Insônia

Certo dia, levantei da cama durante mais um episódio de insônia, ainda era cedo, lá pelas 01:00 da manhã, fazia calor e um silêncio preocupante. pensei comigo mesmo nas possibilidades de sair de fininho, pois estava doido por um copo de whisky, de fininho porquê ainda morava com os meus pais naquele tempo, e esse fato me fazia querer um copo de whisky ainda mais.

Mandei mensagem para um amigo que morava perto, ele tinha carro, então se viesse seria uma volta daquelas. Mas ele não me respondeu, então saí do quarto na ponta dos dedos, antes peguei uma camisa qualquer no guarda roupa escuro, coloquei nos ombros, fechei a porta de mansinho pra não acordar a minha mãe, a velha acordava com o ruído de uma pena caindo no chão, então eu mal respirava. Abri a porta da frente com cuidado, procurei meu chinelo, mas só achei o do meu irmão mais novo, a porra dos chinelos davam na metade do meu pé, vai esse mesmo. notei que tinha pego uma camisa de manga comprida, não lembrando que era uma madrugada de calor, mas me perdoei por tela pego no escuro.

Abri o portão da frente e parti pela rua vazia, arrastando o calcanhar no chão, o chinelo era pequeno demais, não que isso me incomodasse, o meu copo de whisky estava cada vez mais perto. Encostei no primeiro bar da quadra, descendo a segunda avenida eu podia sentir a maresia que vinha da praia ao fim do horizonte escuro, eu não via mais carros passando, mas o movimento no bar ainda era considerável.

Chegando lá encontrei um velho conhecido, eu não sabia o nome de batismo dele, mas as pessoas o chamavam de Marcha. Marcha era um daqueles caras que trabalhava com o que não gostava, geralmente pro próprio pai, vivia infeliz pois nada que ele fazia dava certo, então ele descontava tudo na bebida. Eu não o julgo, jamais, na verdade ele até que não chegava a ser alguém desprezível.

--- "meu brother". Veio ele dizendo todo alegre.

--- Pode pagar um copo de whisky pro seu velho amigo?

--- Mas é claro. respondi.

--- Aliás, me traga dois copos de whisky e um de água.

O garçom pôs os copos e eu finalmente pude descarregar o meu dia ruim ao bater aquele copo vazio na mesa e gritar:

--- Mais um!!

Aquela sensação era incrível, é impossível explicar a alguém que não bebe o quanto uma ressaca vale a pena, pelo menos na maioria das vezes.

Enquanto eu me embebedava, Marcha me contava sobre mais uma das inúmeras brigas que ele havia se metido aqui pelo bairro, eu já tinha ouvido falar de algumas, mas ele tinha umas novas, e eu estava louco por algo pra escrever, então ouvia com atenção.

Os socos voavam pelas palavras, chutes e ponta pés. Pela boca dele as cicatrizes em seu rosto e mãos não faziam tanto sentido. O fato é, porque não ganhar uma grana pra brigar? Uma briga arranjada. Pensei comigo mesmo.

--- Tive uma idéia brilhante, vamos botar você pra brigar e ganhar dinheiro com isso.

--- Isso não daria certo, eu preciso estar bêbado pra vencer uma briga. Ele retrucou.

--- Esse é o menor dos nossos problemas. Eu disse.

Onde arrumariamos uma briga arranjada?

--- Vamos, pense.

Onde eu arrumo outro louco o suficiente pra entrar em uma briga com esse animal, e outras pessoas que apostem nele além de mim. Era a minha sina.

Até que um rapaz sentado na mesa ao lado se virou na cadeira e disse:

--- Desculpe, não pude deixar de ouvir a conversa de vocês. Eu sei de um lugar onde você pode colocar ele pra brigar e arrumar uma boa grana.

--- "Desculpe?" Esse cara não é daqui, muito educado. pensei comigo mesmo.

--- E onde seria esse lugar? Eu perguntei

--- O pessoal chama de o velho galpão, lá rolam brigas clandestinas, e se o seu amigo for mesmo bom, ele pode se dar bem por lá.

--- Velho galpão? Que nome de merda. Eu disse.

--- E onde fica esse lugar?

--- Eu posso te dizer onde fica, mas acho que não vão deixar você entrar com essas mangas compridas, tá com frio? Caindo na gargalhada

--- Vai tomar no seu cu, escreve a porra do endereço.

Ele escrevia o endereço em um guardanapo enquanto o garçom trazia o meu quinto copo de whisky. Marcha já estava no terceiro.

--- Você vai me falir assim, vamos embora.

Peguei o endereço com o rapaz ao lado, nem sequer perguntei seu nome, não me interessava afinal, só pensava em quanto dinheiro poderíamos realmente ganhar com essa palhaçada toda.

--- Não se esqueça da minha bebida, eu não consigo vencer sem estar bêbado. Marcha gritava enquanto caminhavamos até a parada de ônibus.

Que droga, o cara mal se aguenta em pé, não vai conseguir bater em ninguém. Subimos no ônibus, era por volta das 02:30 da manhã de sábado, tínhamos que ir ao centro da cidade encontrar o tal galpão. Se era clandestino então não podia ser um lugar muito chamativo. A distância pro centro era longa, e o corujão parecia voar entre as curvas. Nele só haviam eu, marcha, o motorista e mais um rapaz sentado lá no fundão com uma caixinha de som que fazia a trilha sonora da viagem.

Chegando no destino, descemos numa parada mais vazia do que o céu sem estrelas, e seguimos caminhando pelas vielas estreitas em busca de uma porta de madeira com uma listra pintada, era o que dizia o guardanapo.

A maldita porta foi quase impossível de se encontrar, porém encontramos. Chegando perto fiz a batida secreta do jeito que o cara do bar mandou. Depois de um intervalo de alguns segundos a porta se abriu, um cara grande apareceu e perguntou se eramos convidados.

--- Somos lutadores. Eu disse imponentemente

Ele saiu da frente e nos deixou entrar. O cara do bar havia me dito pra não arrumar confusão com ninguém fora do ringue, o pessoal era barra pesada, então era melhor ficar de boa.

O lugar estava lotado, o som dos socos ecoavam pelo galpão, sem luvas, só pele e osso, as pessoas ao redor do ringue gritavam como se o sangue que escorria fosse ouro, realmente era.

Cheguei a um balcão ao lado do bar, encostei, pedi dois copos de whisky sem gelo, dei um ao marcha, vi que as mãos dele pararam de tremer depois do primeiro gole.

--- Mais um copo e eu posso enfrentar qualquer um. Ele dizia confiante.

Encostei no balcão ao lado e falei com uma moça que fumava um cigarro e escrevia uns nomes na prancheta.

--- Ola moça, gostaria de escrever o meu amigo aqui na próxima luta.

--- Ele sabe lutar? Ela me perguntou.

--- Ele luta como ninguém, pode confiar.

Enquanto isso marcha aquecia dando uns pulinhos de um lado pro outro, dava socos no ar, e até parecia não estar bêbado.

Caminhei mais um pouco até a mesa de apostas e disse a atendente:

--- Quero apostar R$ 200 no lutador de número 15 no primeiro round.

--- Sim senhor. ela respondeu na hora.

Voltei então aonde marcha se preparava para luta. Me lembro como se fosse ontem o momento em que ele subiu no ringue, o número 44 brilhava em suas costas. Foi o dinheiro mais fácil que eu já ganhei.

M B
Enviado por M B em 01/07/2023
Código do texto: T7826987
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