A longa espera
Que belo sofá...
Pensou Clayton ajeitando-se sobre o estofado de couro, que ao movimento de seu corpo fazia barulhos peculiares de couro sintético em atrito com a calça de poliéster, ou será que seria de algodão a calça e o sofá de couro natural?
Em um movimento impaciente, remexeu o lado interno do passa-cinto à procura de uma etiqueta que confirmasse sua teoria, mas não encontrou.
– Deve estar no cós da calça mesmo. Murmurou consigo. Então arranhou o estofado do sofá na esperança de ver uma de suas teorias comprovadas. E numa contração dos músculos do rosto armou uma carranca e num gesto de inconformismo volveu novamente o passa-cinto procurando a etiqueta da calça. Após seu lapso frenético alinhou o passa-cinto da calça e suspirou.
- Deve estar no cós da calça mesmo. Suspirou novamente e apoiou o queixo com as mãos, largando o peso do ombro sobre o peito e sua cabeça sustentada sobre as mãos apoiadas no queixo, que por sua vez, tinham de suporte os cotovelos nos joelhos. Ficou assim um instante.
- Mas o cós da calça é só a parte de trás ou será que é toda essa parte que rodeia a cintura? Mas então o que é passa-cinto?
Ajeitou-se mais uma vez no sofá, que produziu o mesmo som que havia suscitado tantas questões.
- Ainda bem que estou sozinho aqui, esse barulho é meio estranho. Disse Clayton esboçando um sorriso com o canto da boca, enquanto imaginava o quão constrangedora aquela cena poderia se tornar caso fosse mal interpretada.
Olhou à sua volta e perdeu-se em seus pensamentos, quando voltou a si, começou a analisar aquela sala. Parecia bem maior do que era realmente. Cruzou os braços sobre a barriga em gesto involuntário de auto-abraço. Sentiu-se só, apertou um pouco mais seu abraço e olhou minuciosamente os cantos da sala.
Era uma sala de espera. Pensou em todas as salas de espera que havia estado durante sua vida, nenhuma era igual a essa, sempre havia pessoas conversando, umas em tom de sussurro escondendo seus assuntos íntimos dos outros, outras porém aproveitavam o momento social para expor sua vida, muitas vezes a pessoas que haviam conhecido na própria sala de espera.
Num lamento Clayton falou com a vez trêmula carregada de pensamentos: - Todo mundo precisa de alguém para conversar...
Olhou para o centro da sala, havia uma mesa com algumas revistas...
- Que coisa... uma mesinha de centro, no centro da sala, se a colocassem no canto, ela já não saberia mais quem é. E riu de sua piada olhando em volta. Percebeu mais uma vez que estava sozinho, murchou o sorriso e escondeu os dentes.
Sentiu-se só novamente e quis estar acompanhado naquela espera, que a esta altura, parecia interminável.
Pensou em sua família e em todos os amigos que tinha. Durante toda sua vida apoiou muita gente e também sempre foi apoiado por todos. Minha esposa que tanto amo, meus filhos...
- Puxa, o que estou fazendo aqui sozinho? Não agüento mais isso.
- Não, é melhor que seja assim, preciso estar sozinho nesse momento. Ninguém conseguiria me ajudar nisso.
- Mas não passa o tempo...
Começou a ouvir uma pancada, seqüenciada, uma batida... olhou para trás e para cima e viu um grande relógio com seus ponteiros em ritmo cadenciado.
- Nossa, não tinha visto isso aí.
Voltou-se para frente e percebeu que não teria mais paz, os ponteiros do relógio batiam em seus ouvidos como martelos em uma construção.
Quando já não agüentava mais, entra uma moça vestida de branco na sala.
- Sr. Clayton, pode entrar, o doutor o aguarda.
- Chegou mesmo a hora? pergunta Clayton com as mãos trêmulas.
- Sim, chegou a hora.
Clayton entra na sala, a porta se fecha atrás dele.
Lê-se na placa no alto da porta.
Dr. Ramon – Proctologista