"O CACHACEIRO ADEBALDO" Conto de: Flávio Cavalcante
O CACHACEIRO ADEBALDO
Conto de:
Flávio Cavalcante
Era um belo dia na cidade de São José da Laje, e, como sempre, Adebaldo, o maior cachaceiro que aquela terra já viu, estava pronto para começar a jornada diária pela cachaça. Dizem que ele já começou a beber antes de aprender a falar. Seu lema era simples: “Hoje só vou tomar um gole!” Mas, claro, esse gole sempre se multiplicava em muitos.
Adebaldo morava na beira do rio Canhoto, numa casa de taipa que vivia cheia de gente pedindo fiado na venda improvisada que ele dizia ser o “Bar do Adebaldo”. O detalhe é que a única coisa à venda ali era cachaça que ele mesmo destilava. Todo mundo na cidade sabia que a cachaça do Adebaldo era forte o suficiente pra fazer até o padre tropeçar nas palavras no sermão de domingo. Dizem que uma vez ele vendeu um gole pra um turista que ficou dois dias dormindo na beira do rio.
Um belo dia, Adebaldo decidiu fazer um teste de resistência. “Hoje é o dia que eu paro depois do primeiro litro!”, disse ele, como se aquilo fosse uma grande promessa. E, assim, ele começou a beber e, claro, logo estava na praça principal, discursando sobre filosofia e as “maravilhas da vida de solteiro”. Ele falava que nunca se casou porque seu verdadeiro amor era a cachaça, e ninguém podia competir com ela.
Quando o sol já começava a se pôr, Adebaldo resolveu dar uma volta pelo rio pra “refrescar as ideias” – ou, como ele dizia, “pensar sobre a vida e o universo”. Com uma garrafa embaixo do braço, ele caminhava trôpego pelas margens até que deu de cara com o reflexo dele mesmo na água. E, naquele momento, surgiu uma ideia. “Vou desafiar meu reflexo pra ver quem é o mais forte!”
Adebaldo começou a discutir com o próprio reflexo na água, apontando o dedo e dizendo: “Tu não é homem de me encarar, não, meu amigo! Vou te mostrar quem manda nessa cidade.” E foi assim que ele, com um surto de coragem etílica, deu um mergulho na água, decidido a “dar uma surra” em seu rival imaginário.
Os amigos que estavam por perto não aguentaram e começaram a rir, enquanto tentavam puxar Adebaldo pra fora do rio. Ele, todo molhado, insistia: “Eu ganhei a briga! O sujeito desistiu, correu, foi embora! Ninguém me segura!” E, no fim, levantou a garrafa, brindando com a multidão que aplaudia o “herói” da cidade.
Naquela noite, Adebaldo foi carregado pra casa com honras de “guerreiro” e, no outro dia, com uma ressaca daquelas, ele balbuciou: “Hoje eu bebo só um gole... ou dois.”
E assim seguiu Adebaldo, o cachaceiro mais teimoso e engraçado que São José da Laje já conheceu. Dizem que até hoje, de vez em quando, ele encara o reflexo no rio, só pra ver se o “rival” ousa aparecer de novo.
Flávio Cavalcante