O tigre das montanhas (Cap. 1)
O TIGRE DAS MONTANHAS
Capítulo 1 – O livro das Eras
Há muito tempo atrás, quando o homem ainda acreditava em magia, existia no mundo portais, passagens entre o mundo real e o mundo da fantasia. Neste outro mundo o imaginável é possível, os sentimentos têm poder e os seres são os mais misteriosos, curiosos e fantásticos.
Antigamente muitos conseguiam passar para o outro lado do portal , sabiam procurar os portais nos lugares certos, ou era pura sorte mesmo. Mas poucos retornaram de lá ou por que preferiam ficar ou por que não conseguiam mais voltar. Mas os poucos que regressavam traziam consigo estórias fantásticas de lutas, glória, pesar e amor.
As crianças sabem sobre esse mundo, sua imaginação e seu “acreditar no impossível” chega a criar portais. Mas a sua falta de coragem, ou melhor, seu medo do desconhecido não as deixa cruzar.
Essa história é de um jovem garoto sonhador, ou nem tão jovem assim. Davis era um garoto de 16 anos, destemido e corajoso, de cabelos castanhos que batiam na altura dos ombros, olhos verdes e pele clara. Sem querer me precipitar muito vamos voltar um pouco no tempo, vamos fazer uma viagem para o sul de Rivergard.
Rivengard era uma cidade cercada por rios e cachoeiras, tinha uma vegetação arbórea bonita com árvores que podiam chegar a 30 metros de altura, inclusive espécies raras existentes apenas naquela região do continente como a Deodara dourada, com folhas que parecem tomar a tonalidade de dourado quando se aproxima o final da tarde.
Davis era um jovem naquela época tinha ido para a cidade morar com sua tia-avó Nairalzaurak, a quem chamava de Nair. Nunca a viu antes de ir morar com ela após a morte de seus pais. Sua tia-avó era uma senhora um pouco desorganizada, nada ficava arrumado por muito tempo, e as coisas viviam mudando de lugar constantemente por que ela nunca sabia qual era o melhor lugar para botar as coisas, se a xícara ficava melhor dentro do armário da sala ou dentro do escritório servindo como escorar de livros, por exemplos.
É claro que sua tia-avó não deixava de explorar o jovem Davis, tão logo ele aparecia na sua frente já arrumava mil coisas para ele fazer. E era assim a mais de um ano. Entretanto uma coisa que Davis não sabia era que aquele momento com sua tia-avó era só temporário, que sua vida ia mudar radicalmente. Mas não vou mais me precipitar. Por hora vou embora, vamos deixar essa história caminhar com suas próprias pernas e não contada por uma velha maga.
***
Já estava chegando o inverno e ele não tinha coletado nem metade da lenha que iam precisar para o próximo mês. Tinha que se apresar terminar de arrumar a sala para depois ir coletar lenha na mata.
- Meu filho, não esqueça de limpar bem os pratos, outro dia mal consegui ver meu reflexo nele. – Falou Nairalzaurak, e antes de partir para o quarto comentou – E se der, por favor limpe as estantes do escritório, tudo bem?
Davis nada falou. Aprendeu que era melhor não discutir com sua tia, ela já estava muito velha para discussões. Tentou limpar rapidamente os pratos para ir logo para o escritório limpar as estantes e ainda tinha que coletar lenha e isso antes de anoitecer. “Vou ter um tarde bem agitada”, pensou.
Esfregou bem o último prato e em seguida olho-o para ver se podia ver bem seu reflexo, não queria mais escutar ironias. “Só eu faço as coisas nessa casa bem que a Tia Nair podia pegar um pano e limpar as mesas” resmungava baixinho no caminho do escritório.
Acendeu a lamparina, pela janela já podia ver que o sol estava se pondo e não ia dar tempo dele coletar lenha. Pegou o pano e começou a sexta ou sétima atividade do dia. Estava de férias e isso sempre estava em atividade. Quando tinha aula pelo menos tinha a desculpa de que tinha que tirar um tempo para estudar e ele fazia menos atividades por que, apesar de todos os defeitos de suas tia-avó, ela sempre dizia que o estudo é a salvação do homem. Ela nunca estudou e por isso achava que nunca teve maridos, filhos e uma vida melhor.
