Era uma noite fria de dezembro no Morro Santiago, na Barra do Ceará. O vento fresco do mar se misturava com o som distante de risos e cantos que subiam das ruas da cidade. O céu estava limpo, e as estrelas pareciam brilhar mais do que o normal. Mas para Igor, um menino de apenas 14 anos, o Natal daquele ano era bem diferente dos outros. Não havia presentes, nem comida farta, nem a alegria das festas de sua infância. Ele olhava para a cidade iluminada lá de cima, sentindo o vazio que só a dor da perda poderia causar.

 

Aos 14 anos, Igor já havia enfrentado mais dificuldades do que muitas pessoas em toda uma vida. Sua mãe, uma mulher simples e batalhadora, havia sido vítima de uma bala perdida em uma briga entre traficantes, no meio do morro. A morte da mãe deixou uma dor imensa em seu peito, mas também uma responsabilidade que parecia ser grande demais para alguém tão jovem. Sem pai, sem parentes próximos para ajudar, Igor teve que assumir o papel de chefe da casa, cuidar de seus dois irmãos mais novos, Maria e João, que ainda eram crianças.

 

A vida no morro era dura. Igor começou a trabalhar com reciclagem, catando papelão, garrafas e metais nas ruas. Era um trabalho difícil, mas ele nunca se recusou, pois sabia que tinha que colocar comida na mesa para os irmãos. Embora o tráfico de drogas fosse uma presença constante no morro, Igor nunca se envolveu com isso. Ele via os amigos, alguns mais velhos, sendo arrastados para o mundo das drogas e da violência, mas sempre se manteve firme. Seu amor pelos irmãos o mantinha forte. Ele queria dar um futuro melhor a eles, longe da vida que o cercava.

 

Naquela noite de Natal, enquanto as luzes da cidade piscavam ao longe, Igor se sentou com seus irmãos na pequena casa de madeira que ainda chamavam de lar. Não havia comida, e o frio da noite apertava. Eles estavam famintos, mas havia algo mais naquele momento: uma tristeza silenciosa que invadia o coração de Igor. Ele sabia que, ao olhar para a ceia farta das famílias da cidade, era difícil não se sentir indignado com a desigualdade e a dureza da vida no morro. Mas, apesar da dor, ele se mantinha firme.

 

Olhou para os irmãos, Maria e João, e tentou sorrir. "Vamos ficar juntos, não importa o que aconteça. Somos uma família", ele disse, tentando transmitir um pouco de esperança. Eles, com os olhos grandes e inocentes, se aconchegaram mais perto dele. Sabiam que, apesar de tudo, aquele irmão mais velho era o seu refúgio, seu único porto seguro.

 

Enquanto o relógio marcava a meia-noite e a cidade celebrava, Igor ainda estava ali, olhando para as luzes brilhando à distância, com a sensação de que a vida poderia ser bem diferente. Mas ele não sabia como ou quando, apenas que, um dia, ele conseguiria dar aos irmãos algo mais do que aquilo. Ele queria ser diferente de tudo o que o cercava, resistir à tentação das drogas e da violência, lutar por um futuro melhor.

 

Naquela noite de Natal, sem comida, sem festa, mas com a esperança de que o amor entre eles poderia ser o suficiente, Igor jurou que daria tudo de si para garantir que seus irmãos tivessem uma vida melhor, longe da escuridão e da dor. A cidade iluminada lá embaixo parecia distante, mas Igor sabia que, por mais difícil que fosse, ele poderia encontrar uma maneira de alcançar a luz. E, por ora, isso era tudo o que ele precisava.

 

Vantuilo Gonçalves
Enviado por Vantuilo Gonçalves em 17/12/2024
Reeditado em 17/12/2024
Código do texto: T8221057
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