Estilhaços de uma vida
A máscara finalmente cai. Porcelana fina colide com o solo e se espalha em supernova de cintilantes fragmentos irregulares. Um rosto suado e marcado pelo tempo passado sob o disfarce é revelado. Um rosto que até o espelho tinha esquecido. Fatigado e amassado, com olhos trepidantes, ele olha para o chão e se enche de rubor. Vergonha. Ódio. Depressão. Choro. O rugido sai cru por entre cordas vocais desorientadas e uma boca ensopada. Lágrimas abandonam olhos naufragados tentando se agarrar aos cílios, mas caem em vão sob o pó branco no chão. Os músculos da barriga se contraem e as mãos trêmulas amparam o rosto torto. As mãos sentem o suor que nelas se mistura com as lágrimas. Os dedos dobram-se sobre os olhos fechados – tentando em vão impedir que as lágrimas fujam – e seus nós apertam-se contra as pálpebras. Em meio a fungadas viscerais e soluços entrecortados, explodem formas indefinidas de cores brilhantes em meio à escuridão do lado de dentro das pálpebras. A força da mão cria a cor que ilumina a escuridão pelo preço justo da dor. A alma se sacode dentro da Dama de Ferro que é o corpo. Sente cada espinho adentrando o seu cerne e grita. Fala pro mundo real que sente dor, mas não é ouvida por ninguém, a não ser por seu carrasco. As pernas cedem de súbito e o corpo vai ao chão.
No estrondo surdo também calam os gritos guturais. Fungadas e soluços ainda estão lá, intermitentes. As mãos afrouxam o cerco e as cores ficam um pouco mais fracas. Em um mesmo movimento, ambas as mãos se viram e sua parte de trás espalha as lágrimas pelo rosto. As pálpebras se erguem e duas bolas encharcadas se revelam, avermelhadas. Esquadrinham os estilhaços no chão. O homem sentado é apenas mais um deles. Caiu junto com sua máscara e no chão faz companhia a outros restos sem vida.
Sou eu. Posto onde mereço estar.