Vivendo numa troca de olhar

Uma tarde fresca, mesmo no outono escaldante do Rio, tudo pode ser um convite. O único problema é quando ele não é explícito. Nossa mente vagueia, nossas expectativas se elevam e nenhum passo é dado, travando assim, a melhor das interações.

Lá estava eu sentado a mesa, numa aconchegante cafeteria, no centro do bairro, degustando sem pressa o meu cappuccino de avelã, talvez ainda mais gostoso pelo creme se Nutella.

Me permiti olhar pelo lugar e quando fui de encontro a porta, ela entrou, acompanhada de duas amigas, com notebooks e cadernos nas mãos, como se estivessem atrasadas para uma reunião. Ao passarem todas pelos umbrais, se endereçaram a mesa a minha frente e após pousarem seus pertences na mesa, quando de repente, ela caminhou em minha direção. Não entendi bem o motivo, até que sorriu ao me olhar nos olhos e agachar perto da minha perna, mas sem desviar o contato visual.

Me permiti mergulhar no verde daqueles olhos.

Seus lábios bem desenhados, e bochechas fartas e um cabelo cheio e levemente ondulado, me hipnotizava, como se eu estivesse vendo um anjo.

Seria um pleonasmo muito errado, pensar e desejar que aquele anjo agachando, ser um dos anjos caídos?

Ela pegou a caneta que havia caído e rolado para perto da minha cadeira. Como não havia dado atenção antes, foi inevitável não percebê-la entre minhas pernas agachada.

Bem ali, em público, completamente despreocupadamente, aparentemente ingênua e deliciosamente devassa. As amigas não viram e tão pouco as pessoas das mesas vizinhas. Mas ela fez questão que eu visse.

Suas pupilas dilatadas, aqueles óculos redondos ampliando seu ar meigo e fofo, enquanto a mordida suave nos lábios inferiores, mantendo o sorriso, me fez pulsar, de tal forma, que ganhou forma crescente pela minha calça.

Ela olhou pra baixo, confirmando seu efeito e poder sobre mim, tornou a me encarar e deixou uma piscadela, antes de se levantar e voltar a mesa.

Eu não sabia ao certo o que havia acontecido ali.

Meu corpo estava em chamas por aquela estranha. Eu estava adorando a provocação que ela havia me feito, eu adorei me sentir nas mãos dela e ali, sem trocarmos uma só palavra, seguimos nos encarando.

E enquanto tudo acontecia, Sinatra cantava no auto falante, todos conversavam, os garçons serviam e meu café esfriava, eu morava em seus olhos. Desejei seus beijos da forma mais intensa possível, sem qualquer pudor. Quis seus lábios dançando em meus dedos, enquanto me saboreava. Desejei sentir o seu sabor, admirando o rubor de sua face, com a respiração ofegante ao sentir meu toque massageando seu corpo, seu ego, seu prazer.

Pude senti-la tater livremente, sorrindo ao sentir o calor pulsando e gotejando. Como quem não deixa a calda escorrer muito pela casquinha e a resgata com a língua. Pra completar, fazendo tudo isso sem desviar o olhar. Sentindo cada linha, cada relevo, e tornando a se deliciar.