A menina Nina e seu dia de Cinderela
É dia de futebol, dia de festa, de ver jogador driblando e marcando golaço de testa, matando a bola no peito e chutando a bola pro gol tocando na mesma de efeito. O que era de mais que perfeito pros olhos daquela menina? Era a nossa menina Nina, da comunidade pobre e que se chamava Sant'Ana, encrustada num morro do centro e às margens da "Suburbana", seu nome é Janaína, mas como já vos relatei, chamam-na Nina, uma linda menininha e tinha um sonho nobre e se esse tornasse verdade, daria a sua mãezinha e sua maior amiga, que tocava a casa sozinha, uma vida bem menos sofrida e com mais dignidade.
A Nina , além de bonita e bastante estudiosa, é com uma bola nos pés, muito mais que habilidosa. Na ladeira da igreja, perto de onde morava e que sempre havia peleja que ela participava . Na cabeça dos viventes, achavam calamidade, uma menina moça naquelas atividades e que o esporte bretão não foi feito pra mulher e o motivo de gozação, era sexualidade
a ignorância dos outros e a alcunha de "sapatão. Nossa, mas que maldade!
Um dia a menina Nina ficou sabendo de uma boa novidade... era que na nossa cidade haveria de se realizar uma solenidade pra receber sua maior inspiradora, era a principal jogadora da Seleção Brasileira, deixou nossa sonhadora muito pra lá de faceira que foi ter com a sua mãe, que trabalha como lavadeira na casa ao lado da escola.
_ Mãe, a Marta vai "vim" na cidade, a Marta, rainha da bola, você pode me levar?
_ Ô Nina, não me amola, tá vendo o tanto de roupa que ainda tenho pra lavar? De novo essa história de bola, e não tenho dinheiro neste exato momento, e você sabe este evento, com certeza, irão nos cobrar. E Nina ficou cabisbaixa, mas não podia chorar, ela sabe que sua mãe não quis lhe decepcionar, pois ela sabia que, se sua mãezinha pudesse, com certeza iria levar. É que na verdade acontece, é família que não se encaixa no tal quadro social, pobre só é enxergado em período eleitoral.
No dia seguinte, já que a vida não é só uma bola, a Nina acordou cedo, lanchou e e foi à escola; no meio da aula, entrou o Professor João, pediu um minuto de fala, pra dar a tal informação que no próximo fim de semana, as turmas do Irmã Dulce da comunidade Sant'Ana vai fazer a excursão e que pra ir pro passeio, além de autorização, vamos fazer um rateio para alimentação e era bem aquele evento que já havia mencionado, o de Marta chegar ao estádio para comemoração. Nina ficou contente de saber que, finalmente, iria ver de perto sua musa inspiradora a grande Marta, nossa maior jogadora bem ali na sua frente e que o dia estava certo.
No fim da aula, Nina saiu apressada, feito bicho saindo da jaula, passarinho da gaiola pra contar a sua mãe que ela não via a hora de estar perto de Marta, a nossa rainha da bola. Chegando a sua casa, era só alegria, ansiava a chegada do dia, que era no próximo sábado, a nossa Nina ao estádio em um ônibus de excursão vir a sua heroína e maior inspiração.
_ Mãezinha, Mãezinha... você não vai acreditar! O Professor João nos disse uma coisa legal, sábado vai ter festival e advinha que vai estar lá?
_ Deixa de ladainha, seu tivesse bola de cristal, até podia adivinhar.
_ A gente foi convidado pra ir no próximo sábado, toda escola pro estádio, ver a Marta chegar. A senhora não precisa me levar, não, pois, a turma do Irmã Dulce , vai sair em caravana e a gente vai de excursão.
_ Oh, minha filha, que bom! Mas estou chateada de ter de dizer que não. Você é a minha vida e seu o quanto gosta dela e fico muito sentida por não ter a condição.
_ Não há o que se lamentar, Mãezinha, se disse que não pode pagar, tenho certeza que não tinha.
Nina olhou o rosto da mãe e disse:
_ É a melhor mãe do mundo e pra mim, iguala você não existe!
E num longo e forte abraço, mostravam que além de pobres, ali ninguém é triste; há uma mulher lutadora que por sua menina persiste e uma "Nina" jogadora que de um sonho não desiste.
