Os Descobridores da Amazônia

Naquela manhã, o programa de disciplina da escola Santo Afonso atrasou, porque a professora Rosa, de educação física ainda não havia chegado.

Como manter na cela de um espaço irrequieto meninos, cuja alma curiosa e aventureira havia sido despertada pela paisagem proibida daquela mata, por detrás do muros.

Enquanto merendeiras e inspetoras se dividam a manter a boiada num espaço a temperatura fria.

Como cabeça vazia, é oficina do demônio. Eis que os garotos como Gel, Robertinho, Farias, e hoje, o padre Edimilson e mais alguns colegas fineses da época idealizaram passar o tempo jogando bola. E como não podia deixar de ser, alguém sugeriu o Coceirinha, campo que ficava atrás do colégio, no meio da mata.

Ainda cedo da manhã, os inspetores acordando para o trabalho, eles espertamente foram para lá.

Ali, Robertinho, Gel e Farias concorrendo com muitos outros resolveram explorar, opção não partilhada por Edmilson e alguns.

Donos de si, Gel, Robertinho e Farias seguiram imbuídos no ímpeto jovial comum desde pequenos, como os ancestrais portugueses, como Rondon e tantos outros, que descobriram um país pra nós.

Talvez a escola, senhora de tanta educação, subserviente dos ritos da ditadura tenha de fato perdido o tempo de fazer o tempo numa evolução, cujo foco seria, pra época, o despertar coordenadamente de uma consciência de preservação voltada ao futuro com a natureza. Forjando naquele momento uma revolução na cidade de Belém e quem sabe até, aquele resto de mata, ainda estivesse preservada e não ficasse só na saudade.

Mas o fato, que aqueles adolescentes, sob efeito de uma enérgia descontrolada, encontram um caminho de muitos, que por ali já haviam passado e adentraram a mata. Enquanto muitos sujavam suas fardas a brincar naquele campinho. Os três seguiram em busca do outro campo conhecido como Coceirão, apenas para saber onde era.

Embora o objetivo tivessem atingindo, a alma inquieta puxava e associada a curiosidade primária instigada, a ponto deles avançarem, avançarem e quanto mais iam, apesar da apreensão do desconhecido, o entusiasmo os aprisionava com a magnitude do natureza em volta.

Como astronautas na lua, eles não se rendiam e procuravam, sem saber direito o que encontrar, até que o ar da conquista começou a ficar rarefeito pelo medo vulgar. A novidade exposta, já não era maior que a apreensão de voltar, que Robertinho, fascinado não queria deixar, mesmo sob protesto dos outros companheiros, que resolveram se amotinar e não ir mais além, deixando apenas a abertura suficiente, pra quem é obstinado:

-Se queres ir lá vai correndo, que a gente te espera, mas não vai demorar.

E andando, andando, admirando, olhando como a registrar aquele mundo novo em volta, encontrou um outro caminho de acesso, que o levou ao prêmio da sua curiosidade. Foi o primeiro dos três a ali chegar e vislumbrar o portal pro mar.

As margens da baia do Guajará, como num túnel de outra dimensão, atônito assistia calado um barco à vela artesanal solitário a deslizar retilíneo ao seu destino.

O rio ali parafraseando, o ar solfejando e aquelas águas barrentas versando ritmadas pela brisa amazônica um certo poema, a encantar. Apaixonado por aquele lugar, já nutria a vontade, necessidade de voltar e como a se perder nas horas, sua demora sentida por seus colegas, os fez irem lá, pra se certificarem, que tudo estava tranquilo. Acontece, que ao chegarem lá, olhando aquele universo diferente, como um paraíso perdido se apresentando, também foram vencidos pelos argumentos sem nota.

Nos olhos simples daqueles garotos, um brilho, nascedouro de um valor, que alguns nunca tinham experimentado ou visto. A natureza em sua exuberância e eles como descobridores de um pedaço de tesouro, reconhecido como a Amazônia. Viram naquele instante o oscilar pueril, o bem estar e a harmonia homem natureza, começando naquele leve marulhar, que num segundo levava as ondas embora e as trazia de volta como que a valsar e a por para dançar as árvores da beira.

Sob o impacto, do efeito do olhar, como que a voar no colo pulsante da vida ao redor, eles envoltos naquela mística, ouviram longe alguém chamar, mas tomados pela magia do lugar, já não queriam mais ir embora.

Acontece, que lá fora, após o muro e as proibições, o diretor, Burunga, austero e a professora Rosa preocupada tomaram conhecimento, que muitos meninos estavam na mata e começaram a procurar.

Edmilson, que estava ainda no Coceirinha tomando conhecimento do fuzuê, fiel aos amigos os foi chamar, bradando tamanho alarido:

-Gente a professora acabou de chegar.

Ao longe confundido com variados sons, de pássaros e barcos, assovios entres as árvores os meninos quase não escutavam. No entanto, Farias foi mais audaz, sensato, do que sonhador e disse:

- Gente temos que voltar.

Como a galopar pelo meio daquele matagal, adormecido pelo orvalho da noite, num alvoroço, misturando medo e desejo de contar, ainda se pôde ouvir um pipilar solitário no vento, que mesmo sob ameaça, Robertinho não quis deixar passar e parou um instante pra ouvir e refinar. Era um canto, um canto tão penetrante a dizer, pra eles, que deveriam outro dia voltar.

Não havia córrego, não havia casa, só a parede de um esquecido e velho galpão abandonado, cuja história ficou no passado. E eles se puseram, pé ante pé correndo de novo como meninos aloprados.

Já na clareira do Coceirinha encontraram Edmilson desesperado falando:

- ei o Burunga já pegou cinco de outra turma e disse que vai expulsar. Vamos por outro lugar, que ele vem aqui.

Sob o ímpeto do medo, mesmo assim a planejar aqueles quatro correram e se esconderam no mato, quando o diretor passou. A professora ficou do outro lado.

Tiveram a ideia de beirar um muro de uma companhia de navegação e por lá pularem a sair numa rua ao pegado. Como não jogaram bola, o uniforme, continuavam impecável. Assim, atravessaram a rodovia, entraram noutra rua e voltaram pela frente do colégio, como se viessem de outro lugar.

O vigilante nem desconfiou, a professora Rosa estava tão concentrada na captura dos ainda estavam na mata, que eles, como álibi foram se acolchegar com as inspetoras, que nem imaginavam que eles faziam parte da turma, que um a um o diretor suspendeu.

A educação física aconteceu e eles saíram ilesos do que aconteceu.

A imagem daquele paraíso ficou preservada na memória, dos três, que se aventuraram a descobrir e a sentir toda aquela magia, a essência, que os envolveu no seio daquela saudosa mata.