Mariana
A Mariana sempre se sentiu fora do mundo em que vivia.
Ela assistia a vida como uma espectadora e chorava em frente ao espelho.
Era muito amada pela família, composta por pai, mãe e uma irmã mais nova.
A situação financeira familiar era ótima e usufruíam do bom e do melhor.
A família passava férias na casa da praia ou no sítio em Gramado.
No entanto, Mariana elaborava planos para desaparecer do mundo.
Um lugar que, segundo ela, não lhe pertencia.
Ainda menina, imaginava-se com uma corda no pescoço dando adeus à vida.
Já adolescente, pensava em se atirar nas águas do rio Tramandaí.
Porém, apesar dos planos mirabolantes ela pensava no sofrimento dos pais.
Assim, Mariana adiou o projeto suicida e esperou o passamento dos pais.
Então, a irmã casou e teve um filho. Mariana viu que a hora havia chegado.
Certa noite ela elaborou uma carta de despedida para a irmã.
O plano da Mariana era se jogar da plataforma de pesca de Cidreira.
Desistiu, pois soube que a área estava interditada para reformas.
Pensou em invadir um dos faróis ao longo da costa do litoral Sul.
Nova desistência. Ela teria problemas com os faroleiros e com a polícia.
É, para Mariana só sobraram as furnas de Torres e o mar.
E lá se foi ela de ônibus, com uns trocados no bolso, sem lenço e sem documento.
Já noitinha, escolheu a trilha das pedras escorregadias e se preparou para pular.
Foi quando ouviu uma voz pigarreando bem alto.
Não, não vou me virar – pensou Mariana.
Vá em frente, porém, antes me deixe filmar – falou uma voz misteriosa.
Encontre outro lugar a praia é grande.
Não seja egoísta compartilhe o momento.
Compartilhar? É justamente o que eu não quero. Este momento é só meu.
Egoísmo. Este é o teu problema. Garota mimada.
Mariana sentou-se na trilha, tendo o rapaz ao seu lado com uma câmera a tiracolo.
Foi preciso um tempão de silêncio, então a conversa evoluiu.
Começou com um papo bem bobinho sobre as belezas de Torres.
Falaram sobre os filósofos, chimarrão, churrasco, futebol e coisas da infância.
O Pedro era um andarilho, que corria mundo filmando e vendendo seu trabalho.
Quando o faturamento era bom se hospedava em hotéis baratos ou pensões.
Se não faturava, lavava pratos em restaurantes para sobreviver.
Dormia ao relento, fazia higiene em postos de gasolina ou pontos de caminhoneiros.
Ele mostrou um book dos lugares, que havia percorrido e ela ficou fascinada.
Então, ele a convidou para viajar com ele para a Patagônia.
De pronto a Mariana se esqueceu do suicídio e aceitou sem pestanejar.
Tem um senão... Não tenho documentos.
Tenho um amigo no centro de Porto Alegre... vai escolhendo o teu novo nome.
Bem, aos adeptos do final feliz já aviso, que a história não foi bem assim.
Na viagem pra Porto Alegre a Mariana pegou o Pedro em mentiras.
O que a fez elaborar rapidamente um novo projeto de vida.
Ao chegarem à rodoviária ela deixou o rapaz dormindo no ônibus.
Surrupiou a câmera, que não era do Pedro, pois ele havia surrupiado de alguém.
Ela obteve uns trocados lavando pratos e conseguiu documentos com o falsificador.
No ato seguinte embarcou num ônibus rumo à fronteira da Argentina.
Lá chegando, vendeu a câmera e começou uma viagem pela Patagônia.
Fluente na língua inglesa virou guia turístico e morou num acampamento.
Publicou suas memórias, garantindo sustento e almejou alçar maiores voos.
Ajudada pela irmã ela se lançou pelo mundo como aventureira e mochileira.
Mariana driblou seus medos e esqueceu as ideias de morte.
Assim, ela aceitou, enfim, o mundo no qual ela pretende viver por muitos anos.
Aposto que, por este final ninguém esperava...