_ E tem um detalhe a mais, o ônibus é disponível, disse o professor João, mas tem que dar dez reais para nossa refeição.
_ Xi, minha filha, isso não será possível, pois como eu já te disse, estou sem nenhum tostão.
Que pena, parece que não é dessa vez que a nossa pequena iria conhecer a musa, ela já imaginava Marta assinando a blusa.
Mas Nina não se abatera, um dia de outra maneira, elas venham se encontrar, em jogo ou solenidade, e entre as duas surgirá uma grande amizade. Nina previa o momento, além de persistente, ela tinha muito talento, a vida é o relógio que pra tudo tem tempo, seu dia e sua hora, tudo que vai volta, pois o mundo é mesmo uma bola.
No dia seguinte, assistindo a uma aula, a classe de Nina recebeu o Professor João que cobrava dos alunos a tal autorização para irem pro estádio para a tal da excursão. Nina esboçou constrangimento e estava cabisbaixa pois, apesar do consentimento, não conseguira o dinheiro para pagar a devida taxa, para sua refeição.
Mas a Nina era forte e tinha fé das coisas se reverterem e tinha a certeza que a sua sorte as fariam se conhecerem. O o professor João notou a tristeza da Nina e comentou com os colegas na área da cantina.
_ Gente, quando eu fui dar o recado da nossa excursão, senti nos olhos da Nina tristeza e consternação, a menina não arranjou o dez reais para nossa refeição, precisamos dar um jeito de fazer a doação.
O que a Nina não sabia, alguém ali se comovia e viu nos olhos da menina sua infância sonhadora e decidiu colaborar com a Nina a encontrar nossa maior jogadora. Durante da aula, nossa Nina foi chamada por Maria Auxiliadora que exercia no Irmã Dulce como vice-diretora; uma mulher dedicada e que apesar de sisuda, o coração de professora.
_ Janaína, antes de você ir para casa, quero que vá a minha sala,
Nina ficou assustada sem saber o que ocorria, qual seria o motivo de ter que ir à vice diretoria?
Chegou até a porta e bateu antes de entrar, limpou a sujeira da bota e abriu devagarinho e enfiou primeiro o rostinho a para um primeiro olhar.
_ Ah, é você Janaína, eu estava te aguardando, faça o favor de entrar ! ordenou Auxiliadora.
Nina pediu licença, mas algo ainda a afligia em não saber a pertinência de ter sido intimada pela vice-diretora.
_ Chamei você aqui por saber seu sentimento de tristeza e a sua aflição quando o Professor João foi até a sua sala para então convidá-los para nossa excursão. Relatou o João, enquanto ele proferia, e que mesmo sem ter como ir, entendeu a situação, porém não posso aceitar que o que é tão pouco para muitos, par você é demais, tamanha decepção; e por isso decidi, que se depender de mim, não irá perder a excursão por conta de dez reais.
A Nina estremecia, não sabia se chorava, não sabia se sorria, o que nossa Nina estava mesmo era explodindo de alegria.
_ Mas o que você precisa é falar com a sua mãe e ver se ela te autoriza, pois, como você já sabe, não vai ser em dia de semana e já está em cima da hora, a excursão do Irmã Dulce sairá do Sant'Ana é ausência das escola , a autorização é essencial e a assinatura de ciência dos pais é mais que fundamental.
_ Dona Auxiliadora, não se preocupe, não, esta notícia boa, deixará a minha mãe com muita satisfação, já que pode me ajudar, com certeza assinará a permissão.
A Nina desceu apressada, desembestou na calçada na ânsia de chegar à casa, pra contar a novidade,
_Mamãe, Mamãe, eu disse para o professor que não tinha dinheiro e não "ía" na excursão, mas sabe o que aconteceu?
"Me" chamaram na vice diretoria e a Dona Auxiliadora disse que pagaria pegou dez Reais na bolsa e ela me deu.
_Mas Nina, que coisa mais sem graça, como eu vou pagar pra ela?
_ Oche, mãe, não tem nada de sem graça, se a ideia foi dela. Ela me deu o dinheiro, dizendo que um sonho de criança não se recupera e que, quem dera, todo dia uma criança tivesse quem realizasse o seu sonho de infância. Passou-se o resto da semana e chegou então o dia de o Irmã Dulce descer o Sant'Ana e seguir ao destino esperado, de encontrar a Marta no estádio.
