LEMBRANÇAS
LEMBRANÇAS (14/02/2024)
“Tu disseste que meus olhos
Eram dois sois
Tu disseste que minha alma
Era um hino para o amor...
Na minha longínqua infância, pai, tu me fazias dormir embalando-me em teus braços. Então cantavas: não uma meiga canção de ninar, entoavas um hino de amor, dizendo de recordações, saudades, anseios e suplicas de renovação. Ao canta-la tantas vezes, sem saber, a mim transmitistes o avesso da canção: que se busque no amor o prazer, e não a entrega; assim como do vinho se aprecie o sabor, não a embriaguez.
Muito mais tarde, tornaste-te meu mestre mais atento, ensinando-me a arte de escandir versos; trouxeste-os à minha leitura e por eles compreendi que a poesia mais sofrida e comovente inspira as melhores rimas.
Quando, descuidada, entreguei-me ao prazer de ser amada, não sabia que provaria o sal do amor sofrido, contrariado, efervescente, que pude exprimir em versos e canções.
Pai, me terias transmitido o dom de ensinar? Sinto-o inconscientemente, mas onde a tua firmeza, dedicação, mestria? Não os tenho, eu sei.