Caso perdido
As consultas não eram tão frequentes, mas para ele, eram o suficiente para lidar com a morte da amada. Morte que lhe tinha sorrido há tempos, de forma sombria e imposta, como a presença de um perseguidor, que finalmente se coloca ombro a ombro com a pessoa perseguida.
Naquela manhã, o psicólogo ouviu mais uma vez suas queixas. Ele tinha ainda dificuldades de lidar com a perda, e principalmente em realizar sozinho as tarefas domésticas. O apartamento tornara-se escuro e cada vez mais sufocante. Já são três anos, disse o profissional. Sem efeito. Que importava? Como de costume, ao retornar, o homem regou a orquídea preferida dela, que era de plástico, tinta e melancolia. Dobrou cuidadosamente algumas roupas da amada, recém-chegadas da lavanderia, enquanto ela, debruçada na janela, lhe sussurrava negras ordens que ele era incapaz de ignorar, assim como suas gargalhadas, que todas as manhãs ecoavam no portão.