Sacerdócio
Parei na porta e olhei para ela. Parecia menos velha vista de perto. Os olhos mantinham o brilho e irradiavam uma força desconcertante. Nada era opaco nela. Nem a cor indefinida dos cabelos. A passagem do tempo estava aprisionada em sua voz.
Entrei sem falar nada e fui recebido por seu silêncio e um sinal altivo de cabeça, ordenando-me a sentar. Agia assim com todos que ultrapassassem em um palmo a sua altura. Só os outros podiam ficar de pé.
Ainda calada, caminhou com passos rápidos e precisos, capazes de ludibriarem os mais desatentos, até uma mesa triangular abarrotada de caixinhas e livros. Voltou de lá com um papel enrolado.
Parou em minha frente e esticou o papel amarelado. Fiquei segurando, sem abrir, acorrentado por seu olhar.
— Guardei para você. – a voz desgastada e frágil denunciando sua idade. – Amanhã será o meu último dia. Comandará o ritual. Está preparado. Saberá como dirigir tudo daqui pra frente.
Falava assim, em frases curtas, como a preservar o pouco que ainda possuía de voz. Desenrolei o documento e o reconheci na primeira linha.
— Agora é seu. Faça como aí está. Todos os dias. Prepare a criança que nascer no equinócio de primavera. Fique atento. Receberá o aviso quando chegar a hora. Agora vá.
Mudo como entrei, saí. O rolo de papel pesando em minha mão. Era como se o segredo nele contido pesasse um quilo por cada dia que eu ainda viveria, até que me fosse revelada a contagem final.
Parei na porta e olhei para ela. Parecia menos velha vista de perto. Os olhos mantinham o brilho e irradiavam uma força desconcertante. Nada era opaco nela. Nem a cor indefinida dos cabelos. A passagem do tempo estava aprisionada em sua voz.
Entrei sem falar nada e fui recebido por seu silêncio e um sinal altivo de cabeça, ordenando-me a sentar. Agia assim com todos que ultrapassassem em um palmo a sua altura. Só os outros podiam ficar de pé.
Ainda calada, caminhou com passos rápidos e precisos, capazes de ludibriarem os mais desatentos, até uma mesa triangular abarrotada de caixinhas e livros. Voltou de lá com um papel enrolado.
Parou em minha frente e esticou o papel amarelado. Fiquei segurando, sem abrir, acorrentado por seu olhar.
— Guardei para você. – a voz desgastada e frágil denunciando sua idade. – Amanhã será o meu último dia. Comandará o ritual. Está preparado. Saberá como dirigir tudo daqui pra frente.
Falava assim, em frases curtas, como a preservar o pouco que ainda possuía de voz. Desenrolei o documento e o reconheci na primeira linha.
— Agora é seu. Faça como aí está. Todos os dias. Prepare a criança que nascer no equinócio de primavera. Fique atento. Receberá o aviso quando chegar a hora. Agora vá.
Mudo como entrei, saí. O rolo de papel pesando em minha mão. Era como se o segredo nele contido pesasse um quilo por cada dia que eu ainda viveria, até que me fosse revelada a contagem final.