Todos estavam sorrindo e a viagem foi tranquila, o dia estava tão lindo e a festa se anunciava; a Nina era só alegria, enfim chegou o grande dia que a menina esperava, seu amor pelo esporte, a cada dia mais forte, de estar bem perto da Marta além de oportunidade é uma questão de sorte, pois já que evento igual este, é um na vida, outro na morte.
Na entrada do estádio, reuniu-se a garotada, perfiladas lado a lado, para organizar a entrada, tudo bem organizado, lá dentro estava um ambiente festivo e parcialmente lotado, a guardando a chegada da nossa ilustre convidada, a Marta da seleção, jogadora consagrada do esporte bretão. Havia uma movimentação pela entrada lateral, a zoada descomunal, Marta estava chegando e as crianças ficaram eufóricas, assistir à rainha Marta ao vivo, com certeza era coisa histórica, surgiu da tribuna do estádio através da imensa vidraça, o prefeito babando ao seu lado a "Rainha" cheia de graça.
Nossa Nina não se conteve, partiu que nem uma flecha, saiu em disparada, procurando uma brecha para então se aproximar da ilustre convidada; o coração não cabia no peito, queria de qualquer jeito, chegar bem pertinho da Marta, do esporte que a Nina amava, quem mais o representava. Chegando a um lugar, embaixo da arquibancada, onde havia uma meninada, em ordem unida montada e severamente instruídas pelo nobre treinador, pois durante a solenidade haveria um certo rigor. Durante a tal solenidade, haveria uma partida entre times a nossa cidade , na liga de futebol amador. O professor fazia a chamada e todos gritavam "presente"; de repente o professor chamou uma das meninas, o nome Ana Carolina, por vezes repetidas, sem ela responder, Do meio da meninada, uma senhora apressada se diz mãe da referida e que não iria poder, pois estava acometida de repentina catapora que para a tal partida, ela iria ficar de fora. O professor preocupado já que o time das meninas tem poucas substitutas e a notícia tão abrupta, o que há de se fazer?
_E agora, estamos com um dilema, sem a Ana Carolina, criou-se um baita problema; onde arranjaremos outra pro lugar da menina?
Nina ouvia a tal conversa, erguendo a sua mãozinha, pediu licença ao moço, que estava agitado à beça, como se ele estivesse com uma corda no pescoço, dizendo que joga na linha e que era a peça que faltava pra tirar o time do poço.
_ Verdade, onde você mora, menina? Como você se chama, qual a sua idade?
_ "Me" chamo Janaína, mas pode chamar de Nina, tenho quatorze anos e vivo na Ladeira do Sant'Ana, do outro lado da cidade.
_ Onde está sua chuteira, cadê o seu meião? Em jogos comunitários, é obrigada a usar a caneleira.
Xiiii, mas que decepção; pois Nina não tinha nada; não tinha nenhuma chuteira, tampouco a tal caneleira e em toda sua "carreira", jamais ela usara um meião. O treinador foi bastante taxativo:
_ Não poderá jogar, menina, nas regras da disciplina, sem ter por completo o atleta, o material esportivo.
Nina baixou a cabeça e foi saindo de fininho; até a senhora, mãe de Ana Carolina, ao vir a tristeza da pobre criança deu luz a sua esperança e fê-la ver que onde há noventa e nove por cento de dúvida, existe um por cento de fé:
_ Menina, espere um pouquinho, qual o número do seu pé?
E a Nina respondeu gaguejando:
_ Eu cacalço é trrinta e ssseis!
_ Nossa, que pés enormes! Pensei que era só a minha filha que tinha um grande pezão, parece que aumentaram com tempo, deve ser muito hormônio na nossa alimentação, vou ao carro pegar o uniforme, a chuteira e um par de meião. E a Nina nem acreditava, chegou a chorar de alegria, pois estava a realizar um sonho de todo dia. Na presença de sua "soberana", estaria ali a Nina a representar o Irmã Dulce da Ladeira do Sant'Ana uma comunidade esquecida às margens da Suburbana.