As estantes de madeira do século XVII eram cheios de ornamentos, frestas e buracos e sua tia quando ia inspecionar olhava um por um para ver se estavam todos limpos. Ele toda via ficava com raiva do inventor da estante, “bem que ele podia ter feito uma estante só com uma tábua de cada lado, prateleiras e os pés, seria bem mais prático” pensou.
Começo a limpa-las e enquanto ia passando pela segunda prateleira viu um livro que lhe chamou atenção, era tão antigo quanto os demais, mas não parecia está desgastado. Com cuidado o retirou da estante, na capa de fundo azul claro via-se um estranho relógio animais estavam no lugar de números e sete esferas estavam em relevo formando um círculo menor um pouco a baixo dos números, dois ponteiros, que partiam do centro de outro desenho, algo parecido com um mundo, mas com os continentes bem diferentes do que ele conhecia. Tais ponteiros apontavam para os animais e o outro para as esferas. Todos os desenhos emanavam um brilho prateado, inclusive os círculos que delineava as esferas, até pareciam ser feitos de Prata, E no alto da capa lia-se em letras cor de prata:
OS MUNDOS ESCONDIDOS
Curioso ele abriu, mas espantou-se ao ver que o livro estava todo em branco. “Por que alguém guardaria um livro que está todo em branco” pensou. E então ele viu algo ainda mais estranho o ponteiro dos animais girou e apontou para o Cisne e o ponteiro das esferas apontou para uma pedra branca que estava exatamente acima do globo. E então repentinamente o livro se abriu. E das páginas em branco começou a surgir letras que logo ele pôde ler.
“Estava esperando por você jovem Davis”
Assustado ele jogou o livro na mesa, mas ele não fechou ficou aberto na página em que as letras pareciam falar com ele. Com seu coração batendo forte ele se se encostou à estante empoeirada como se quisesse fugir dali ou se esconder. Passados alguns minutos ele se aproximou do livro cujas letras estavam formando uma nova frase.
“O assustei jovem Davis?”
- Mas como, como você faz isso, o que é você? – quis saber.
E novas letras formavam-se no livro como a responder a nova pergunta.
“Eu me chamo Bucharen, ou livro das eras, eu sou o narrador das histórias sobre os mundos escondidos, as demais coisas você saberá quando chegar a hora”
- Que coisas e que hora é essa? – Perguntou, mas não houve resposta, em vez disso o livro se fechou novamente exibindo aquele estranho relógio na capa que agora não apontava para nada, nem para um dos animais nem para nenhuma das sete pedras.
Davis continuou a limpar a estante, mas sua atenção estava voltada para o livro de capa azul. Limpou tantas vezes aquela estante e nunca tinha reparado nesse livro. Mas se o livro não pode andar como ele chegou até ali? Pensava constantemente. Como sua tia-avó conseguiu aquele livro?
- Limpou tudo direitinho? – Gritou sua Tia-avó do seu quarto, quando o viu sair finalmente do escritório. – Não é pra ter nada sujo naquela estante viu? Vou já ver se limpou bem, mas antes me ajude em sair da cama sim?
Ele foi até o quarto extremamente bagunçado de sua tia. Meias estavam penduradas no armador, roupas espalhadas ao lado da cama, no criado mudo havia um velho óculos que nem servia mais, uma porção de comprimidos estava no pé da cama e em um velho birô vários papéis, inclusive, mapas estavam amassados e espalhados.
-Venha logo. – Gritou a sua tia – Preciso ver se voe limpou tudo direito. A comida da Kiara já foi posta?
Kiara era a gata que ela tinha, a muitos anos, ele sempre se perguntava quando ela ia morrer de tão velha que era. E não botar comida para a gata antes de se deitar era pedir para trabalhar em dobro no dia seguinte.
- Sim eu coloquei, antes mesmo de lavar os pratos. – falou enquanto ajudava a sua tia a se levantar.
- Então faz muito tempo – comentou a velha já em pé – vá colocar comida para a gata e depois prepare alguma coisa para jantar, vou ver como ficou a sua limpeza nop escritório.
