Caía a noite e Nelma vislumbrava pela janela a velocidade do trem e aquele verde fazia bem para sua alma. Viu de longe uma casinha afastada, algumas luzes acesas e ficou a imaginar uma família em volta da mesa de jantar.
Lembrou-se de quando sua mãe vinha da cozinha com um bolo de batatas tão cheiroso que perfumava todo ambiente. Imaginou ver seu pai pensativo, olhando para longe até que unia as mãos para a prece diária com a família.  


O trem parou na estação mais próxima para pegar mais passageiros. Viu um casal , ela grávida e o marido com o maior cuidado segurava-a  pelo braço, parecendo já orgulhoso de ser pai. Lembrou-se imediatamente de Clara, sua primeira filha, quando a trouxeram embrulhadinha em um cobertorzinho quadriculado cor-de-rosa. Segurou-a em seus braços enquanto Humberto se achegava extasiado. Olhavam para seu rostinho,  procurando alguns traços.
- Acho que a boca é a minha, Nelma – disse ele orgulhoso. Trocaram olhares de amor e ternura.
  Que benção maravilhosa o nascimento de um filho, como se fosse uma sementinha plantada, depois regada e crescida - uma mágica de Deus! Naquele momento sentiu saudades de Humberto.  


Já era tarde e resolveu se deitar. Havia comprado uma cabine leito e  tudo ali era pequeno, como um abraço terno. Deitou-se vagarosamente, fechou os olhos e foi embalada pelos chacoalhos do trem; naquele momento pensou que eles eram como a vida, às vezes suaves e tranqüilos, outras vezes, imprevisíveis. 
E nesse embalo, com a música longínqua do apito do trem,  junto com seus olhos fecharam-se as cortinas das lembranças.

 

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Mary Fioratti
Enviado por Mary Fioratti em 27/06/2023
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