Uma semana após nosso casamento, ele chegou do mesmo modo em casa e veio me procurar... Eu disse não! – ela para, parecendo reviver toda dor daquela noite – Érika me encontrou no outro dia inconsciente e ensangüentada. Ele me violentou e bateu tanto, que fiquei desacordada por horas a fio. Ela chamou a ambulância e fiquei internada por dois meses e em coma. Ele fugiu. Quando voltei do coma, um mês depois, soube que um milagre havia acontecido... Eu estava grávida e o bebê estava se desenvolvendo. Isso me deu forças para prosseguir.

_ E o cretino?

_ Ninguém o achou! Vim morar com minha madrinha, que cuidou de mim e de meu filho. Formei-me e comecei a trabalhar. Minha madrinha faleceu e eu herdei aquele apartamento.

Ela se encolhe, Luca se levanta e se aproxima dela pegando-a no colo e levando para o quarto. Lá tira a roupa dela, veste-lhe a camisola, arruma a cama, tira a própria roupa, ficando apenas de cueca e deita-se ao seu lado, aconchegando-a em seus braços.

_ Agora pode continuar!

_ Ele me achou! Tive que esconder Kernai em Goiânia, pois queria tomar meu filho de mim! O denunciei e nada fizeram! Até que um dia, ele foi ao meu serviço e destruiu toda a loja em que eu trabalhava. – pausa – Aí ele foi preso, fui despedida e ainda tive que arcar com todas as despesas dos estragos. Todas as economias que eu tinha, e era uma boa quantia, tive que me desfazer só para isso. Fui à ruína! E para piorar, o marido de Kelma, não queria mais meu filho na casa deles. Aí, apareceu você!

_ E eu estraguei tudo! – sussurra ele beijando-lhe o pescoço.

_ Não! Aí eu deixei de sentir pena de mim mesma e fui à luta! Com meu filho ao meu lado e o fruto de meu amor em meu ventre, fiquei mais forte e destemida!

_ E o pai de Kernai?

_ Dois meses que você me deixou, o advogado de Marcos me liga e informa que ele morrera e que os bens que ele tinha, passaria para mim, pois ele não havia reconhecido Kernai como filho e eu ainda continuava casada com ele! Vendi tudo e até o apartamento. Eu, Érika e David, queríamos a muito, montar essa livraria e percebemos que essa era a oportunidade certa e assim fizemos. Dei a maior parte, comprei esta casa financiada com um sinal de entrada, aliás, o dinheiro que você me deixou...

_ E o qual já me pagou não é mesmo? – diz ele começando acariciar seus lábios com os dele próprio.

_ Isso! – sussurra ela.

_ Quando me contaria de Anna Cecília?

_ Não sei!

Em silêncio, ele tira a camisola e começa a beijar cada pedacinho daquele corpo que ele amava e que sentia tanta saudade.

_ Amo você demais Anna! Fui atrás de você e não a encontrei mais. Achei que estava com o suposto amante e desisti de procurá-la, minha única esperança, era o pagamento que disse que me enviaria.

_ Ah meu doce amor! Será que é mesmo possível amar assim?

_ Quer ver como é sim? – sorri ele matreiro.

E o restante fica esquecido nas horas que passam um nos braços do outro.

Seis meses depois, os noivos saem da igreja sob uma chuva de arroz.

Na limusine...

_ Você acha que eles ficarão bem?

_ Sob os cuidados de Cleuba? – ri ele – É perigoso nem quererem voltar mais para nós!

_ Já disse que te amo senhor Monterrei?

_ Não senhora Monterrei, ainda não! Que tal me dizer agora? – diz sentando-a no colo.

_ Amei você por ter dado seu nome a Kernai!

_ Nunca mais diga isso! Ele é meu filho e nada e ninguém dirá ao contrário!

_ E ele o amo como tal! Você é muito mais que sonhava!

Vinte e cinco anos depois...

_ Gostaria muito de agradecer ao homem mais importante de minha vida, meu ai, Luca Monterrei, que junto com minha não menos amada mãe, me ajudaram a trilhar o meu caminho! – fala Kernai em seu discurso de formatura, no curso de Ciência da Computação – Ah, e não posso esquecer de minhas irmãs lindas e tão amadas, Anna Cecília e Luciana.

E os vários amigos e familiares aplaudiram ao jovem maravilhoso e formoso que acabava de falar.

No jardim, do belíssimo clube onde se realizava o baile de formatura, os pais, Anna e Luca, ela com 53 e ele com 56 anos de idade...

_ Obrigada meu amor! Meu eterno companheiro!

_ Eu que agradeço a alegria que você transformou minha vida!

E o beijo ainda ardente, sela naquela noite a paixão e o amor que os unia.

Não fora fácil, mas o amor, a união entre eles os ajudaram a superar todas as dificuldades.

Vitoriana Matheus.