CÉU DE ESTRELINHAS
Noite passada eu não estava conseguindo dormir. As horas passavam, e lá estava eu, rolando e rolando nos lençóis. Tentei tomar leite, coisas mornas como chás. Até contei carneirinhos, tudo em vão.
Os pensamentos enchem minha cabeça. Por que eu penso tanto no que eu desejo ser na vida e nos bens materiais que eu quero possuir?
Dói sentir saudade. Tenho saudade dos meus pais, do acalento e de saber que está sendo cuidado e vigiado como um ato de amor. Sinto saudades dos meus amigos e das brincadeiras, de correr sem medo pela estrada empoeirada, de fazer de mil objetos inanimados o auge teatral de minha imaginação. Sinto saudade de quando a saudade não era uma dor, e sim uma nostalgia aconchegante. É difícil aceitar o que me tornei.
A cama se tornou quente demais,me levantei e abri as gavetas do meu guarda roupa, buscando um passatempo que trouxesse o sono. Achei o álbum de fotografias.
Passei-as avidamente, buscando uma memória satisfatória. Festas de aniversário, familiares distantes sorrindo em poses felizes. Passei por momentos eternizados da minha adolescência, infância e formatura.
Foi uma foto sem pessoas que mais me chamou a atenção. Um campo grande, imponente, quase se estendendo ao infinito. Uma cerca no primeiro plano guardava animais, bichos domésticos. Bodes, galinhas e cães decoravam a tapera, alegres.
Onde ficava aquele lugar, qual parente foi o dono?
O céu azul me encantou. A simplicidade tocou meu coração de forma gentil. Levantei-me da posição de cócoras com um sorriso.
Me deitei na cama, mesmo sem sono. Sonhar não tem cobrança, e pode-se fazer sem dormir.
Como seria o mundo dos meus sonhos? Ah, eu queria uma casinha: cores claras, várias janelas, um quintal sem fim. Eu queria o campo, o infinito, o verde e o marrom da estrada de terra. Eu quero vários carneirinhos, assim conto todos e consigo dormir. Eu quero um pé de manga, grande e farto. Quero andar pelo terreiro e não ter hora pra voltar.
Só não penso no céu azul… Eu sonho com uma noite cheia de estrelinhas, fantástica, contadoras de histórias e canções.
Rolei na cama, com mais sonhos do que nunca. Será que estou sendo imaturo? Será que renegar minha solidão é uma fraqueza?
Pela primeira vez em muito tempo, ignoro completamente o que acho que pensariam de mim. Preciso de energia para continuar a noite, e eu estou só.
O jeito é ir pra lá, a casa com janelas, os bichos felizes e a mangueira farta.
E, claro, o céu recheado de estrelinhas. Como é um dom sonhar!
Vou tomar todo o suco dessa ilusão até dormir. E estarei lá, no meu rancho. Solitário, talvez. Mas com bastante estrelas para admirar.