Extrema opção
Ele lhe suscitava as mais intensas emoções: ela oscilava entre a felicidade absoluta e a tristeza mortal, o êxtase e o precipício, o amor mais terno e o ódio mais radical. Tinha ganas de abrir-lhe a cabeça a marteladas para ver se enfiava algo dentro, rasgar-lhe o peito para tentar desvendar seu coração – para no segundo seguinte massagear-lhe com carinho as pernas fortes, coçar-lhe as costas largas, beijar-lhe a boca de mil palavras: metade insinceras, metade duvidosas, todas absolutamente envolventes.
Ele era a única pessoa no mundo capaz de tirar-lhe gritos de raiva e socos na mesa, de subtrair-lhe sono à noite e fome de dia. Tinha o domínio total de seu corpo e incitava o descontrole de sua mente. A racionalidade dela, ainda que não tão pouca, ia aos limites do inexistente e sua cegueira se intensificava para que ela, depois, às vezes achasse graça de suas atitudes, e em outras as achasse absolutamente ridículas.
Não conseguia responder como sabia que deveria: era como uma força magnética que desviava desde a menor limalha até a massa mais pesada de seu metal para qualquer lugar que quisesse, sem o menor esforço. Odiava admitir que ele exercia sobre ela mais poder do que ela gostaria de compartilhar, porém resignava-se ao perceber que a simples presença dele aplacava-lhe qualquer resquício de tristeza, e que ouvir a voz dele pela manhã era garantia de um dia luminoso. Ele sugava seu orgulho com canudinho, aquele orgulho do qual ela tanto se vangloriava.
Ele brilhava como o sol para fazer cintilar os mais lindos reflexos dourados sobre o lago de aparência calma, mas revolvia o fundo lodoso e de lá trazia à tona coisas que ela nem imaginava existir. E isso, acima de revoltá-la, surpreendia-a, pois a vida ardia, espetava. A vida era uma sucessão de pontos de interrogação, todos vivos e pulsantes.
Um dia, locupletada de tanta paixão, resolveu dar um basta. Foi simples, como simples era a visão dele do mundo: o fim era o fim, já que para nada na vida dele havia meios termos. Pronto. Respirou aliviada, voltou a dormir à noite, deitava-se cedo, engordou; conseguiu enxergar de novo os tons pastéis, parou de gritar, nunca mais deu um soco na mesa; passou a não se mirar tanto no espelho. Botou todas as gavetas em ordem, desligou para sempre o celular, deixou de usar perfume, parou de escrever tolices e nunca mais foi aos extremos.
Viveu em paz até o fim da sua morte.