O Jardim Esquecido

Era uma vez um jardim encantado, onde muros de pedra, altivos, aconchegavam a flora com primor. As flores, raras e odoríferas, como cândidos pavilhões da Grécia antiga, exalavam aromas emprestados do Éden. E, no cerne deste paraíso, habitava uma donzela, Isabella, cuja formosura rivalizava com as mais ígneas flores que a circundavam.

Embebida pela esplendorosa natureza, Isabella vivia enclausurada no jardim, pois temia o mundo além dos muros, imaculado o encantamento daquele lugar, infindas primaveras no seu coração deslizavam, alimentando-a de quimeras e sonhos.

Em uma tarde taciturna, ao fitar seu reflexo nas águas tépidas, Isabella notou, pela primeira vez, vestígios de desilusão em seu olhar. O vislumbre fugaz da imperfeição fez-se notar como a sombra que ofusca o céu poente. Com sagaz lucidez, percebeu que, por mais bela que fosse a efêmera esplêndida das flores, estas, em última instância, murchariam como rubras rosas após o estio.

A desilusão, como bruma crepuscular, transpassou o manto da ilusão, a preencher-lhe o coração com um vazio taciturno, como ecos longínquos de uma canção d'alma. Interrogava-se sobre o sentido de tal esplendor se findava em aparente futilidade.

Buscou, então, compreender as marcas invisíveis que a prendiam naquele Éden, mas o medo da realidade a mantinha imersa, e a desilusão, cada vez mais densa, turvava-lhe a visão.

Assim, anos transcorreram, e Isabella, aprisionada pela beleza ilusória, viu o encantamento escoar-lhe entre os dedos. A poesia do jardim, agora, entoava notas funestas.

Numa manhã nebulosa, Isabella, movida por uma determinação taciturna, escancarou os portões do jardim e adentrou o ignoto além dos muros. A desilusão, então, reverberava como um eco melancólico em seu coração, e o vazio, uma ausência de sentido.

Mas, aos poucos, compreendeu que, mesmo com as agruras e sombras da realidade, o mundo exterior ofertava-lhe a chance de crescimento, aprendizado e autodescoberta. Afinal, é na imperfeição das coisas que residem as mais ricas lições e a verdadeira essência.

Isabella, assim, abraçou a impermanência, e, em seus olhos, faiscavam a chama da desilusão e o prisma da reflexão. Encontrou, na imperfeição do mundo, a chave para a verdadeira vida, onde as flores podem murchar, mas, também, ressurgirão em esplendor.

E assim, a jovem Isabella caminhou além dos muros do jardim, na aura espectral da experiência, envolta pelo vazio, mas, também, pelo âmago da renovação. Encontrou, no caleidoscópio da imperfeição, a efêmera e verdadeira beleza da existência.

Bernardo Reis
Enviado por Bernardo Reis em 31/07/2023
Código do texto: T7850122
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