Logo em seguida, abriu-se a solenidade os empresários, políticos e seus fiéis funcionários e até o prefeito da cidade; muitas comemorações desde o Hino Nacional e também alguns colégios dando apresentações. De repente o professor se livrou do apito e passou a usar do grito pra chamar todos atletas, pois já era quase a hora de eles fazerem a festa. Seu nome era Agenor, uma homenagem que o pai fizera ao mestre Cartola, nome também conferido ao grande Cazuza, que no Rock nacional fez escola, mas ali ele era o maestro e sua batuta era a bola. O professor dividiu em três categorias o jogo das crianças, dos meninos e para homenagear a Marta, encerrariam a festa com um jogo feminino. Durante o evento, foi chegando o momento das meninas estrearem, o Agenor reuniu as meninas para se organizarem. Uma a uma deram as mãos e naquela ocasião, adentraram a arena e havia tanta gente que para homenagear a Marta, a cidade ficou pequena. As meninas fizeram uma pose para a foto eternizar; nossa Nina não ficou bem, em vez de estar sorrindo, ela estava emocionada e não parava de chorar. Nina jogaria de branco, pelo Colégio Rosário, o colégio da classe mais abastada da nossa bela cidade. O outro time jogando celeste é melhor amador da cidade é o time do Sesp, que tem em todos esportes, o respeito tanto da elite, quanto da comunidade. Formaram uma fila de mãos dadas e foram entrando em campo, Nina estava extasiada, como que por encanto. Começou o Hino nacional e as meninas seguiam cantando junto com a maioria e como já era normal, haviam alguns só dublando. E era chegada a hora, o Juiz chamou as capitães para o cara e coroa e após jogar a moedinha, uma escolheu o campo a outra sair com a bola. Nina esperou a saída e logo se posicionou, quando a menina a viu correr, nem pensou, fez um lançamento e com um rápido pensamento, a lateral não dominou, mas a Nina, inteligente, logo tomou a dianteira, cortou para o lado direito, levou um bote da zagueira, mas Nina recuperou e deu um corta luz e foi adiante faceira, deu aquela entortada fazendo a galera gritar com sua bela jogada , e só não abriu o placar, porque bem posicionada, a bola parou na goleira. Nina voltou para marcar e tinha uma loirinha, que a olhou confiante como quem imaginasse que aquilo não passasse de sorte de principiante. Correu para o lançamento e, pelo seu grande porte, deu de corpo na marcadora e partiu desenfreada, desferiu um tiro forte que a bola quase foi parar no meio da arquibancada; fez o sinal da cruz e balançou a cabeça reprovando a sua jogada. Saiu o tiro de meta e a Nina pediu a bola a Loirinha tomou a reta, a goleira atirou no meio e a Loirinha não contou tempo e rápida interveio, tabelou com a colega e logo meteu de voleio atingindo o barbante em cheio. a festa é do time celeste,; está um a zero pro Sesp.
Bola no centro do campo; a Luana tocou para Bruna e a Nina avançou pelo lado e partiu pelo centro e o time todo marcado, tomou mais um contra ataque e o Agenor foi ficando nervoso quase tendo um piripaque.
_ Levanta a cabeça, a negrinha tava solta e você rifou a bola? Deixa de onda, de ficar de panelinha desse jeito a gente se enrola. Presta atenção no jogo, Bruna, cê já viu quem tá lá assistindo daquela tribuna?
Por sorte o ataque foi desarmado, a zagueira deu um bico pra frente bate em uma oponente, o Lateral foi cobrado, a Nina pediu pra tocar. Ela fez que nem viu e tentou cruzar, perdeu a bola de novo, a meia lançou a Loirinha, que bem habilidosa, chamou a Bruna pra dançar arrancando gritos da galera, devemos admitir, essa Loirinha é uma fera! Avistou a colega e lançou nas costas da Luana e deixou pra ela fazer, e naquele exato instante, para o time do Sesp, outra bola no barbante. Não tinha jeito, a presença da Nina no jogo, parecia ser invisível, e isso doía no peito, seria a pobreza doença, seria ser negra um defeito? O Rosário aceitá-la no time, era coisa indiscutível, uma falta de respeito e discriminar um preto no seio do nosso povo, nem sempre era preconceito. Nina foi se apequenando e começava a entender que aquele ambiente não foi feito pra sua gente. Acabou o primeiro tempo, Nina estava em desalento, o time do Rosário era desapontamento, pois, por conta do preconceito, perdia por dois tentos. No intervalo, todos no vestiário, a bronca era com razão, a sinceridade tomou conta do ambiente, a cobrança do Agenor; como pode um time desse, em uma apresentação, ser tão incompetente?
