Na manhã anterior tinham feito uma “brincadeira” em sala de aula, com o peso do Fabinho. Ele que era tão… doce. Tão amável. As crianças não teriam essa impressão assim tão nítida, mas podiam sentir… sentir-se bem perto dele. Ele era aquele menino que se dava bem com meninos e meninas e nunca dizia palavras ofensivas, nunca se metia em problemas; não chegava a ser CDF mas tinha suas notas boas e meeiras aqui e ali. Às vezes coisas acontecem de repente, sob influência negativa de fora ou dum simples sopro diabólico no ouvido de alguém. Às vezes esses demônios que sopram coisas horríveis são os próprios pais das crianças. “Ô rolo de poço! Haha!” – Gritou um aluno. O outro aluno ao lado também riu… O rapaz que começou, sentiu-se a vontade pra continuar.
– Não dá pra a gente ver o mapa porque a linha do equador tá na frente do quadro!! – A sala desabou em gargalhadas. Todos riram. Fábio sorriu, com lágrimas nos olhos que não chegaram a descer…moveu-se como um bobo e saiu da frente do quadro. Tentava sorrir e parecer levar aquilo na brincadeira. Olhou a professora e pensou: “Porque ela não faz nada?!”.
No dia seguinte Fábio tinha dentro da mochila um sanduíche da Subway e a pistola do pai; que ele sempre soube onde estava guardada e onde estavam as chaves e as balas. A hora da aula ia passando… e Fábio tentava se decidir. Ou um sanduíche ou a morte de várias pessoas. Ninguém mais parecia lembrar do dia anterior. Só ele lembrava… Isso o deixava com mais ódio ainda. O sinal do recreio tocou… e o menino do dia anterior se aproximou dele.
– Fabinho…
– Er… oi…
– Eu queria me desculpar por ontem, cara. Você sempre foi gente fina, todo mundo gosta de você… Nada a ver eu fazer aquela piada contigo. Conversei com minha mãe ontem, e entendi… Não teve graça. Desculpa. Sabe. Eu… eu… meus pais estão se separando e eu acho que não tô fazendo as coisas direito. Descontei em você… DESCULPA! Desculpa mesmo…
– Fábio degustava o sanduíche com a pistola dentro da lancheira. E olhava o colega nos olhos.
– Tudo bem, amigo… Eu nem me lembrava mais…!! Heheh…
No início da aula – com a mesma professora de matemática do dia anterior – Fábio pediu pra falar. Dizendo que queria dar um recado. A professora deixou, esperando que ele dissesse algo sobre o dia anterior, alguma lição de moral. Algo que os pais deles disseram, pra ele dizer…
– Ontem vocês me deram um propósito, quero dizer… uma sensação boa. Que começou ruim… mas se tornou boa. E eu agradeço a todos… sobreviventes ou não. – Antes que terminasse a frase “sobreviventes ou não.” ele já ia puxando a pistola da lancheira. A professora fez menção de agarrá-lo. Alguns alunos se levantaram. Os disparos começaram…. As balas foram direcionadas nas pessoas certas. Nas pessoas “certas” que vieram ao chão.
Fabinho nunca mais seria o mesmo e sabia disso. Era mais um que era levado… e ele era levado pro encarceramento. Encarceramento junto com psiquiatras, psicólogos e remédios e toda uma mídia que não parava de falar em seu nome. Sentia-se grande. Sempre que via uma câmera… Acenava e sorria… acenava e sorria…