ASSOMBRAÇÃO
Certa feita, Maria do Tobias e mais duas amigas saíram pela manhãzinha do Alto Forquilhas caminhando para assistirem a missa das nove na igreja matriz de São José. As três de braços entrelaçados, a passos largos caminhavam felizes cada qual contando as novidades da última festa que haviam participado na comunidade. Maria do Tobias comentava que conhecera um rapaz muito simpático e trabalhador, conforme ouvira da boca de seu primo Juvenal, pois este conhecia o suficiente para que ele “colocasse” sua mão no abelheiro. Fora um “amor” à primeira vista, dizia ela para suas amigas. Elas, um pouco enciumadas, questionavam Maria do Tobias se ela levaria adiante este pseudo-namorico, afinal seu pai, o seu Tobias, não era lá homem de aceitar qualquer um namorar sua única filha. Como de boba não tem nada, comenta de que não existe nada oficial, apenas um encontro casual...
Durante o trajeto as duas amigas comentavam frivolidades que pouco importava a Maria do Tobias. No momento ela tinha pressa em chegar na igreja, pois lá estava a esperar o rapaz simpático e trabalhador que após a missa iriam se encontrar na quermesse do padre Juvenal para levantar fundos para a reforma da casa paroquial. Mas este encontro seria em segredo, melhor dizendo fingiriam se encontrarem “acidentalmente” para evitar fofocas desnecessárias. Maria do Tobias lembrara-se de que apesar de serem “grandes” amigas, elas adoravam intrometer-se na vida alheia espalhando notícias nem sempre condizentes com a realidade, espécie de Fake News da época, se é que me entendem...
Ao aproximar-se do Morro da Coruja, as três avistam de longe um belo rapaz de terno branco, chapéu branco sentado num tronco de árvore com olhar direcionado ao infinito. O coração de Maria do Tobias acelerou, pois ela reconheceu ser o dito cujo que conhecera na semana anterior. Não desejando revelar as suas amigas a identidade do rapaz, ao passar pela frente ignorou-o fazendo-se não conhecer. Caminharam mais um pouco, mas algo as perturbaram, pois um calafrio perpassou em seus corpos deixando-as desconfortáveis. Num só ímpeto, as três deram uma brusca parada olhando para trás não acreditando no que estavam vendo, pois o referido belo rapaz num passe de mágica começara a desaparecer feito uma nuvem de névoas.
Aos berros as três amigas saíram numa disparada chamando a atenção da vizinhança que nada entendia do ocorrido. Num piscar de olhos chegaram a igreja matriz tremendo feito uma vara verde. Alguns fiéis preocupados com a situação das mulheres vieram acudi-las oferecendo água benta da pia batismal enquanto o padre Juvenal diante do altar reprovava a atitude dos “socorristas”.
No final da missa já refeitas do susto, reclamam ao padre uma confissão urgente, pois tinham quase certeza de terem visto o capeta. Maria do Tobias sentiu-se obrigada a revelar aos demais presentes a identidade da dita assombração. Porém uma dúvida pairava no ar: Como o seu estimado primo Juvenal dera tanta certeza de conhece-lo afirmando ser um bom rapaz, simpático e trabalhador, se ele era uma assombração. Teria eu me apaixonado por um defunto, inquiria para si a infeliz Maria do Tobias? Seu primo Juvenal, seria aquele Lobisomem que andava atacando as moças da região, por isto conhecia o tal defunto?
Entre tantas dúvidas sem respostas, Maria do Tobias resolvera continuar sua vida de solteirona. Preferia ficar para titia do que se apaixonar por uma assombração.. Cruz credo. Valei-me Nossa Senhora
Valmir Vilmar de Sousa 21/03/23