De cabeça baixa ele saiu do quarto, mas ao passar pelo corredor não se conteve e olhou para a estante, para o lugar onde o livro de capa azul estava. Só pôde pegar nele de novo, antes de dormir, depois de ter posto a comida para a gata e ter feito a janta para os dois e de sua tia ter ido dormir dando as recomendações do que ele teria de fazer na manhã seguinte.
- Bucharen, você pode falar comigo? – falou ele baixinho deitado na sua cama.
Os ponteiros na capa do livro novamente foram levados ao cisne e a pedra branca e então abriu em uma página em branco.
“O que você deseja de mim jovem Davis?” – surgiu segundos depois.
- Eu gostaria que você me contasse uma das histórias dos mundos escondidos.
“Os mundos escondidos, então é isso? São muitas as histórias dos mundos escondidos, muitas ainda nem acabaram, outras nem começaram, mas ainda vão acontecer.”
Davis lia as linhas rapidamente, com uma intensa curiosidade, e esperando que de repente o livro se abrisse em outra parte e uma longa história surgisse de suas páginas em branco. Mas isso não aconteceu.
“Quando chegar o momento de contar uma das muitas histórias que estão escritas em mim, eu a mostro para você. Por hora eu tenho outras coisas para contar.”
O que seria mais importante do que uma boa história, pensou Davis, mas na mesma hora surgiu no livro.
“Muitas coisas são mais importantes do que uma boa história”
- Você sabe ler pensamentos – Falou
“Sim e não. Eu leio os corações, e muitas vezes o coração fala antes mesmo do pensamento. O que não significa que eu não saiba o que as pessoas estão pensando. Mas voltando ao assunto, o que eu vou lhe contar é muito importante para o que virá.”
Ele virou a página e continuou.
“Jovem Davis, em poucos dias você vai ficar livre de seu cárcere, neste dia siga para o norte, e vá para a região de Plumargento suba as serras e lá em cima você encontrará um rio circular, atravessá-lo será seu primeiro grande desafio, me leve junto, embora eu não poderei lhe ajudar a atravessar. Quero que você tome cuidado no caminho, ele será mais longo do que você pensa e outros pequenos desafios surgirão.”
Davis não percebeu, mas quando o livro se fechou naquela noite o ponteiro das esferas estava apontando para uma pedra vermelha, o Rubi como ele viria a saber noites depois.
Os dias passavam e Davis continuava em seus afazeres domésticos, limpar o jardim, os móveis, varrer a casa, fazer a comida, arrumar lenha, colocar comida para a gata Kiara, entre outras invenções que sua tia-avó peia para ele fazer só para não deixa-lo parado como limpar as luzes do lustres da sala e esfregar o interior dos armários com uma escova de dente, “isto vai lhe ajuda-lo, vai ser ótimo para tirar a poeira incrustada” falou sua tia no momento que lhe entregou a escova. O grande problema era que ele mal arrumava uma parte da casa e sua tia-avó logo desarrumava, dessa forma ele não tinha sossego nunca. Mas ultimamente ele tinha ido dormir feliz com o pouco que lia de Bucharen antes de Dormir.
Certo noite Bucharen comentou sobre o significado de sua capa.
“... e isso, jovem Davis, vai ser importante você saber para os acontecimentos que estão por vir, não é necessário você me abrir toda vez que quiser saber alguma coisa de mim. O que eu vou lhe contar é muito importante, veja os animais que estão na capa.”
Davis olhou para a capa e a luz da lamparina viu os doze animais que estava acostumado a ver: o coiote, a lontra, a cachorro, a águia, o leão, a salamandra, o cisne, o cavalo, a baleia, o elefante, o morcego e a coruja.
“Todos tem seu significado e aparecerão para você na hora certa. Agora as pedras. Em vermelho, está um poderosos rubi que aumenta a força e auxilia na proteção além de poder dar vislumbres de futuro. A amarela é o citrino que dá confiança e segurança. Sua energia ajuda a identificar poderes escondidos e por assemelhar-se ao sol aquece e da a vida a objetos inanimados. Amplia o pensamento, pode ser usado na meditação para rejuvenescer o físico e eliminar formas tóxicas de pensamentos. É ótimo para problemas fisiológicos. A pedra verde é uma pedra de Jade que atrai a força e abre caminho para vidas passadas. É associado a coragem, e sabedoria. A pedra escura é o ônix, aumenta a concentração e inspiração é útil para resolver problemas difíceis e ajuda na cicatrização. A azul é a Safira, clareia a mente e favorece a cura contra venenos. Por último as duas pedras brancas, a que está mais acima é o poderoso diamante que acelera o raciocínio e bloqueia más energias. Reflete os aspectos divinos de vontade e poder. Aumenta a força física e dá coragem. O Diamante intensifica a energia de outras pedras, promove a clareza do pensamento. E por último a Kunzita, ela atualmente está branca mas nem sempre fica dessa cor, ela absorve as energias ao seu redor e quando escurece significa que o mal está próximo e quando branco significa que está tudo bem”
O texto parou. Por um momento Davis achou que o livro iria se fechar, mas então ele virou a página e continuou.
