O Casamento
Pedirei permissão para minha trovadora preferida e usarei sua pena para escrever a história da princesa que atravessou mares e oceanos em busca de seu amor. Infelizmente, nem todas as histórias de amor têm finais felizes.
A bordo do navio que partira de seu país natal rumo às terras brasileiras, a princesa Leopoldina contempla o céu que se pinta em uma sequência impossível de azul, violeta, laranja e escuridão — prenúncio da noite que se aproxima, pontilhada por pequenas luzes que se acendem timidamente até tornar-se toda a imensidão. A luz solar diminui aos poucos, como uma vela moribunda, tingindo o horizonte com as cores de uma fogueira que se distancia. Por um momento impossível, dia e noite dividem a mesma abóbada que maravilha a princesa e a convida à reflexão.
Ela se pergunta como fora parar ali. O que o destino lhe reserva? Será que seu prometido corresponderá ao seu amor? São tantas dúvidas e incertezas que seu coração chega a apertar no peito.
Em suas mãos, Leopoldina carrega o símbolo de seu amor — feito à mão um retrato de seu príncipe, seu amor idealizado.Em nome desse amor, Leopoldina enfrentou mares revoltos, monstros marinhos, piratas e assassinos.
Por toda a vida, a princesa se preparara para ser rainha: estudou artes, música, botânica, filosofia e política. Porém esse conhecimento não a preparou para essa aventura além-mar.
O medo de monstros marinhos em nada se compara ao medo de ser rejeitada por seu amor.
As constantes ameaças de piratas e assassinos não apagaram o receio de ser negada pelo príncipe que tão ricamente pintara em rimas e versos. Nem mesmo uma canção de amor poderia prepará-la para a decepção de um amor não correspondido.
Estudos diplomáticos não lhe deram a visão de como agir diante de seu objeto de desejo: Pedro.
Acerca desse nome, Leopoldina escrevera poemas e trovas de amor.
“Pedro’’, o nome em seus lábios se apresenta como o sabor do mais puro mel.
Leopoldina volta à realidade, por um breve segundo e novamente volta a sonhar, apertando firmemente o retrato do amado. Sonha com seu príncipe encantado, com bailes na corte e passeios por um jardim de flores com seu prometido garboso, gentil e amoroso.
A decepção
Todos os sonhos de Leopoldina sofrem um naufrágio, seu anseio por um príncipe encantado torna-se apenas a lembrança de um sonho. Sua esperança de amor fica ali mesmo, perdida no porto.
Leopoldina se depara com um príncipe grosseiro, mal educado, nada gentil e nem garboso. Pedro nada tinha de encantado.
Um casamento apenas de aparências, uma vida de sofrimentos, humilhações e desencantos.
O destino assim o quis e a princesa sofria em seus aposentos. Porém, a cada dia que Pedro lhe dirigia um sorriso, Leopoldina fantasiava que em um passe de mágica, seu esposo se transformaria no príncipe de seus sonhos, que seu amado do retrato finalmente a salvaria dessa vida de tormentos.
Desiludida? Jamais viveu de ilusões, e sim de esperança. Esperança de que ele aprenderia a amá-la, assim como ela sempre o amou. Promessa nenhuma a faria amá-lo mais.
Em silêncio, Leopoldina suplicava por um olhar que não vinha, um afago que não recebia, um beijo que não acontecia. Seria possível um amor conjugal de apenas um? Um dueto de dois corações onde apenas um bate e sangra a cada rejeição? Caminhar pela vida solitária ao seu lado?
Sim, Leopoldina seguiu na esperança de que Pedro preenchesse sua vida solitária, o leito conjugal e sua alma.
Tantos vazios para contabilizar, ermos dos quais cuidava com zelo na candura de seu amor, que os pertencia antes mesmo de lhe pedir. Sonhava acordada nessa mesma esperança, sofrendo a cada indiferença. Firme como o rio que molda a pedra, assim como corria para o seu mar, mesmo que ele não a percebesse fluir.
Amor impossível? Sempre foi. Porém impossível seria não o amar.
Nota
O casamento de D. Pedro e Leopoldina aconteceu por meio de uma procuração. Quem representou o noivo na cerimônia foi o arquiduque Carlos, duque de Tuschen e tio de Leopoldina. Foi somente quase seis meses depois que Leopoldina e d. Pedro conheceram-se pessoalmente.
Os últimos anos de Leopoldina foram marcados pelas decepções causadas pelo imperador. O casamento infeliz deixou-a em um estado de ânimo que alguns historiadores definem como compatível ao que consideramos atualmente como depressão isso é confirmado por vários relatos da época.
Além de depressiva, no final de 1826, a imperatriz estava grávida e sofreu um aborto espontâneo. Com a saúde fragilizada, seu quadro agravou-se e ela faleceu no dia 11 de dezembro de 1826, e alguns relatos sugerem que o aborto pode ter sido consequência das agressões de d. Pedro I.