Maria cantarolava a música de Nelson Gonçalves: - "Fica comigo esta noite. E não te arrependerás... Lá fora o frio é um açoite; Calor aqui tu terás."  Maria trabalhava há mais de duas décadas para família Fleury. Não era apenas uma empregada, era considerada como parte da família. Apesar de ter todos seus direitos trabalhistas respeitados. A família Fleury era composta por Mercedes, a matriarca, viúva e austera e seus três filhos: Renato, Leonardo e Carlos. Quem tinha o pior temperamento era Carlos, o caçula. Mercedes se empenhara em dar boa educação e cultura... Mas, saber lidar com o caçula não era mesmo possível. Carlos tinha crises de ira quando era contrariado. Com a viuvez e solidão e, ainda, a senectude,  Mercedes foi perdendo a força de lidar com as intempéries familiares. Renato casou-se foi morar na Califórnia, nos EUA. Leonardo, também casou-se, e foi morar no interior do Mato Grosso, tornando-se um fazendeiro de sucesso. Carlos, no entanto, formou-se em medicina, era clínico geral. Mas, era infeliz com a escolha profissional. Era médico das áreas públicas e não lidava bem com os graves problemas sociais que a saúde brasileira enfrenta. Na época da Covid-19 estava furioso e, dizia que tudo era creditado ao coronavírus. Mercedes estava cansada do humor do filho e, então sugeriu que ele tivesse sua própria casa para ter ampla autoridade.  Maria, assistia todos os dias, o embate entre Mercedes e o filho. E, por vezes, Carlos também se destemperava com Maria. Detalhe: Carlos jamais casara, namorava apenas e, trocava de namorada como quem troca de roupas... enfim, era infeliz no amor e na profissão... seria mais um miserável se Tolstoi ressuscitasse. Carlos sofrera porque Mercedes não ofereceu o mesmo tratamento de seus dois outros irmãos... ela fora permissiva e desleixada. Resultado: Carlos era um imbróglio mal embrulhado. Maria continuava a cantarolar... E, Carlos que iria para mais um plantão: perguntou: - por que você insiste nessa música brega? E, Maria respondeu: - quem canta, seus males espanta... Xô...