SERTÃO

Vagalume enroscado na cerca, enrolado no chifre de boi lambão; de longe, só se escuta o mugido e o pisca-pisca na cabeça do tão fujão.

De longe, vemos de tudo: cachorro correndo atrás do rabo, meninos gritando e correndo que nem uns tontos, e mainha no chão com a bacia, lavando suas calcinhas.

Nem tudo está perdido; Pedro Preguiçoso se levanta e diz que vai trabalhar lá fora. João grita:

— Hoje sai uma alma do purgatório! Porque até hoje, esse preguiçoso nunca vi levantar uma enxada para plantar.

Pedro Preguiçoso, deitado, olha pelo buraco na parede de madeira, vê uma nuvem ao longe e diz:

— Acho que vai chover, vou continuar na minha cama. Mainha, traz meu café!

João sacode a cabeça, e o cavalo relincha, como se estivesse dando risada.

O dia vai passando. As mulheres na cozinha preparam as comidas, enquanto seus maridos estão na lida.

Aqui no sítio, temos muita fartura; plantamos nosso próprio alimento, de tudo temos um pouco.

Temos um lago onde pescamos, lavamos roupa, e todos se banham, do pequeno ao maior, sempre com respeito.

As noites aqui no sertão são uma maravilha; temos as estrelas no céu e os vaga-lumes que dão um certo toque de beleza à noite. No terreiro do sítio, todos em volta da fogueira, com suas cadeiras, tomando suas bebidas, contando seus causos e cantando suas cantigas, enquanto as crianças brincam de pega-pega, esconde-esconde, e lá no fundo da lagoa, os sapos com suas cantorias.

Aqui temos ar puro, sem poluição, sem barulho de carro; aqui, só o barulho dos carros de boi. Vida simples, mas que não troco por dinheiro algum.

O gostoso é sentar debaixo do pé de árvore, sentindo o vento, tomando tereré, e ver os animais pastando tranquilamente.

A cada manhã, o sol nasce vermelho por trás das montanhas, e a gente já sabe: é dia de calor. Os homens preparam a roça, as mulheres ajeitam a casa, e os mais velhos ficam na varanda, contando histórias de tempos que não voltam mais.

Quando chega a hora do almoço, o cheiro do feijão no fogão de lenha invade a casa, e todos se reúnem ao redor da mesa de madeira antiga.

E assim segue o dia, com a vida que se leva devagar, no compasso da natureza. O canto dos pássaros anuncia a tarde, e a gente se senta na varanda para ver o sol se despedir, tingindo o céu de laranja.

Aqui, cada entardecer é uma bênção, e cada novo amanhecer, uma promessa.

E assim seguimos, com o coração leve e os pés firmes na terra, porque a gente sabe que o sertão é mais do que um lugar; é um jeito de ser, é um pedaço da alma.

A noite chega de mansinho, trazendo o frescor que o sertão oferece depois de um dia quente. No céu, a lua surge cheia, banhando o terreiro de prata. O farfalhar das folhas, o coaxar dos sapos e o zumbido dos insetos se misturam numa sinfonia única, que só a vida no campo proporciona.

Dona Maria, a avó da casa, se senta perto da fogueira, com a chaleira de ferro ao lado. Sua voz é mansa, mas carrega a sabedoria de quem viu muitas luas e muitos sóis passarem. Ela começa a contar uma história que ouviu de sua avó, sobre um lobisomem que aparecia em noites como aquela, quando a lua cheia iluminava cada canto da fazenda.

As crianças, de olhos arregalados, se aproximam mais, enquanto os mais velhos sorriem, relembrando os tempos de infância, quando também se assustavam com aquelas histórias. O cachorro da fazenda, um vira-lata simpático, late para o escuro, como se entendesse que a noite guarda segredos que só ele pode ouvir.

João, ainda com um sorriso no rosto por ter visto Pedro Preguiçoso levantar da cama pela primeira vez em muito tempo, provoca:

— Ei, Pedro, se o lobisomem vier, vai correr ou ficar deitado?

Pedro responde com um ar preguiçoso:

— Acho que vou deixar o lobisomem vir até mim... E, quem sabe, fazer amizade!

A risada de todos ecoa pela noite, misturando-se com o som dos grilos. A vida segue leve, simples, cheia de pequenas alegrias e grandes histórias. A fogueira, aquecendo os corpos e as almas. Os adultos terminam seus causos, e as crianças, aos poucos, se aconchegam nos colos das mães, embaladas pela tranquilidade do lugar e pela certeza de que ali, no meio do sertão, tudo tem seu tempo e seu valor.

Mais tarde, quando o sono finalmente chega para todos, o silêncio toma conta do sítio. Apenas o balançar das folhas ao vento e o som distante de um carro de boi no caminho se fazem ouvir. É a serenidade do sertão, onde o tempo passa devagar e o coração bate no ritmo da terra.

Na manhã seguinte, o sol nascerá novamente, e a vida recomeçará com sua rotina de simplicidade e abundância. Aqui, no sertão, cada dia é uma celebração da existência, uma prova de que a felicidade não se encontra nas coisas, mas no modo como escolhemos viver.

E assim, o sertão adormece, mas não sem antes sussurrar em seus ventos: "Viva o hoje, porque o amanhã é sempre uma promessa de um novo começo."

PAULO PEREIRA

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PAULO PEREIRA
Enviado por PAULO PEREIRA em 13/09/2024
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