_ Bruna, por que que você não lançou a Nina quando ela ía pra frente?
Agenor tinha história de atleta, enxergava na Nina uma postura correta que seu posicionamento seria a arma secreta, sabia que ali era a chance da menina do Irmã Dulce enfim se revelar. No decorrer do primeiro tempo, notou que ela tinha talento, mas o que ele realmente vira é que o ego das meninas não queria aceitar, como uma preta de morro haveria de jogar?
E foi uma bronca daquelas, Agenor abraçou a Nina e exigiu que as outras a respeitassem como merecesse ela, não como uma pobre menina, mas como companheira, porque em qualquer esporte, já não mais existem barreiras a não ser numa certa corrida, um exemplo de saúde e de qualidade de vida. Agenor fez duas alterações, o que não foi bem vista pelos pais dessas meninas, principalmente em manter a negrinha que não é da agremiação, mas mesmo contrariado, manteve as recomendações, certo que daquele jeito, não havia condições.
_ Bruna, você desce pra meia cancha, deixa a Nina na frente, pra ver se ela deslancha; Mariza, não saia à toa na bola, deixa que a zaga defende, saindo você se enrola e toma mais gols de repente; simbora, esqueçam que estamos perdendo, agora é bola pra frente, alguém não está entendendo?
E retornaram ao campo; a Nina, depois de ouvir o Agenor, esqueceu-se do desencanto e correu pra posição onde ela era o soldado a defender o seu manto e tinha muito talento em cumprir sua missão, olhava para a tribuna, fitava sua mentora, sua musa inspiradora, a "Marta da Seleção".
E recomeça a partida e a bola agora é do Sesp, mas a Nina não é de "banheira", recuou para a sua defesa para ajudar as zagueiras, correu para o lado esquerdo e fitou a menina sem medo no dever de lhe marcar; a Nina era humilde, mas tinha os seus caprichos, escolhera marcar a Loirinha que achava que era o "bicho" e sem ninguém pra superar. E a Nina passou por ela quando ela tentou um voleio, esperta fez logo o bloqueio e mostrou àquela confiante que a quis humilhar arrogante que o futebol da neguinha não era sorte de principiante que disse no primeiro tempo e soube naquele momento que estava fechada a cancela e que a Nina do Sant'Ana tinha se tornado a "tramela". A Nina foi muito folgada, nem quis concluir a jogada, passou a bola por cima, deixando a menina loirinha sem saber de mais nada. A Nina correu pelo lado a fim que então havia lançado; encarou a marcadora e sem "fomeagem" tocou para outra jogadora, subiu pro ataque pra se livrar da marcação, mas quem quase teve um "piripaque" foi o treinador , enquanto via a plateia aplaudir a Nina revelação. Luana ergueu a cabeça e avistou a Bruna subindo, que ao receber foi cruzando e dali uma outra jogada já viria ali surgindo; a Nina dominou no ar e deu de cavadinha, a Bruna deu de cabeça e pobre goleira encobrindo. E era gol do Rosário, para alegria do Seu Olegário avõ da menina Bruna ao ver a Rainha Marta aplaudi-la da tribuna.
Bola na meia-cancha, o Sesp, time orgulhoso, com fama de ser poderoso achava que aquela fama não há time que desmancha, e o treinador gritava feito uma buzina: "Cuidado com essa Menina!"
Ali era a sua sina, A garota da favela, era a Nossa heroína , ali a história da Nina, um conto de Cinderela, a turma do "Irmã Dulce" , num estrondo se esgoela, sentindo representada por aquela negrinha franzina, dando o melhor de si no campo, onde se aprende e se ensina a arte do jogo Bretão, a nossa querida Nina; lá do morro do Sant'Ana, comunidade encrustada às margens da "Suburbana".
