Histórias de homens e bruxas.
O segredo
Era madrugada, quando nada se ouvia na rua além do próprio silêncio a brincar com nossa imaginação. As casas próximas estavam com suas luzes apagadas, onde, acesas apenas ficam aquelas que servem para afastar os maus espíritos, sejam eles dos vivos ou dos mortos.
O vento, a passar por entre portas e janelas, invadindo e perfumando ambientes diferentes. Acariciando corpos de amantes exaustos e também dos donos de mentes exaustas, àqueles que já não sentem mais vontade de amar.
Foi nesta noite, de vento perfumado, de amantes exaustos e de mentes exaustas que tudo começou.
O barulho dos passos ficava cada vez mais alto e assim ficava fácil notar a pressa que carregada sobre seus ombros. Carregava uma pequena bolsa preta com fivelas grandes e vestia um casaco vermelho. Tinha cabelos lindos e claros que como soldados obedientes marchavam junto com seus passos... balançando, levemente...eram eles que perfumavam o vento.
Fui seguindo estes passos, embalado também pelo movimento dos cabelos claros e mais leves que já vi. Fui caminhando bem próximo, tão próximo que a vontade de tocá-la aumentava na medida em que o perfume do seu corpo me embriagava. Porem, resistente a vontade que tomava conta do meu pensamento, nada fiz. Continuei ali, servo e gentil.
Pensei que poderia falar alguma coisa para chamar a atenção da dona do casaco vermelho, construí e destruí diálogos imaginários, lembrei de versos, pensei em mapas, canções, nomes... Respirei profundamente, mas calei-me.
Fiquei em silêncio e fui coberto pelo medo. Não consegui dizer nenhuma palavra, pois me engasguei por dentro.
Ela, linda, perfumada e leve, mesmo com seu andar tão apressado não percebeu minha presença. Estava em outro mundo, distante, gelada...como alguém que guarda um segredo. Onde estava indo? Para casa? A um encontro de amor? Tanto havia para eu pensar que não me poupei do sofrimento e da inveja. Quem foi o último a beijar-lhe a boca? Para quem se despiu e entregou-se por inteira? Como deve ser bom sentir seu cheiro e saborear sua pele...chego a sentir meus dedos nos cabelos claros...
Mesmo sendo madrugada, e, sabendo que eu caminhava muito próximo ela parecia não temer nem a lua, nem a mim...
Nesta hora escuto um barulho de chaves, rapidamente abre o cadeado que tranca um portão antigo... Apresso meus passos, mas passou. Ela já não existe mais era este seu maior segredo. Agora só o tempo me fará companhia, o tempo e o desespero de um homem que enlouqueceu por uma bruxa de cabelos claros que sumiu ao nascer do dia.
Pequenos Contos – Histórias de homens e bruxas.
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