“Haverá um momento em que essas pedras não terão poder, todas ficarão cinzas e para você poder cumprir a sua missão terá que achar o animal místico de cada pedra para faze-las a ter seu poder novamente, é tarefa sua no futuro acha-los. Para isso você precisará da ajuda dos animais da capa quando eu já tiver ido.”
- Como assim? Você vai me deixar fazer tudo só? – Perguntou Davis.
“Não poderei ajudá-lo para sempre” surgiu nas páginas amarelas do livro. “Muitos desafiam o esperam, mas você nunca estará só. Eu sou um livro muito mais velho do que você pode imaginar, sinto que minha hora está próxima jovem Davis.”
Davis não acreditava que aquele livro tão sábio e cheio de histórias em enigmas pudesse está falando a verdade, mas sabia que estava, ele nunca mentia, sabia que ele iria partir. Ele foi seu amigo nos últimos dias, amigo que nunca teve dede que viera morar na casa de sua tia-avó Nairalzaurak.
“Mas isso vaio demorar um pouco, você ainda vai precisar muito de mim” logo surgiu nas páginas do livro como uma resposta ao sentimento de tristeza que o garoto estava sentido. “Vá dormir, jovem Davis, amanhã nós conversaremos mais.”
Davis colocou o livro debaixo do seu travesseiro como já era de costume, e se deitou. Acordou cedo no outro dia, o sol ainda nem tinha aparecido no horizonte, pegou o livro e foi colocar na estante do escritório antes que sua tia-avó acordasse e sentisse a falta de um livro na prateleira. Mal saiu da cama e ele notou que os ponteiros estavam apontando para o cachorro e para uma pedra cinza. “Não havia pedra cinza na noite anterior” ele pensou e as letras no livro vieram a sua mente
“Kunzita... absorve as energias ao seu redor e quando escurece significa que o mal está próximo”
Que mal era aquele naquela manhã, tudo parecia normal. Por precaução, não guardou o livro na estante naquela manhã, “Vou esperar um pouco e quando minha Tia não estiver olhando eu ponho o livro na prateleira” pensou. Esquentou o café e fritou as torradas, aprontou a mesa. Foi no quarto acordar sua tia, que estranhamente ainda não havia levantado.
- Tia Nair – chamou batendo a porta do quarto. – Tia Nair, a senhora já está acordada. – Não houve resposta. Então chamou pela terceira vez.
Girou a maçaneta e viu a sua tia deitada, imóvel, parecia não ouvir ele chamando. Chegou mais perto, e batendo no ombro tentou acorda-la mais uma vez.
-Tia Nair o café está na mesa.
Seu ombro estava gelado, ela estava mais branca do que o normal e não se mexia. Ele, então, colocou seus dedos sobre o pescoço dela e não sentiu pulsação. Sua Tia estava Morta.
“...em poucos dias você vai ficar livre de seu cárcere...”
Ele sabia disso também. Como poderia saber que sua tia iria morrer. Um vento forte entrou pela janela levantou os lençóis que cobriam a defunta e então ele viu algo se mexer dentro do ventre de sua tia-avó. Três elevações eram visíveis, o que seria aquilo? Mas ele não esperou para ver o resultado. Foi ao seu quarto e rapidamente jogou algumas coisas dentro da sua velha mochila que usava para carregar seus livros, pegou as torradas que havia feito e mais algumas coisas dentro da despensa e saiu para a manhã fria de Rivengard no mesmo momento em que escutou um barulho estranho vindo do fundo da casa de sua tia-avó.