A zagueira do Sesp também era a mais alta, tentou driblar a Luana, mas logo levou uma falta. o Juiz aplicou um cartão e marcou um tiro livre. a Grandona pegou a bola e dizendo que a bomba da sua pernalta, não tem goleira que revide. Tomou distância da bola e cochichou com a colega ao lado e olhou para a loirinha que mostrou-se entender que aquele ataque já se havia planejado, mas a Nina era danada, correu ao longo da linha e foi de encontro a loirinha pra enfim matar a jogada. Então a guria mais alta partiu para bater a falta, apesar de a loirinha chegar, Nina foi mais peralta, foi logo tomando, deu um drible em forma de jota, ligou com a menina de atrás e partiu, avançou pela direita, fez uma jogada perfeita, que a menina entendeu e enfiou a bola com açúcar e aí a Nina então chuta, bem por baixo e de bicudo a zagueira tentou desviar, mas entrou com bola e tudo.
Dois a dois, A Nina abraçou-se com a Bruna e galera caiu em cima e a Marta lá da tribuna assobiava para as meninas. Ela sabia do poder que tinha o Sesp ao empatar com o Rosário, de certo lembrou do calvário no início da sua história para se tornar a mulher de fibra, de luta e de glória. A Nina sabe o que quer e demonstra por onde passa, o valor que tem a mulher; sua graça, sua raça e ela estava no seu templo, no seu merecido lugar e olhou para sua rainha que estava a lhe admirar.
Bola ao centro novamente, a coisa agora era diferente, deixaram a Nina jogar para a alegria da gente, e só a esquadra do Sesp era quem não estava contente ao se deparar nesse instante, uma equipe coerente, sobretudo a nossa Nina, que tem um futebol que até a Marta fascina, fez história no Rosário num curto espaço de tempo, sem fazer parte efetiva daquele belíssimo elenco. E o treinador do Sesp, sentindo-se incomodado com o espaço de três minutos, perdendo por dois gols o Rosário ter empatado. e tomou a decisão; ao ver a fraqueza no flanco, chamou as meninas do banco para substituição. Tirou a cabeça-de-área, que era um pouco franzina, chamando um certa menina com nome de Januária, maior que aquela da falta, que além de ser a mais larga, também era ela a mais alta e era preta que nem a Nina, com a pele bem escura, mas pela sua grandeza, parecia uma armadura.
_Vai lá Januária, faz um serviço bem feito, quem se atrever nessa área, você tem que impor o respeito!
O Time do Sesp retoma a partida, Mas a Bruna mais esperta, ganhou na dividida, lançando a bola pra frente, Luana matou imediatamente, jogando a bola com gana, ela deu um drible bacana e indo direto pra área, Luana que era franzina enfrenta a parede feminina de nome Januária. que, não sendo habilidosa a parou com uma falta maldosa. A juíza não contou tempo e naquele exato momento, puxou do bolso um cartão e bateu logo o desespero; a giganta acabou de entrar só para levar um vermelho. Depois da expulsão da zagueira , o treinador ficou possesso e disparou tanta besteira afirmando revoltado que a juíza da partida nem pra gandula presta. A mulher não pensou duas vezes, diante de tal entrevero, puxou novamente o cartão mandando o doido pro chuveiro, Luana pegou a bola e se preparou pra bater e todas se deram conta de quem deveriam conter, pois a bola nos pés da Nina é osso duro de roer e poderia pegar o rebote se a goleira rebater. Luana olhou a baliza e depois as companheiras, bateu com categoria que a bola encobriu a barreira e explodiu no primeiro pau, a zagueira ao ouvir a bola na trave, antes que a coisa se agrave a zuniu pela lateral. A Bruna pegou a bola apontando às meninas a área, já que a grande Januária estava do lado de fora. No Rosário tinha uma ruivinha, usando "maria-chiquinha" de nome Joana D'Arc e que logo sacou a jogada, pra sair da marcação, naquele vai e vem e preparando uma tacada pra deixar o seu também. A Marta não se continha olhando lá da tribuna o telefone sem fio protagonizado por Bruna e a habilidosa Darquinha.
