Conversa com o "meu" Diabo.

Conversa com o "meu" Diabo.

Vento frio alastrar-se pelo campo de futebol, um redemoinho levanta areias e folhas do meu lugar. Olho para o Pé de Cajá, seus galhos contorcendo-se à ventania repentina, frutos são arremessados sem qualquer intento para longe, porém, chama-me a atenção, na raiz onde sento para diluir tais pensamentos, nada o afetava. Fiquei intrigado com tal visão, pus-me a atravessar aquela ventania para chegar mais perto, assim, desvendar tal fenômeno, mas, percebi que, a cada passo, o vento abria caminho para minha investida, a deixar-me mais intrigado.

- Que porra é essa?

Por um pequeno momento lembrei de um certo alguém, que, se estivesse comigo nesta hora, de certo lavaria minha boca com sabão barato, continuei, sorrindo discretamente, entretanto, meu olhar estava fixado na raiz da Cajazeira, onde, a cada passo que me aproximava, uma silhueta se formava, então, percebo que um homem estava sentado. Este homem tinha um metro e setenta e quatro de altura, seus olhos azuis trazia-me a sensação de afogamento, seu corpo, nem tão esguio, nem mesmo atlético, eu diria comum a tantos por ai, olhou-me, e, disse:

- Por quanto tempo eu teria que aguardar você?

Essa pergunta retórica o fez usar de hipófora:

- O tempo que for preciso acredito.

Sem entender o quê, ou, porque, falei:

- Quem é você? Te conheço? Com toda certeza não!

Em outros tempos já estaríamos trocando alguns socos, mas, essa pessoa a qual lembrei minutos atrás também disse-me para não me igualar, então, virei de costas e fui saindo quando ouvi:

- Dinho. Venha aqui...

- Dinho! Esse infeliz me conhece?

Virei de volta dizendo:

- Não sei como sabe meu apelido, nem de onde me conhece, então, desembucha...

Ele me olhou com aquela frieza no semblante, e, uma doçura no olhar, falando:

- Sou quem você um dia procurou naquele cemitério, em cada livros feitos por pessoas, que, se diziam ser adeptos da minha luz, mas que, sem nenhum esclarecimento deturpava, e, ainda deturpa minha imagem.

- Olha só, não tenho tendência a psiquiatra logo, não tenho paciência com loucos. Diga-me logo quem és?

- Eu sou o portador da luz. Aquele a quem vocês culpam por suas atrocidades, a quem vocês desprezam a sabedoria, e, por isso, queimou tantos nas ditas Fogueira Santa, aquele que vocês deformaram a imagem criando uma face tão medonha quanto as que se vê no espelho... Eu sou o Diabo (Lúcifer)!

Ao mencionar tal nome, toda ventania dissipou-se, os galhos se acomodaram, e, a poeira baixou. Ele ainda com seu olhar fixo em mim, falava:

- Não é tão próprio da sua raça culpar alguém sem a presença, pois é, estou aqui agora...

- Ok. E, Eu entro aonde nesta sua vinda, faça-me entender. Eu nunca acreditei em tais personagens, e, são tantas as razões, quantos os motivos, então, não perca seu tempo...

- Por esse motivo vim aqui...

- E dai!

- Dai que, era para vocês serem evoluidos, entretanto não conseguem dar um passo a frente da sua sala, e, tem o mundo como seu ridículo quintal, dando valores a coisas fúteis, lutando por um metro quadrado de um lugar com meio centímetro.

Meu irmão deu-lhes sabedoria, e, o que fazem?

Usam para destruir, humilhar, manter um ego tão pobre, quanto o espírito que o convém.

- Ainda não sei onde me encaixo nisso.

- Só quero conversar, meu irmão esta sempre conversando contigo, e, pergunto-me, o que o atrai tanto.

- Nada tem a ver com você, posso assentir, digo com convicção, não é porque faz alguns truques que tenho que falar, agora, se diz respeito a seus atos, nós dois sabemos que são fábulas. Olha, eu até admiro você pela paciência que tem de levar fama sem proveito.

- Então, o que fazer? Se os seres humanos tende a culpar alguém pelas suas faltas.

- Quer uma cerveja?

- Não bebo! Tem água?

- Nem vinho?..

- Não! meu irmão é quem gosta. Vocês até escreveram sobre uma transformação da água pro mesmo.

- Já ouvi falar, assim como, as tantas coisas maravilhosas ditas neste Best Sellers da humanidade.

- Pois então, ainda dizem que foi ditado pelo meu irmão...

- Já que tocou no assunto, foi ditado ou não?

- Claro que não! Neste pressuposto dia, eu e meu irmão estávamos em outros horizontes, se é que me entende. Quando vocês saíram da sua inércia, e, começou a entender o mundo a seu redor, nos criaram, foi ai que tudo danou.

- Poder ser mais específico?

- Claro! A origem de tudo e de vocês, vou tentar explicar de forma simplória. Tomaremos, então, como base a maternidade, uma criança quando nasce ele(a) esta cego pra esse mundo, seriam vocês nascendo para o mesmo, pois então, vamos adiante. O tempo passa, e, ele(a) vai tendo experiências como: Cheiro, sons, tatos, sentindo tudo ao redor, criam amigos imaginários, logo, foram vocês, conhecendo sua casa, mas esta, com uma área enorme. Criando junções com outros, que, vamos dizer ser seu pai e mãe, até irmãos. O tempo ainda corre, ao passo que corre, faz vocês andar junto, e, começa as picuinhas, atritos, pensamentos bons e maus, alguns mais observadores, veem a chance de manipular outros, que, como hoje, copiam roupas, cabelos, modo de falar, para deixar de ser ele(a) mesmo(a), para ser um artista, um sacerdote, um qualquer cujo a visão transcende a sua, só para ser aceito por um pequeno grupo, tão gado quanto você, e, foi nesse correr da vida que homens como vocês criaram a tão divina escritura.

