ELA ERA "DIFERENTE"...
Maltratada pela vida... Solitária como um
pé de sapato que perdeu seu par inseparável...
Silenciosa como a água parada de um lago
que mesmo refletindo o Sol, a lua, aos
poucos vai morrendo, estagnando, evaporando...
Não... Ela não era, claro, um cãozinho!
Mas por Deus, parecia! Sim, parecia, com
seu jeito introspectivo, medroso, frágil,
com um desses cãezinhos que vivem pelas
ruas, famintos, sós, sendo chutados, maltratados.
Mas quando recebia um carinho, por menor que
pudesse parecer, seus olhos brilhavam, o rosto se
iluminava e se desarmava inteira, sorria (os cãezinhos,
quando recebem um carinho, abanam a cauda,
lambem as mãos de quem o ofereceu e latem, felizes...)...
Mas quase sempre, como acontece com os cãezinhos,
quando ela imaginava estar recebendo um carinho
verdadeiro, sincero... Levava um "pontapé", de forma sutil...
Não chorava, não revidava... Apenas baixava a
cabeça, humilhada, e se afastava, sem compreender...
Ela aprendera com Jesus que nunca se deve
responder o mal com o mal... Que cada ato,
cada gesto, tem seu peso e correspondência...
Que se não a aceitavam, por ser "diferente", não
podia e nem devia se impor; é direito do outro...
E foi, aos poucos, afastando - se, mais e mais
isolando - se... Poucos amigos, mas distantes,
e àqueles que não podia tocar, também achava
muito difícil, com eles, desabafar... E quando
a dor, a tristeza, os conflitos a levavam a fazê-lo,
apenas os via afastarem - se, devagar...
De tudo desiludiu - se...Não conseguia mais
confiar ou o medo de magoar, chatear pessoas
que amava a fez renuncar à vida que ao menos
um pouco, amenizava sua solidão, fazia que
esquecesse sua saudade, sua lembranças queridas
de um tempo vivido, mas há muito, perdido...
Hoje, não é mais nem a sombra daquela que um
dia, mesmo com o coração triste, dava um pouco
de alegria aos amigos a quem amou e ama, com
sinceridade, mas que não conseguiram aceitá - la,
porque não admitiram sua verdade, não acreditaram
que não era, como era, contra sua própria vontade...