Os primos

Eles eram apenas crianças, brincavam e corriam de um canto para outro como qualquer outra da idade deles. Casas próximas e as mães sempre juntas, uma ajudando a olhar os filhos da outra em todo momento, como é costume em toda cidade do interior mineiro.

A amizade que os unia era de irmãos e o sentimento era puro. Tomavam banho de bacia e balde, brincavam de esconde-esconde, dormiam no mesmo quarto, faziam passeios no parque, andavam de mãos dadas, trocavam beijos na face...

Tempo bom aquele em que podiam ser livres e demonstrar o amor que os unia, sem se importarem com o que os outros iam pensar.

Os anos foram passando, houve mudanças na vida de ambos. As famílias se separaram, uma delas foi embora para outra cidade e os primos ficaram distantes. Agora só se viam nas férias e sempre era uma festa. Tinham muito que falar, mas nunca mais puderam ficar como ficavam. Tornaram-se adolescentes e a curiosidade começou a tomar conta dos dois.

Antigamente os adolescentes eram menos afoito que os de hoje e refreavam seus impulsos. Se não fosse por medo dos pais era por não ter informação sobre como agir diante de algo novo, e isso os tornava tímidos ou medrosos.

Os primos também, como todo adolescente, começaram a descobrir que a vida poderia ser mais que beijos na face, brincadeiras inocentes e, com isso, se afastaram. Eram primos e nunca poderiam namorar; era a lei da família e da sociedade.

Cada um seguiu sua vida. Tornaram-se jovens, se viam sempre, mas nunca com a mesma espontaneidade de antes. Ela foi passear na cidade onde ele morava e recebeu uma carona de moto para ir para a casa, se agarrou em suas costas para poder sentir novamente o contato de seu corpo, através do abraço para não cair da moto. Este foi o último contato dos jovens que se separaram por muitos anos.

Reencontraram-se, coração bateu forte, controlaram a emoção e conversaram como pessoas comuns, mas, no peito, o coração batia descompassado e a emoção quase os denunciava. Trocaram telefones, e-mails e combinaram de se ver.

Uma tarde se encontraram para um chope gelado, sentaram em um barzinho qualquer e conversaram por horas, lembraram da infância, falaram dos amores da juventude, sobre os filhos, sobre os casamentos, sobre tudo, menos sobre o que sentiam um pelo outro. Cada um foi para sua casa e, dias depois, voltaram a se ver.

Conversas amenas, brincadeiras sobre o quanto um engordou, sobre como o outro ficou diferente, sobre o que esperavam um do outro quando eram crianças. Falaram de como sentiram falta um do outro quando se separaram, sobre a vontade que ela tinha de tocar seus cabelos, sobre saber como era o beijo, se tivesse acontecido quando criança; quando perceberam suas mãos estavam se tocando e seus olhares fixos um no outro, só imaginando o sabor e o calor que poderia existir...

Eles pagam a conta e saem, as mãos continuam entrelaçadas, os olhares continuam se buscando enquanto eles caminham para o carro que os levará para casa. Entram no carro e, antes de dar partida, ele estende as mãos mais uma vez e se tocam, as bocas se procuram e, havidos, roubam um do outro o que sempre quiseram, descobrem o sabor um do outro, ficam ali, sozinhos, mergulhados nos braços um do outro, em doces carícias, até que um farol clareia o interior do carro e eles se afastam, voltando para a realidade de uma vida longe, porém com a promessa de que sempre pode haver algo mais, sempre existe o amanhã para quem sabe esperar.