- Tem um certo sentido. Admito.

- Meu caro, você e sua amiga escrevem correto.

- Sim!..

- Então, vocês mais que outros, podem criar. Dessa criação, pode ter seguidores. Destes seguidores, vamos defini-los como apóstolos da sua crença, da sua capacidade de construir alicerces de letras, para os muitos que não pensam, apenas copiam.

- Quer mais água?

- Um pouco.

Ele segura a caneca.

- Retomando a linha do pensamento, esses horrores causados por vocês mesmos, o fizeram adquirir a facilidade de culpar outros, e, quando não podem fazer-lo, acha na sua criação um ser para jogar a culpa, mas saiba, esses seres divinos ou como eu imperfeitos, não passam do consciente entrando em atrito com o seu subconsciente.

- Bem, eu já vi-me fazendo o mesmo quando adolescente, com a maturidade, já não cabe, creio.

- Ainda o fazem, de certo consciente, ou, inconsciente, isso está tão impregnado na sua natureza, que, dificilmente conseguem libertar-se, e, por mais que vigiem seus atos, terá que, de alguma forma desviar-se usando de artifícios necessários ao momento, mas, não se condene ao fazer, o mundo torna-se um abrigo para diversos pensamentos dentre eles estão os que muitas vezes precisam desta fórmula para subir degraus espiritualmente, se retornar ao princípio de si verá quantas vezes precisou disto para evoluir. Tome como exemplo sua amiga, ela sempre no final do dia faz uma varredura sobre, vendo pontos tomados durante, sendo assim, aprende, evita, e, continua sua jornada naquilo que para si são verdadeiras.

- Admiro a fé dela, como os demais.

- Dinho, essa doutrina criada a muito, faz-se necessária para uma grande parte da humanidade, pois sem, estariam perdidos, nessa perca, não saberiam discernir seus atos, tendo em vista que, apenas o seu querer é o suficiente sem se importar com os demais. Veja que, ainda com esta fé eles agem desta forma, que dirá sem...

- De fato! Nós sempre agimos desta forma, penso que ao longo do tempo, estudando fatos históricos, a humanidade sempre agiu a seu interesse, apenas uns poucos pensam em compartilhar tais espólios, e, consequentemente não vivem o suficiente para escrever sua história. Conversando com essa amiga sobre o Yin-Yang, apesar das variadas interpretações a seu redor, vamos tomar como base, o bem e o mal, a humanidade é a parte negra e, o ponto branco nele contido refere-se aos ditos em minutos atrás, enfim,...

- Agora quero uma cerveja.

- Tem alguma marca á seu gosto?

- Qualquer uma. Vou desvirginar meu corpo.

- Ok

Peguei a cerveja e dei a ele, após bicar o líquido, fez uma careta desaprovando o conteúdo, devolvendo o copo, disse:

- Como vocês gostam tanto dessa coisa. Não é pra mim... (Vixe Kkkkk)

- Vícios familiares. (Kkkkk)

- E, vocês dizem que eu sou mal! Isso sim é maldade... (Kkkkk)

- (kkkkkkk)

- Dinho. Eu só gostaria de não ser taxado como tal, porém, esta longe de acontecer. Qualquer hora dessas eu volto para conversar mais um tiquinho, mas, vou tomar água (kkk) fui.

- Quando quiser...

Ele levantou, me deu um abraço, apertou minha mão, e me olhou com seus olhos azuis, virou-se e caminhou em direção ao centro do campo onde um redemoinho o envolveu desaparecendo. Sentei no mesmo lugar de sempre, rabiscando a areia em forma de espiral, pensando sobre, cheguei a conclusão de que estava ali por horas.

- Dinho. Vem almoçar...

Despertei com a voz da veia me chamando para comer, tinha cochilado, achei tudo muito real, procurei traços da conversa e nada, nem mesmo o desenho na areia. Levantei e fui para casa, chegando lá, Dita disse:

- Fui te chamar para tomar café, não te achei no quarto, sai, e, te vi embaixo da Cajazeira, te chamei, acenei, você não viu, fui lá, você estava num sono tão pesado que não quis te acordar. Que sono hein... Vamos comer.

- Vamos...

Quantas vezes entramos em conversas com nosso Deus e nosso Diabo inconsciente, estes seres criados para nos direcionar sobre o certo e errado nos mostra muitas vezes o quão disforme torna-se. Talvez minha amiga esteja certa, no final de cada expediente entre o amanhecer até o anoitecer ela tira um tempo para avaliar seus atos e palavras numa reunião com ambos. Quem sabe um dia eu evolua a tal ponto.

Texto: Conversa com o "meu" Diabo.

Autor: Osvaldo Rocha Jr.

Data: 31/08/2023 às 08:59

Osvaldo Rocha Jr
Enviado por Osvaldo Rocha Jr em 31/08/2023
Reeditado em 31/08/2023
Código do texto: T7874525
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