DENGO (BVIW)

Diante do imponente Hyundai HB20 estacionado na garagem, Karim não pôde evitar os olhos marejados. Ali estava, em belíssimo vermelho perolizado, o seu Dengo — nome há muito escolhido para quando ele chegasse. Abriu a porta do motorista, regulou a poltrona macia, ainda envolta em plástico; experimentou o conforto do cinto. Correu os vidros, examinou o sistema de som, de ar condicionado, o painel ultramoderno, checou todos os botões. Tudo perfeito.

A moça fechou os olhos, aspirou o cheirinho de carro novo. Em voz alta, agradeceu aos céus: adeus pedidos de carona, adeus favores para voltar do trabalho, das festas, no meio da madrugada. Olhou-se no retrovisor. O espelho mostrava uma mulher radiante. E não era para menos. Só ela sabia do sacrifício para ter aos pés aquela máquina sobre quatro rodas brilhando de tão novas. Havia abdicado de muita coisa — quase cinquenta por cento do que ganhava com as aulas de Inglês — para alimentar mensalmente a conta de poupança. Mas agora tudo iria mudar. Poderia ir para o trabalho sem medo de sol ou chuva, planejar viagens com as amigas, aproveitar ao máximo aquele luxo todo seu.

Às onze da manhã, ao fim das aulas, Karim dirigiu-se à área de estacionamento do colégio. Olhos sobre o Hyundai, ela teve um estremecimento: a pintura vermelho Chilli estava completamente coberta por uma espessa camada de poeira, trazida por algum redemoinho vingador que por ali passara. Em completo desconcerto, Karim deslizou a ponta dos dedos pelo capô e, sem hesitar, decretou:

— Meu Dengo, a partir de amanhã você fica na garagem.