A DAMA DOS CÉUS (BVIW)
Diante da penteadeira, Val pintava os olhos com movimentos precisos. Os traços bem feitos realçavam os cantos das pálpebras, dando-lhe um ar misterioso: Dario gostava de vê-la assim bem maquiada. Levantou-se. Foi até a janela. Olhou o céu de um azul fechado, onde a lua boiava sangrenta. O vento frio que vinha da orla, soprou levemente seu cabelo fino e bem tratado. Um arrepio percorreu-a de alto a baixo. Sentia de modo quase palpável o afago dos raios lunares a acariciar-lhe a pele morena. Nunca soube explicar as sensações que a dama dos céus lhe provocava, mas sabia que era muito mais valente em noites assim: coisas da Lua.
Depois do ritual contemplativo, Val retornou ao espelho. Alisou delicadamente o vestido vermelho em renda Viena. Deslizou os dedos pelas linhas harmoniosas do rosto ovalado, sorriu um riso leve de canto de boca. Dali a pouco, Dario tocaria a campainha. Comeriam a massa que dourava no forno, beberiam uma taça de vinho. Às dez, depois de um filme romântico no sofá, o noivo se despediria com o beijo apaixonado, mas pueril, de sempre. Quando a porta se fechasse atrás dele, ela então seria Jade. Sob a força da Lua, a moça de vermelho seguiria para mais uma noite de labor no calçadão da Avenida Atlântica.
Tema da semana: Coisas da lua (conto)