A cadência dessas meninas que estavam jogando bonito, que deixou muito contente a que todos chamavam de mito. Marta se entreolhava com a sua assessoria demonstrando no semblante tamanha a sua alegria ao ver aquelas meninas atreladas pelo esporte, deixando-a muito feliz, aquela que por meio dele, cativou a independência, e que não é por pura sorte, um expoente do país.
A Bruna ligou o lance, do jeito que havia pensado, Darquinha correu pra frente pois tinha entendido o recado, mas Bruna lançou para o lado que Nina tinha gritado, lançou a bola na área, Darquinha, de bicicleta, quase atingiu a meta,mas a goleira esperta correu para a posição, todavia bateu roupa e a Nina que não era boba impôs a situação, deu um lindo corta-luz e tocou a bola de chapa para enfim deixar o seu e agradecer ao Jesus.
A galera foi à loucura e aquela partida entraria para a história, que sem a estrutura do Sesp, o Rosário alcançava a glória que diante de tal conjuntura, agarrada na grande aventura de ganhar da gigante celeste, e coincidente no dia em que a maior de todas pra elas, da tribuna as aplaudia era batalha dantesca ou uma espécie de releitura da passagem Davi e Golias.
Faltavam cinco minutos, o Sesp tentava reverter, mas tinha que ter cautela pois, além de uma atleta a menos, havia desvantagem na tabela e qualquer movimento bruto, poderia por tudo a perder. Encerrou-se o tempo regulamentar e juíza apontou para sua auxiliar pedindo mais quatro minutos e aí começou a agonia... cada minuto que passava uma hora parecia. Mas o jogo bem no finzinho, aquela bendita loirinha iniciou uma jogada e tocou devagarinho, aguardando a investida da Bruna que arriscou lhe dar um carrinho, mas caiu desconcertada, e ao encontro dela, lá se foi a Nina, aquela pretinha franzina sabia mesmo o que fazer, entendia de atacar , o mesmo que se defender. A loirinha lançou de efeito a em meia altura e já a Nina com postura tratou de dar o seu jeito, domina a bola no peito e a deixa cair no seu pé, até parecia que a bola já reconhecera que é e quem manda, nina triangulou com a Amanda que logo ligou com a Bruna que deu uma de chicoteio, deixando sua adversária sem saber de onde veio e Darquinha ao tomar a pelota, logo desenhou a rota ao ver a Nina avançando, pegou a bola de jeito e mandou um belo voleio e a bola acabou entrando. A juíza apitou mais um gol e quase no mesmo instante, a partida se encerrou.
Esse dia entrou pra história para nossa dia cidade pacata, assistimos à improvável vitória, com ilustre presença da Marta, onde o time modesto, nosso querido Rosário, abateu o forte Sesp, duríssimo adversário, As meninas se abraçaram e depois deram as mãos, trocando parabéns pela bela atuação; viraram para a arquibancada que as aplaudiu de pé, um time de aparente humildade, que prevaleceu a fé.
Marta ficou orgulhosa pelo nobre resultado, viu nas meninas do Rosário como foi a sua luta, a pobreza e o preconceito, além do futebol, seu maior adversário; ironia do destino, a semente foi lançada e hoje o futebol feminino é uma realidade graças às Martas e Formigas que surgem nas nossas cidades. Nossas heroínas foram ao vestiário pra tirar a indumentária e retornariam ao campo pra receber as medalhas. Nina entregou as chuteiras para mãe de Carolina e o seu uniforme a roupeira das meninas. Marta desceu da tribuna para a premiação e era o maior alvoroço quando cada medalha envolvia um pescoço; era muita emoção.
Eis que então a nossa rainha notou uma coisa estranha... onde estava aquela negrinha que é joga muita bola e também cheia de manha, pois craque conhece craque, Nina é boa na "meiuca" e mais ainda no ataque.
Saiu correndo daqui pra não perder a condução. a Nina não é do Rosário, e o ônibus tinha horário, pois viera do "Irmão Dulce", da comunidade Sant'Ana, a favela que já citamos, à beira da "Suburbana". E a mesma Marta sabia que aquela realidade não era um conto-de-fadas e que no meio dessa jornada, ela a encontraria...em majestosos momentos, nos maiores monumentos deste esporte bretão, e quem sabe Nina até jogaria na nossa Seleção; a nossa Marta sabia, que mais dia, menos dia, elas se encontrarão.