OS SEVERINOS (BVIW)

Ela era Joana, assim sem sobrenome, que nem “rezistro” tinha. Os de mais perto é que lhe contavam da avó índia pega no laço e mais umas coisinhas poucas. Aos vinte, se juntou com José, de sobrenome Severino. Foi quando o encarregado de uma usina em Minas desceu na praça do arraial. Anunciou que tinha ido arrebanhar gente nordestina para o corte de cana. José Severino deu o nome. Juntaram o parco legado numa trouxa. Subiram no caminhão. De costas, nem olharam pra trás — olhando, era bem capaz de a coragem ter um vacilo. Sabiam de nada, quase nada. O homem de chapéu e bigodes só tinha contado da moradia, comida barata, recurso de saúde. Eles nem prestaram atenção, que a mente divagava era na lata vazia da prateleira de tábua ao fundo do mísero casebre.

A vida na usina era dura: terra desconhecida, parede-meia, labuta ao sol quente. O arroz e o feijão dosados na escassez já eram dívidas antes mesmo da ração raleada que Joana cozia no fogão de barro. Vieram os filhos um atrás do outro. José Severino se desiludiu, entregou-se ao vício da cachaça. O corpo inchado já não se levantava do catre nas madrugadas frias. Um dia, o fantasma de José assomou à porta, sombreou o sol com mão trêmula. Olhou Joana às voltas com o caçula ardendo em febre alta. Levantou os dedos nodosos num gesto de “espere aí”. Tomou a direção do açude, e nunca mais foi visto. Joana esperou, esperou, cansou-se . Depois lançou-se à sorte. Consigo levava agora a escadinha de seis filhos Severinos. Todos à mercê da caridade alheia.

Tema da Semana: Espere aí (conto)