Como um passarinho
Eram vários irmãos, mas, aos poucos, foram partindo. Sobretudo os mais velhos. No fim, sobraram os dois.
Uma diferença de cinco anos não impediu que entre eles se estabelecesse uma relação de sólida cumplicidade. Quando ela casou, foi ele quem entrou na igreja com ela, orgulhoso da bela irmã que conduzia ao altar. Alguns anos mais tarde, foi a vez dele. Entre os casais, estreitaram-se os laços.
O marido dela morreu primeiro; em seguida, a cunhada. E, assim, em um espaço de poucos meses, ambos ficaram sós. O irmão convidou-a a morar com ele na estância; ela sugeriu que ele passasse temporadas em sua companhia, na cidade. Finalmente resolveram o caso prometendo-se visitas mútuas. E demoradas.
Aos oitenta e cinco anos, o irmão não resistiu a um acidente vascular cerebral. E ela, aos noventa, perdeu a vontade de viver. A figura esbelta movia-se silenciosamente pela casa, quase transparente. Alimentava-se cada vez menos: disfarçava e, sempre que podia, cuspia a comida fora. Até que um dia levantou vôo em busca de outras paragens, rumo a seus entes queridos.